Repost: Senso de Vida
Mais uma vez repostando sobre Senso de Vida (havia postado no fórum antigo), mas como é um assunto interessante e recorrente vou repostar aqui:
O artigo completo, tomei a liberdade de pular algumas partes que falam da avaliação estética de um obra de arte para focar nesse tópico a forma filosófica do que é o Senso de Vida. Uma ferramenta importante de avaliação das pessoas.
http://profissaocinefilo.blogspot.com/2014/07/senso-de-vida.html
[Nota inicial: embora o termo Senso de Vida ("sense of life") tenha sido criado pela Ayn Rand, eu não estou falando aqui em nome dela, estou apenas emprestando o conceito pra explicar minhas noções estéticas pessoais. A maioria das ideias aqui foram tiradas do livro "The Romantic Manifesto", pois de fato eu concordo com ele em quase tudo, mas várias outras coisas foram elaboradas por mim e podem não estar de acordo com as ideias de Rand.]
"Senso de Vida" é soma integrada dos valores fundamentais de um homem. É uma avaliação subconsciente que fazemos do ser humano e da existência, e que estabelece a natureza das nossas reações emocionais e a essência do nosso caráter.
Nosso senso de vida não vem primeiramente de nossas convicções explícitas - é algo formado subconscientemente, baseado em nossas experiências pessoais, e que pode estar ou não em harmonia com nossas opiniões conscientes.
Mesmo sem entender nada a respeito de filosofia, ao longo da vida um homem tem que fazer escolhas, formar uma opinião a respeito dele próprio e do mundo ao seu redor (em particular de sua capacidade de lidar com o mundo). Através de suas conclusões, ele chega a um sentimento generalizado em relação à existência - uma emoção básica que está por baixo de todas as suas experiências.
Embora suas conclusões sejam baseadas em suas experiências particulares, elas acabam se tornando um sentimento generalizado a respeito do universo como um todo.
A importância de entender o que é "senso de vida" é que ele é a principal ferramenta de avaliação das pessoas. É com base em nosso senso de vida que nós escolhemos os nossos amigos, nossos pares românticos, nossas músicas e filmes favoritos - praticamente tudo o que envolve nossas emoções. Nós aprovamos e nos sentimos atraídos pelas coisas que estão em harmonia com nosso senso de vida, e rejeitamos aquelas que não estão.
Na medida em que uma pessoa domina seus processos mentais, o senso de vida pode ser moldado por ela própria ao longo de sua formação, e chegar à vida adulta em harmonia com uma filosofia consciente. Na maior parte dos casos, o senso de vida de uma pessoa é formado por influências aleatórias, imitações, osmose cultural, e frequentemente é cheio de contradições e está em conflito com suas ideias. De qualquer forma, ninguém pode evitar de formar um senso de vida.
A filosofia é dividida em ramificações como: metafísica, epistemologia, ética, política e estética. Nosso senso de vida é formado principalmente pelas conclusões que chegamos (ou aceitamos sem pensar) a respeito de metafísica, epistemologia e ética - que são a base da filosofia e formam nossos valores mais fundamentais.
Vou listar a seguir alguns exemplos de perguntas filosóficas que são essenciais na formação de um senso de vida:
- O universo é um lugar governado por leis naturais, estável, absoluto, ou é um caos incompreensível para o homem?
- Nossa mente é capaz de compreender a realidade, ou a razão é impotente?
- O homem tem livre arbítrio ou suas escolhas são determinadas por outros fatores (cultura, genética, classe social, emoções)?
- O homem é capaz de atingir sucesso, felicidade, ou a vida é feita de dificuldades e frustrações?
- O homem é essencialmente bom, admirável, ou ele é mau e desprezível por natureza?
- As pessoas podem conviver em harmonia, ou seus interesses mais básicos estão em conflito?
- O homem deve buscar seus objetivos, ou ele deve se sacrificar (pelos outros, pela sociedade, etc)?
- O homem deve ter ambição, autoestima, sonhar alto, ou ele não deve se sobressair?
- Sua vida deve ser importante, extraordinária, ou simples e comum?
- É importante lutar pelos seus valores - ou é importante não contrariar ninguém?
- É importante ser independente e realizar algo de valor - ou é importante ganhar dos outros?
- A felicidade é importante - ou a abnegação é importante?
Respostas diferentes para as perguntas acima resultarão em pessoas com sensos de vida diferentes e irão interferir diretamente em todas as suas escolhas, preferências, em suas reações a outras pessoas e a obras de arte.
É importante lembrar que, entre os extremos, existem posicionamentos intermediários entre todas essas respostas. Por exemplo, uma pessoa pode sentir que: 1) A felicidade é o estado natural do homem e que conflitos são a exceção. 2) Que a vida é feita de grandes conflitos mas que eles são superáveis e que a felicidade pode ser conquistada com esforço. 3) Que conflitos não são superáveis e que a felicidade só pode ser atingida em moderação. 4) Que a vida é trágica e que a felicidade é uma ilusão.
