Trickster
Um trickster (embusteiro, trapaceiro, pregador de peças; do inglês trick, derivado do francês antigo triche = trapaça, engano[1]) é, na mitologia, e no estudo do folclore e religião, um deus, deusa, espírito, homem, mulher, ou animal antropomórfico que prega peças ou fora isso desobedece regras normais e normas de comportamento.
Enquanto o malandro cruza várias tradições culturais, há diferenças significantes entre malandros nas tradições de muitos povos indígenas e aqueles na tradição euroamericana.
O trickster quebra as regras dos deuses ou da natureza, às vezes mal-intencionado (por exemplo, Loki), mas, normalmente, ainda que involuntariamente, em última análise, com efeitos positivos. Frequentemente, a quebra das regras toma a forma de um "truque" (daí o termo, "trickster"). O trickster pode ser astuto ou tolo, ou ambos. Frequentemente são engraçados e cômicos, mesmo quando considerados sagrados. Um exemplo é o Heyoka sagrado, cujo papel e lançar truques e jogos e, por isso, aumenta a consciência e atua como um equilibrador.
Em muitas culturas, (como podemos observar na grega, na norueguesa ou em contos eslavos) o trickster e o herói civilizador são frequentemente combinados. Como exemplo: Prometeu é um herói cultural pois roubou o fogo dos deuses e entregou ao homem, dando origem à civilização. No entanto, não é um herói trickster ou trapaceiro típico. Em muitas das mitologias dos povos nativos norte-americanos, as Primeiras Nações, o Coiote (Sudoeste dos Estados Unidos) ou Corvo (litoral noroeste do pacífico, Columbia Britânica, Alasca e extremo oriente russo) roubou o fogo dos deuses (estrelas, lua, e / ou sol) e são mais Malandros (tricksters) do que heroicos. Isto é principalmente devido a outras histórias que envolvem esses espíritos: Prometeu era um Titã, enquanto o Coiote e Corvo são geralmente vistos como palhaços e brincalhões. Exemplos de malandros (tricksters) nas mitologias do mundo são dadas por Hansen (2001), que lista: Mercúrio na mitologia romana, Hermes na mitologia grega, Exu na Cosmovisão iorubá e Wakdjunga na mitologia Winnebago. Mircea Eliade mostra que o Malandro, por sua característica de burlar os limites, é frequentemente andrógino (masculino e feminino ao mesmo tempo - o que não se equivale a homossexualidade), como o Shiva indiano.
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Comentários
Em algumas culturas, podemos encontrar os mitos da dualidade, como dois demiurgos que criam o mundo, ou dois heróis civilizadores - de modo complementar. Cosmologias dualistas estão presentes em todos os continentes habitados e mostram uma grande diversidade: podem apresentar dois heróis culturais, mas também demiurgos (exemplificando um mito da criação dualista, neste último caso), ou outros seres, os dois heróis podem competir ou colaborar, podendo ser concebidos como neutros ou contrapostos como "bem contra o mal", seja da mesma importância ou distinguidos "como poderoso versus fraco"; podem ser irmãos (mesmo gêmeos) ou não. Entre os Romanos, o exemplo é o mito de Cástor e Pólux. Entre os Nagô-Iorubá, Exu é uma figura tipicamente trickster. Sua mitologia está na raiz da figura do malandro carioca, com sua navalha lenço de seda e seu terno branco. Exu é frequentemente considerado andrógino. A dualidade também se apresenta como uma espécie e "ambiguidade" que lhe é característica. Em uma narrativa, no qual é figurado como uma criança travessa, Exu veste um chapéu metade azul e metade vermelho. Ao passar entre dois agricultores, um pergunta ao outro "você viu aquele menino de chapéu vermelho", ao que o outro responde "não, eu vi um menino de chapéu azul" - e ambos começam a brigar enquanto Exu se diverte. Em outra narrativa, colhida pela tradição oral de Mestre Didi, Exu é um homem que veste um traje dividido em vermelho e preto e passa por dois amigos que nunca brigaram e pela divergência no que tinham visto acabam brigando[2]. Exu é o orixá mensageiro, ligando homens e deuses. É o transportador do axé (energia) e mobilizador de tudo que existe. Enquanto movimento, é a própria vida e a dinâmica do mundo, sobretudo relacionado ao imprevisto e ao acidente (daí a ginga, o improviso e o drible, característicos das expressões afro-brasileiras).
https://pt.wikipedia.org/wiki/Trickster
O Mito do Heroi e o Mito do Trickster
O trickster é um objeto de estudo de muitas áreas, como a mitologia, religião, antropologia, psicologia, e até o cinema. Para contextualizar os estudos mais relevantes sobre o trickster, vamos começar fazendo alguns recortes. Um militar britânico pré-junguiano, chamado Lord Raglan, disse, após ter estudado mitologia e se aventurado pela poesia, em meados do século XIX, que o mito do herói representaria o homem tornando-se Deus. Neste caso, podemos entender o mito do herói como a busca pelo sagrado, isto é, há um chamado – geralmente divino – direcionado a um homem comum que se encontra, inicialmente, em sua zona de conforto e é impelido a se separar dela para iniciar uma jornada que, de uma forma resumida, quase vai matá-lo, sendo que o mesmo vai ou enfrentar e derrotar essa morte ou retornar do mundo dos mortos. Ambas as formas vão culminar com o retorno do herói ao seu local inicial de partida, onde, desta vez, seu estatuto não é mais de um homem comum.
