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A esquerda não entende nada de índio, só de operário e camponês - Rondon, o PT e os índios isolados

Fernando_SilvaFernando_Silva Administrador, Moderador

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/514515
“Conheci todos os líderes da esquerda brasileira, só entendem de operário e camponês, não sabem nada de índio”

"O governo do PT vem destruindo sistematicamente todo o cabedal de leis que protegiam os índios. Dilma tem este grande projeto de desenvolvimento. O desenvolvimento não é contrário aos índios. É preciso respeitá-los, respeitar os ribeirinhos, respeitar os quilombolas, chamá-los para conversar respeitando seus interesses. O governo do PT não conversa com ninguém. Por isso os índios no Brasil estão tão revoltados. O governo quer fazer barragens a ferro e fogo. O governo não pergunta", afirma o sertanista Sydney Possuelo, ex-petista, em entrevista à revista Época, 14-10-2012.

Segundo ele, "conheci todos os líderes da esquerda brasileira. Só entendem de operário e camponês. Não sabem nada de índio. Índio não dá voto. Não representa ninguém. Índio serve para quê? Para o governo do PT, índio é um obstáculo ao desenvolvimento".

Eis a entrevista.

Por quanto tempo o senhor foi sertanista?

Por 42 anos. Comecei muito jovem. Os sertanistas conhecidos na época eram os irmãos Villas-Bôas, Orlando (1914-2002) e Claudio (1916-1998). Eles tinham feito muitas expedições e contatado índios isolados. E eu, jovenzinho, era encantado por essas coisas. Buscava aventura. Em 1957, descobri onde Orlando morava em São Paulo e fui pedir para trabalhar com eles. Comecei a auxiliá-los na preparação das expedições, comprando material e levando ao Xingu. O material era levado pelos aviões do Correio Aéreo Nacional. A viagem demorava dois dias a bordo de um Douglas C-47.

Como era o contato com os índios isolados naquela época?

Os sertanistas da FUNAI seguiam a metodologia criada há 100 anos pelo marechal Rondon. Ele era bem-intencionado, mas sua política de apropriação dos índios ao território nacional foi trágica. Pacificação era o nome dado à aproximação com as tribos isoladas, como se elas estivessem em guerra com o homem branco, como se não estivessem em paz com si mesmas no coração da selva. Rondon contatou muitas tribos. Quase todas desapareceram pouco depois do contato. Os índios morreram de gripe e tuberculose. Quem não morreu de doença foi morto por garimpeiros ou colonos.

O senhor chefiou o setor de índios isolados da FUNAI. Como era feito o contato com etnias isoladas?

Entre os anos 1970 e 1980, fiz contato com sete etnias isoladas. Uma delas são os índios araras. Era a época da construção da Rodovia Transamazônica. Perto de Altamira, no Pará, os araras eram arredios e guerreiros. Havia muitos casos de conflito com mortes entre os araras e colonos, operários das construtoras e o pessoal da FUNAI. Havia três grupos de araras, num total de 200 índios. A primeira coisa que fiz foi vacinar todo meu pessoal contra as doenças que poderiam infectar os índios. A segunda coisa foi proibir a entrada de qualquer um na terra dos índios. Eles foram deixados em paz. Assim, pude iniciar a aproximação. Levamos seis meses para contatar o primeiro grupo, dois anos para o segundo e oito anos para conhecer o terceiro grupo, em 1980. Este último grupo era pequeno e arredio. A maioria dos índios já havia morrido. Sobraram umas 25 pessoas, entre as quais oito homens adultos, os que atacavam na região.

O que aconteceu depois?

Os araras tinham nos recebido em suas ocas e queriam saber onde ficavam as nossas. Não podia levá-los a Altamira. Temia que adoecessem ou fossem mortos por parentes de quem eles mataram. Mas os índios insistiam em ir à casa dos brancos. Por três vezes, saíram da aldeia e foram pegos andando na Transamazônica. Por fim, levei-os a Altamira. Mas antes lavei as paredes do posto da FUNAI com creolina e cerquei tudo, para impedir que os índios entrassem em contato com a população local. Não deu certo. Os araras deram um jeito de abrir o portão e foram andar na cidade.

Eles adoeceram?