Nosso senso de vida classifica as coisas de acordo com as emoções que elas evocam. No livro "The Romantic Manifesto", Rand cita uma série de exemplos concretos e sugere que emoções esses exemplos provocariam em pessoas com níveis diferentes de auto-estima. Por exemplo: uma nova descoberta, triunfo, um homem heroico, o horizonte de Nova York, cores puras, música extasiante - ou, o pessoal da casa ao lado, uma rotina familiar, um homem humilde, um vilarejo antigo, uma paisagem nebulosa, cores turvas, música folk. Pra uma pessoa com um nível de auto-estima elevado, os exemplos do primeiro grupo devem provocar admiração, exaltação, um senso de desafio. Os exemplos do segundo grupo devem provocar tédio, desinteresse ou repulsa. Pra uma pessoa com um nível mais baixo de auto-estima ou de ambição, as emoções unindo os exemplos do primeiro grupo devem ser de medo, culpa, ressentimento. As emoções unindo os exemplos do segundo grupo devem ser de alívio, conforto, a segurança de estar num universo não muito exigente.
O senso de vida de uma pessoa é algo que percebemos quase instantaneamente quando a conhecemos, pois envolve tudo a respeito dela: cada pensamento, emoção, gesto, sua postura, tom de voz, maneira de sorrir, de se vestir. É uma soma complexa de informações, mas que percebemos muito rapidamente, o que leva as pessoas a acharem que se trata de uma espécie de "energia" misteriosa que as pessoas emitem e que não se pode explicar (de fato é difícil de explicar um senso de vida - é algo que pode ser sentido, mas não compreendido imediatamente, a não ser por uma análise mais cuidadosa).
nsos de vida são formados por combinações de inúmeras percepções a respeito da vida, e podem ser extremamente diversificados. Ainda assim, é possível classificar, a grosso modo, sensos de vida entre mais "malevolentes" e mais "benevolentes". Um senso de vida malevolente é dominado pelas respostas negativas às questões filosóficas mais fundamentais (a vida é trágica, o universo é um lugar caótico, nossa mente não está em contato com a realidade, o homem é desprezível e está condenado ao sofrimento, seus interesses estão em conflito, etc), e um senso de vida benevolente é dominado pelas respostas positivas (a vida é boa, o universo é compreensível, o homem é admirável e capaz de atingir seus objetivos, seus interesses não estão em conflito, etc).
Qual senso de vida está certo e qual está errado? Eu poderia tentar explicar por que eu acho (e a Ayn Rand achava) que o senso de vida benevolente é o melhor e o que está mais de acordo com a realidade humana. Mas o principal propósito dessa postagem não é o de defender o senso de vida benevolente, e sim o de explicar o conceito e como ele interfere nas nossas preferências.
No entanto, gostaria de listar algumas crenças que costumam andar lado a lado com o senso de vida malevolente e que fazem as pessoas reagirem ao senso de vida benevolente negativamente, como algo irreal ou "superficial" (vou repetir algumas coisas já ditas acima):
- A ideia de que nossos sonhos e nossos maiores valores não podem (pela natureza das coisas) ser conquistados na Terra (o que pode ser um fato se você tiver objetivos e valores morais que vão contra a natureza).
- A ideia de que nossa mente é impotente para lidar com a realidade (o que pode ser um fato se você tiver métodos impróprios de raciocínio ou problemas psicológicos involuntários).
- A ideia de que sentimentos (e não ações) definem nosso caráter (por exemplo: se você sentiu desejo pela esposa do vizinho, isto é o mesmo que traição).
- A ideia de que o auto-interesse é mau; que os interesses dos outros estão acima dos nossos e da nossa felicidade - e que moralmente devemos nos sacrificar ("Como eu posso comprar um carro de luxo enquanto há pessoas passando fome?").
- A ideia de que os interesses das pessoas estão em conflito (que pra uma se sobressair, outra precisa ser inferiorizada, de que pra uma pessoa ficar rica, outra tem que ficar pobre, etc).
- A ideia de que tudo é relativo, de que não existe certo ou errado, bom ou mau, e que tudo é uma questão de opinião.
- A ideia de que a comunicação objetiva entre as pessoas é impossível (inclusive entre o artista e o espectador).
- A ideia de que a morte é uma tragédia (que a vida só faria sentido se existissem outras vidas, Deus, "algo mais", etc).
- A ideia de que a razão leva à tristeza, que quanto mais compreendemos a realidade, mais trágica ela parece. De que a felicidade só é possível através da ignorância.
O artigo completo, tomei a liberdade de pular algumas partes que falam da avaliação estética de um obra de arte para focar nesse tópico a forma filosófica do que é o Senso de Vida. Uma ferramenta importante de avaliação das pessoas.
http://profissaocinefilo.blogspot.com/2014/07/senso-de-vida.html
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