Parece que você é novo por este pedaço. Se você quer se envolver, clique em algum destes botões!
Os Evangelistas eram historiadores confiáveis?
Por: Richard Carrier
Tradução: Sky Kunde
A qualidade ou confiabilidade de um fonte requer uma avaliação de todos os fatores relevantes. Os evangelhos são falhos como relatos confiáveis porque falham em todos os critérios, não porque falham em um ou dois. Para encurtar a conversa, Lucas, o melhor deles, não apresenta nenhuma das qualidades de um historiador crítico e cuidadoso; em vez disso prega e propagandeia e, implicitamente, seus objetivos são ideológicos, não uma objetiva investigação em busca da verdade.
Para uma boa comparação extrema, compare os explícitos métodos de Arrian com Lucas-Atos: Arrian relata a história de Alexandre o Grande quinhentos anos após os fatos. Mas o faz explicitamente, oferecendo um método seguro. Arrian diz que ignorou todas as obras não escritas por testemunhas. Em vez disso, confiou somente em antigos textos disponíveis de testemunhas oculares da campanha de Alexandre. Eles os nomeia e discute suas conexões com Alexandre. Ele então diz que, sobre cada ponto onde eles concordam, simplesmente registraria o que eles disseram, mas, onde discordam de modo significativo, ele citaria ambos relatos e identificaria as fontes que discordam.
Contudo, este não é o melhor método – métodos modernos foram melhorados consideravelmente –, mas está entre os melhores métodos empregados na antiguidade. Isso é consideravelmente diferente de apenas escrever histórias quinhentos anos mais tarde. Deixando claro, se Arrian fez o que disse, ele é quase tão bom quanto a fonte de uma testemunha ocular (de fato, argumentavelmente melhor). Agora, perceba como Lucas não faz nada disso (nem nenhum outro evangelista).
Não temos idéia sobre as fontes que Lucas usou e para quais informações. Também não temos idéia sobre como ele escolheu em quem confiar ou quem incluir. Lucas, portanto, não pode ser associado a Arrian como historiador crítico. Ele consegue ser ainda pior quando comparado como Polybius ou Thucydides. Nem mesmo alcança o nível de historiadores inferiores como Tácito e Josefo – que, apesar de não oferecerem uma clara discussão dos seus métodos, frequentemente nomeiam suas fontes e explicitamente mostram um senso crítico ao escolher entre relatos divergentes e confusos.
O significado disso é simples: consideramos como um fato que esses historiadores executaram ao menos alguma pesquisa decente, criticamente examinaram a evidência e admitiram a dúvida ou as informações conflitantes.
Não confiamos em nenhum historiador antigo tanto quanto confiamos em um bom historiador moderno – todos os antigos historiadores erraram em diversos pontos por várias razões (então, por extensão, podemos estar certos que Lucas também errou). Mas confiamos nos antigos historiadores na medida em que eles demonstram as qualidades de um historiador confiável, como ser um pensador crítico com um interesse explícito em averiguar alegações contra documentos e relatos de testemunhas.
Todos os evangelhos discordam. Mesmo Lucas, que alega ter seguido tudo precisamente, deixa de fora muitas coisas. Lucas também reescreve o que Jesus disse ou fez de modo levamente diferente da sua fonte (provavelmente Marcos) e oferece uma cronologia muito diferente da de João. Obviamente, deve ter havido discordâncias. Um historiador crítico comentaria as discordâncias e, se possível, as resolveria nomeando e citando fontes. Por exemplo, considere os atuais esforços dos cristãos para harmonizar os relatos dos evangelhos. Isso é exatamente o que um autor como Lucas teria feito, tivesse ele sido um historiador crítico e não apenas um porta-voz defendendo uma ideologia.
Mas o problema, de fato, não é apenas que Lucas não se esforçou para resolver os conflitos e diferenças entre suas fontes, assim como como não fez qualquer esforço para listá-las, averiguá-las ou estabelecer os méritos de qualquer uma das suas fontes. Estes são problemas sérios. Mas o maior deles é que Lucas não diz nada sobre seus métodos – assim não podemos saber quão confiáveis são – ou suas fontes –, então não podemos saber quão confiáveis elas são – ou mesmo quem eram. Muitos outros historiadores ao menos nos dizem isso em algum lugar – alguns, como Appian e Josefo, mesmo ao escrever autobiografias inteiras.
Mesmo no geral, Lucas não se comporta como um pensador crítico. Um pensador crítico começa cético e somente termina crendo após encontrar fortes evidências – e então espera que sua audiência se aproxime da verdade do mesmo modo. Consequentemente, ele expressa dúvidas sobre alegações incríveis e então explica porque não acredita, ou admite em quais pontos ele acredita, mas não tem certeza, e assim por diante. Historiadores antigos nem sempre são bons nisso. Mas ao menos o fazem um pouco. Lucas não.
Entretanto, como eu havia dito, Lucas e os outros evangelistas estão, em termos de sinais de confiabilidade perceptível, entre os “historiadores” do mais baixo escalão (e, na verdade, em todo o Novo Testamento somente Lucas diz estar escrevendo história). Não são observadores neutros, mas crentes vendendo uma religião.
Notas
1- Richard Carrier permite que todos seus textos sejam traduzidos, desde que sem fins lucrativos.
2- O texto é uma adaptação, pois o artigo é uma refutação dirigida a James Patrick Holding, apologeta cristão fundamentalista.
Fonte:
http://www.infidels.org/library/modern/richard_carrier/resurrection/rubicon.html
Direitos reservados de acordo com cada publicação, 2001 ~ 2014, Fórum Religião é Veneno.
As opiniões expressas e o conteúdo publicado neste fórum por seus usuários são de responsabilidade exclusiva dos seus respectivos autores e não representam as opiniões dos administradores e moderadores do "Religião é Veneno".
Desenvolvido e mantido pela Administração e Moderação.
Comentários
Não é preciso ser Historiador profissional para atestar que mistificações em torno da biografia de personagens carismáticos podem ser criadas ainda durante a vida destes personagens. Como ocorreu com o Padre Cícero Romão Batista, sobre quem a devoção popular criou uma biografia alternativa, em nada semelhante àquela real e documentada que deixa claro que o homem de santo não tinha nada.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Pois é, mas nesta hora os religiosos têm que escolher.
Se a explicação mística é necessária para sustentar uma hipótese historiográfica, então que renunciem à hipótese historiográfica e fiquem só com a explicação mística.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Ou seja, é mais plausível a hipótese de que os evangelistas reproduziram a versão mística sobre os eventos que envolveram a morte de um personagem carismático, eventos completados por uma biografia construída com base neste misticismo.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!