Num primeiro momento, não. Levei-os de volta à reserva e fiquei com eles uma semana. Como ninguém adoeceu, permiti que partissem. Os 60 índios se dividiram em três famílias, e cada qual foi para seu lado. Alguns permaneceram conosco. Dois dias depois, caíram doentes. Entre os índios, bastam 48 horas para uma gripe virar pneumonia. Eles morrem em dois dias. Depois de medicá-los, dividi meus homens em três equipes e fomos atrás dos outros índios. Levou três dias para achar duas famílias. Todos estavam doentes, muito fracos, quase morrendo. Não queriam tomar injeção. Apliquei soro fisiológico em mim para eles aceitarem. Levei outros dois dias para alcançar a terceira família. Uma menina, um adulto e uma mulher tinham morrido. Achamos o corpo da mulher caído na mata, em estado de decomposição. Uma menina pequena, sua filha, mantinha-se colada ao corpo da mãe e insistia em tentar mamar no peito. Salvamos a criança.

Como vive a tribo hoje?

A situação é muito ruim. O alcoolismo se alastrou. Quem não morreu virou alcoólatra. Os poucos que continuam saudáveis foram inseridos no estrato mais baixo da sociedade. Agora, o governo quer tirar suas terras para fazer a hidrelétrica de Belo Monte. Essa é a história trágica das tribos contatadas.

Esse episódio levou o senhor a acabar com a política de contato com as tribos isoladas?

Essa ideia já estava na minha cabeça, pois tinha presenciado muitas tragédias semelhantes. Queria que aquela fosse a última. Voltei a Brasília e convenci o então presidente da FUNAI, o atual senador Romero Jucá (PMDB), a manter as tribos isoladas do jeito que estavam. A nova política da FUNAI, implantada em 1986, visava proteger essas tribos. Era necessário saber onde viviam, demarcar suas terras e estabelecer um sistema de vigilância para impedir que garimpeiros, seringueiros ou colonos invadissem a reserva.

O senhor saiu do setor de índios isolados da FUNAI em 2OO6.

Saí, não. Fui defenestrado. E me jogaram pela janela. Fui demitido pelo presidente da FUNAI, Mércio Gomes, indicado por Lula em 2003. Era 2006, e eu estava na fronteira do Suriname quando um jornalista me telefonou para repercutir uma declaração de Mércio. Ele dissera que os povos indígenas tinham terra em demasia. Respondi que essa frase a gente escuta de madeireiro, de seringueiro, de político, de todos os que roubam as terras dos índios, jamais de um presidente da FUNAI. Dois dias depois, fui demitido.

Qual foi sua reação?

Fui procurar o ministro do Interior, ao qual a FUNAI era subordinada, apenas para entender que minha demissão não era um ato isolado, mas uma decisão de governo. Não comungava das ideias do Partido dos Trabalhadores.

O senhor sobreviveu ao governo Juscelino, à ditadura e à redemocratização.

Não sobrevivi ao PT. Nunca me filiei a nenhum partido. Sempre fui PT de coração, e todas as vezes que o Lula se candidatou votei nele. Até que foi eleito. Foi depois disso que comecei a rever minha posição. Após dois anos de governo, virei antilulista. Em parte pelas falcatruas que a gente vê por aí, como o mensalão. Mas sobretudo por causa da política deste governo com relação aos índios. Lula prometeu um monte de coisas e não fez nada. Depois veio a Dilma, e a coisa ficou pior. O governo do PT vem destruindo sistematicamente todo o cabedal de leis que protegiam os índios. Dilma tem este grande projeto de desenvolvimento. O desenvolvimento não é contrário aos índios. É preciso respeitá-los, respeitar os ribeirinhos, respeitar os quilombolas, chamá-los para conversar respeitando seus interesses. O governo do PT não conversa com ninguém. Por isso os índios no Brasil estão tão revoltados. O governo quer fazer barragens a ferro e fogo. O governo não pergunta.

Um exemplo é a hidrelétrica de Belo Monte?

Exatamente. O governo decide e pronto. Se quem protesta é branco, é retirado à força. Se for índio ou quilombola, é simplesmente ignorado.

Quando voltar ao Brasil, o senhor vai fazer o quê?

Voltarei em 2013. Neste governo petista, lugar para mim não tem. Se tivesse, não aceitaria. Conheci todos os líderes da esquerda brasileira. Só entendem de operário e camponês. Não sabem nada de índio. Índio não dá voto. Não representa ninguém. Índio serve para quê? Para o governo do PT, índio é um obstáculo ao desenvolvimento.