E por que estamos falando do mito do herói? Bem, uma das coisas que este Lord Raglan observou em seu estudo, foi que, sobre a infância do herói, não nos é dito nada. É um espaço vazio. E a sugestão dele, é que ali se esconde o mito do Trickster.
É sabido que Carl G. Jung foi um nome de referência no estudo da mitologia e dos arquétipos e, tendo contato com este trabalho, um estudioso norte-americano chamado Joseph Campbell sentiu-se levado a fazer uma análise profunda das ideias deste psicólogo suíço, produzindo um trabalho riquíssimo conhecido como monomito ou a jornada do herói. Trata-se esta, de uma visão do fenômeno mitológico, apoiada no método estruturalista, ao passo que vai afirmar que existem padrões, ou seja, estruturas universais que alicerçam todas as narrativas. A tese do autor é de que todos os mitos seguem essa estrutura em algum grau. Isto é, as histórias de Prometeu, Osíris, Buda, Jesus Cristo, todas seguem este paradigma quase exatamente. Em 1949, Campbell publicou o livro “O Herói de Mil Faces”, em que demonstra que cada herói adquire a face de sua cultura específica, mas sua jornada é sempre a mesma, vivendo sempre o mesmo mito, um “monomito”. Então vamos descobrir que jornada é essa! Lembrem-se que os personagens principais dividem-se em: protagonistas, que agem e fazem as coisas acontecerem, e os antagonistas que assumem uma posição oposta aos primeiros – é o clássico conflito de luz x sombra.
Os 12 EstágioS da Jornada do Heroi
“Mundo Comum – O mundo normal do herói antes da história começar.
O Chamado da Aventura – Um problema se apresenta ao herói: um desafio ou a aventura.
Reticência do Herói ou Recusa do Chamado – O herói recusa ou demora a aceitar o desafio ou aventura, geralmente porque tem medo.
Encontro com o mentor ou Ajuda Sobrenatural – O herói encontra um mentor que o faz aceitar o chamado e o informa e treina para sua aventura.
Cruzamento do Primeiro Portal – O herói abandona o mundo comum para entrar no mundo especial ou mágico.
Provações, aliados e inimigos ou A Barriga da Baleia – O herói enfrenta testes, encontra aliados e enfrenta inimigos, de forma que aprende as regras do mundo especial.
Aproximação – O herói tem êxitos durante as provações
Provação difícil ou traumática – A maior crise da aventura, de vida ou morte.
Recompensa – O herói enfrentou a morte, se sobrepõe ao seu medo e agora ganha uma recompensa (o elixir).
O Caminho de Volta – O herói deve voltar para o mundo comum.
Ressurreição do Herói – Outro teste no qual o herói enfrenta a morte, e deve usar tudo que foi aprendido.
Regresso com o Elixir – O herói volta para casa com o “elixir“, e o usa para ajudar todos no mundo comum.”
Dentro desta estrutura, vai aparecer o trickster, que sempre vai trazer a questão de rever o status quo – isto é, como as coisas eram antes de sua aparição. Este arquétipo carrega em si o desejo de mudança da realidade. A sua função é acordar o Herói para a realidade, denunciando a hipocrisia e as incoerências. Para acontecer o ciclo heroico, deve aparecer o trickster em algum momento. Ele é o deus das encruzilhadas, do comércio, da malícia; a representação física de aleatoriedade, é um agente do caos. Muitas vezes ele prega peças em outro – seja ele humano, deus ou até elemento da natureza. Mas além disso, o trickster também é o portador do conhecimento, ele rouba o fogo dos deuses, e é alguém que por quebrar as regras, cria novas.
Suas encarnações são, entre outros Mercurius, Hermes e Prometheus em Roma e Grécia antiga, Eshu e Anansi na África, na mitologia nórdica é Loki, e na brasileira seria tanto o Curupira quanto o Saci-Pererê e assim por diante de cultura em cultura. Na televisão, podemos citar, por exemplo, o Pernalonga, o Pica-Pau, o Máscara, a Pantera cor de rosa, o Gato Felix, o Doutor de Doctor Who, o Coringa do Batman, o Groot dos Vingadores, o R2-D2 de Star Wars, o Didi de Os Trapalhões.
Jung estudou o trickster como um arquétipo humano básico. Ele acreditava que era parte do inconsciente coletivo compartilhado pela raça humana. Ele supôs que o trickster estaria representado pela nossa própria natureza básica, o animal que tínhamos deixado para trás e como nós aprendemos a dominar ferramentas e fogo. Dentro da psicologia o trickster tem sido visto como uma espécie de id, ou, em se tradando de Jung, uma sombra de nossa verdadeira natureza. O que nos faz voltar para o começo do texto, colocando o trickster na lacuna, na sombra do herói. “O trickster é ao mesmo tempo criador e destruidor, doador e negador, ele engana os outros e está sempre enganando a si mesmo”.
https://spsicologos.com/2018/07/29/o-querido-agente-do-caos-chamado-trickster/
"Raposa", no francês antigo, era "goupil", mas, por causa dessas histórias, virou "renard".
Nota: o Saci Pererê e o Curupira são "tricksters".
E temos também João Grilo, João Malasartes e Macunaíma.
E eu achando que tinha alguma ligação com o desenho Robin Hood da Disney: