O caso PewDiePie é a prova de que a cultura da internet ainda é incompatível com o mainstream


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Numa era onde os canais de comunicação eram fechados para o cidadão comum, a internet serviu não só para democratizar o discurso, mas também para maximizar e popularizar a cultura. Uma piada besta que você faria com os seus amigos no seu quarto, de repente ganhou o poder de se tornar um meme replicado por milhões de pessoas em uma centena de países. A natureza aberta e sem controle da internet, frente aos portões fechados e engessados das mídias antigas, deu luz a uma cultura quase anárquica, que brinca com os símbolos mais ofensivos da sociedade como se eles fossem um chocalho de bebê e vive de empurrar os limites sempre um pouquinho mais.

Há alguns anos, se tornar versado na cultura internética era sinônimo de acessa-la, mas com a popularização do acesso e a simplificação dos serviços, a anarquia permaneceu escondida, reservada a pequenos recantos da rede, ocasionalmente botando a cabecinha pra fora para fomentar o caos.

Com o tempo, marcas e empresas passaram a levar a internet a sério, investindo pesado nas suas personalidades e seus milhões de fãs super-engajados. Parecia o acordo perfeito – a empresa gastava menos do que para contratar uma estrela da velha mídia e o criador de conteúdo recebia mais do que a renda de propagandas automatizadas a que estava acostumado. Todos saíam felizes na mediocridade.

Entre todos os que despontaram, PewDiePie se destacava. Detentor do título de youtuber mais popular do mundo há anos, o jovem sueco de 27 anos fez de tudo. Publicou um livro, participou de talk shows, virou garoto-propaganda do Youtube. O céu parecia o limite e seu nome se tornou sinônimo de sucesso na internet – sendo chamado até de a primeira verdadeira celebridade nascida da internet.

Mas então aquele velho caos se chocou com a incompreensão e puritanismo do mainstream – exacerbado pelo atual clima político.

Adepto de uma piada recorrente envolvendo Hitler e apologia ao nazismo, o “Pewds” foi execrado pelo mainstream, perdendo contratos com Disney, Google e tendo a segunda temporada do seu reality show Scare PewDiePie cancelada pelo moribundo Youtube Red (quem lembra disso?). Até mesmo a tia chata oficial da internet, a autora J.K. Rowling, deu a sua pancada no youtuber, tomando-o como exemplo contra todos que acham que “o fascismo é um acessório de moda” (ainda não há informações sobre uma analogia de Harry Potter para ilustrar o caso).

O crime de PewDiePie foi se tornar grande demais, mainstream demais, quando, debaixo dos milhões de dólares, não passa de mais um moleque de internet que nem todos nós. Piadas com Hitler e nazismo são a essência da anarquia internética, pois brincam e ridicularizam ao extremo um dos símbolos mais ofensivos da história da humanidade. Degenerados riem, frescos ficam chocados. Esta rede foi construída sobre a indignação de pais e avós, suas paredes rebocadas pelas lágrimas daqueles facilmente ofendidos demais para chamarem-a de casa.

Quando você abraça o mainstream, dá as costas a internet, e vice-versa. É uma decisão que todo produtor de conteúdo tem que tomar inevitavelmente e, acredito eu, deve ser quase impossível recusar os favores e brindes depois de anos de pindaíba na internet. Mas é importante sempre lembrar de onde você vem e quem foram os responsáveis por constituírem a sua plataforma.

Essa não é uma defesa do PewDiePie, é uma ode à cultura da internet. Permaneça chocante, permaneça rebelde. O retardo irá nos libertar.

http://lolygon.moe/2017/02/pewdiepie-e-a-prova-de-que-a-cultura-da-internet-ainda-e-incompativel-com-o-mainstream/

Comentários

  • Parece que o lance que houve com o PewDiePie foi armado pela mídia, segundo alguns eles detestam youtubers:



    A resposta do PewDiePie (em inglês):

  • O Milo comentou o caso do PewDiePie, veremos se ele retribui o favor.
  • pewdiepie-1.jpgDo escracho ao respeito na internet: A reviravolta de PewDiePie 
    Durante anos, o sueco Felix Kjellberg, mais conhecido por sua alcunha PewDiePie, foi uma punchline na internet. Sua popularidade incomparável era usada como exemplo da crescente imbecilização do grande público, seu sucesso usado para ilustrar uma nova era de celebridades, famosas por não terem talento.