Comentários

  • 9 Comentários sorted by Votes Date Added
  • Fernando_SilvaFernando_Silva Administrador, Moderador
    Comentário de leitora:
    A IHU quer perder sua seriedade divulgando acusações infundadas, de uma pessoa que nem filiada era no PT. Claro que o PT possui intelectuais que lutam pelos direitos dos indígenas. E com relação ao apoio do Lula no caso da Raposa Terra do Sol em 2009??Mandando tirar os arrozeiros das terras indígenas, que ninguém tinha coragem de fazer até então?? Isso vocês não deram ênfase??!!
    Querer parar as obras de Belo monte todos querem, principalmente a oposição junto com a mídia comprometida com o capital, mas deixar de consumir energia elétrica ou optar por produtos que não necessitem deste consumo, ninguém abre mão, não é mesmo?? Hipócritas é o que o entrevistado e o entrevistador são!
  • Ah! Sim... O caso dos arrozeiros. Bem, havia índios que queriam os arrozeiros por lá, pois viam neles uma oportunidade para sair da "vida de índio", ver novos horizontes. Mas a turminha politizada pelas esquerdas ganhou no grito. Deve ser gozado: os tais índios, uma dezena de gatos pingados, tem milhões de hectares só pra eles. Mas precisam que o branco vá lá levar comida, remédios, etc e tal... Não tem nada disso nos milhões de hectares que eles têm a sua disposição? E os famosos remédios que os índios tiram da floresta?

    E uma decisão boba como esta acaso faz parecer que o PT é o partido do diálogo e conciliação? Pelo jeito há muitos intelectuais indianistas petistas... Que só viram índio em filme de Hollywood.
  • CameronCameron Membro
    edited outubro 2012 Vote Up0Vote Down
    A esquerda não entende nada de índio[...]
    A esquerda não entende nada sobre coisa alguma que não seja como abusar do poder tão logo suas garras o atinjam...
    Post edited by Cameron on
    Come with me if you wanna live.
  • AcauanAcauan Administrador, Moderador
    Fernando_Silva disse: “Conheci todos os líderes da esquerda brasileira, só entendem de operário e camponês, não sabem nada de índio”

    Sou a prova viva disto.

    Acauan dos Tupis
    Nós, Indios.
    Lutar com Bravura, morrer com Honra!
  • AcauanAcauan Administrador, Moderador
    Fernando_Silva disse: Comentário de leitora:

    "Querer parar as obras de Belo monte todos querem, principalmente a oposição junto com a mídia comprometida com o capital,..."

    É... O "capital" odeia usina hidrelétrica...
    Acauan dos Tupis
    Nós, Indios.
    Lutar com Bravura, morrer com Honra!
  • O "capital" é um coringa que pode ser usado toda vez que alguma coisa, seja lá o que for, estiver contrariando os interesses dos militantes.
    Come with me if you wanna live.
  • AcauanAcauan Administrador, Moderador
    Cameron disse: O "capital" é um coringa que pode ser usado toda vez que alguma coisa, seja lá o que for, estiver contrariando os interesses dos militantes.

    Militância que, diga-se, tem alcançado a excelência a militar pelo ridículo, desde as manifestações racistas contra o Ministro Joaquim Barbosa até esta, de acusar o "capital" de ser contra hidrelétricas. Acho que querem convencer o mundo que grandes barragens são construídas por grandes mutirões de trabalhadores cooperativados e não por mega-corporações construtoras, fabricantes de equipamentos elétricos pesados e concessionárias de distribuição de energia.

    Acauan dos Tupis
    Nós, Indios.
    Lutar com Bravura, morrer com Honra!
  • NightWalkerNightWalker Membro
    edited outubro 2012 Vote Up0Vote Down
    Acauan disse: Militância que, diga-se, tem alcançado a excelência a militar pelo ridículo...
    Tenho tido a mesma impressão.

    A militancia petista, perdeu totalmente a noção da realidade, parece que enlouqueceram ao perceberem que eles também podem ser punidos, que não são os donos do Brasil.

    A militancia petista está totalmente sem noção assim como o presidente de seu partido, o poder já subiu tanto a cabeça que acreditam ser um absurdo alguém discordar deles, escancaram claramente seus desejos ditatoriais totalitaristas. A militancia mais que tudo mostra o quanto é burra, cega e ovelhinha, seria comico se não fosse trágico essa gente estar no poder.

    Militancia petista:
    burro-cantar1.jpg
    burro+pt.jpg

    Como a militancia vê seu idolo:
    LULA_JESUS_CHAVEZ.jpg
    Lula_criou_o_Brasil.jpg
    lula_seja_louvado.jpg
    Post edited by NightWalker on
    - Quem deseja me desarmar são os que querem me fazer mal e tem medo que eu possa me defender.

    - “É isto que dá ao comunismo seu peculiar caráter fanático. Tem sido observado que se trata de uma religião secular (ou de uma fé?) que tem seu céu e seu inferno, seus eleitos e seus malditos, seus livros sagrados e os ungidos que podem interpretá-los. De qualquer maneira, o comunismo é um remanescente das seitas religiosas da Idade Média”. Carew Hunt (A Guide to Communist Jargon).
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