     Em poucos meses, tudo isso mudou. Apesar de ainda ser dono – e com folga – do título de Youtuber mais popular do mundo, Felix passou de rejeitado para respeitado frente aos olhos anciões da internet, reconhecido como um produtor de conteúdo íntegro, que se recusou a se curvar diante da pressão sufocadora do mainstream.

     Mas antes de entendermos por que isso aconteceu, é preciso descobrir o que torna um produtor de conteúdo “respeitável” para a internet como um geral. Diferentemente da TV, a internet nasceu da democratização do espaço, um espaço que muitas vezes não vinha com grandes ganhos financeiros, mas que dava a seus ocupantes uma liberdade inigualável. É a postura que o produtor de conteúdo toma entre a liberdade da cultura internética e as exigências de um mainstream cada vez mais agressivo que determina a sua respeitabilidade.

     A prioridade é dada àqueles que jamais deixaram de fazer o seu conteúdo do seu jeito, não importa o quão ele seja rejeitado por anunciantes e mandatários do Vale do Silício. Um bom exemplo disso é George “Joji” Miller, o infame Filthy Frank. Praticamente um excremento da cultura internética, seu senso de humor cru, aleatório e chocante é recebido com confusão por pessoas que observam de fora para dentro a bolha da internet, mas reconhecido como essencial pelos iniciados. Extremamente popular, Joji poderia ter podado as arestas de seus personagens e ter se dado bem – Filthy Frank e seus amigos poderiam ter um programa de TV, ele poderia estar ganhando milhares e milhares de dólares de anunciantes no Youtube… Mas ele nunca mudou.Mesmo com canais bem menores que ele faturando alto por se venderem ao mainstream, Joji nunca recuou. A internet o deixou famoso desse jeito e ele está disposto a pagar o preço para retribuir o favor. A internet premia a autenticidade, a coragem e a honestidade. Ou seja, mudou para ganhar dinheiro? Perdeu o seu respeito.

     O que torna a situação de PewDiePie ainda mais curiosa, pois foi exatamente a independência financeira do sueco que lhe deu a liberdade de traçar uma linha sobre o que ele estava disposto a sacrificar pelo mainstream e essa linha era a sua autenticidade. Vítima de uma hit piece do Wall Street Journal no fim de 2016, que foi replicada e apoiada à exaustão por outros sites que já demonstravam uma insatisfação com a postura do sueco, Felix surpreendeu ao, invés de recuar, bater duas vezes mais forte. Ele se tornou o inimigo número dois da grande mídia – atrás somente de Donald Trump – e aproveitou cada segundo para expor as maquiavélicas táticas dos dinossauros da imprensa.


     O caso do WSJ lhe fez perder literalmente milhões de dólares devido à quebra de um contrato que ele mantinha com a Disney, assim como o cancelamento da segunda série de Scare PewDiePie, sua série do Youtube Red, mas mesmo assim Felix nunca deixou de fazer piada com Hitler e outros assuntos sensíveis. Ao invés de se curvar a pressão, ele puxou o WSJ e a mídia para a lama, expondo ponto-a-ponto a hipocrisia da publicação e seus aliados na grande mídia. Ao ser confrontado por SJWs, Felix acertou – não se desculpou, não cedeu e partiu para o contra-ataque. De agressores, a mídia se tornou motivo de piada em seus vídeos e eles passaram a odiar o sueco ainda mais.


     O episódio apenas reforçou a sua busca por autenticidade e de lá pra cá seu conteúdo mudou. Ao invés de fazer Let’s Plays intermináveis de jogos que milhares de outros youtubers já cobrem, Felix investiu num misto de comentário social e senso de humor cru – muitas vezes comparado ao do próprio Filthy Frank. Ele cresceu com o seu público e soube fazer com perfeição a transição de ídolo da garotada a um ícone da internet.

     Uma internet que recompensa seus filhos, não importa o quão tarde eles voltem pra casa. Apesar de Felix já ser um milionário seguro financeiramente para o resto da vida quando resolveu se impor, ele não falhou no teste, e no fim isso que importa. Num mundo onde justiceiros usam o alcance e pressão da mídia para quebrarem seus alvos à submissão, forçando aliados, ele não somente resistiu como ainda se tornou contra a hipocrisia, usando o grande alcance de sua voz em defesa dos valores sobre os quais a cultura da internet foi erguida.
    http://loly.systems/2017/07/do-escracho-ao-respeito-na-internet-a-reviravolta-de-pewdiepie/
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