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Chico Xavier: O plagiador

JohnnyJohnny Membro
UMA ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO LIBERTAÇÃO E LOCALIZAÇÃO DO NOSSO LAR ORIGINAL
Eduardo José Biasetto

INTRODUÇÃO

Não existiram maiores dificuldades para encontrar várias semelhanças entre as obras Libertação, alegada psicografia de Chico Xavier pelo suposto espírito André Luiz e A vida além do véu, suposta psicografia de George Vale Owen por alegados espíritos diversos. Tais semelhanças levam à conclusão que Xavier plagiou a obra de Owen; porém, existiram dificuldades para organizar & apresentar essas semelhanças, em virtude de dois aspectos: a) as duas obras são consideravelmente extensas; b) as semelhanças nem sempre se encontram em sequências de fácil percepção; algumas vezes, entre as similaridades, há longos discursos fideístas que precisam ser removidos para possibilitar uma fácil percepção das sequências copiadas.
Por conseguinte, surgiu a dúvida de como evidenciar o plágio. Primeiramente, considerei organizar o texto em quadros comparativos, citando ambas as obras; porém, além de se tratar de uma tarefa bastante trabalhosa, pois muitas semelhanças não são textuais, mas sim contextuais, esta apresentação também exigiria um artigo bastante longo, motivo pelo qual descartei tal possibilidade. Então, a opção foi apresentar as evidências num texto-síntese, com citações curtas das passagens semelhantes das obras, seguidas de um comentário.
Para evidenciar a prática de plágio, três circunstâncias podem comparecer: 1) pode haver plágio textual & contextual, com palavras idênticas ou sinônimas & frases idênticas ou similares sendo utilizadas em textos de autores diferentes que tratam do mesmo assunto ou contam uma mesma história, sem a devida citação; 2) plágio narrativo, quando a sequência de ocorrências da narração de uma história ou assunto é a mesma ou similar em textos de autores diferentes, sem a devida citação; 3) plágio estilístico, quando o modo de escrever de autores distintos é muito semelhante. Esta última possibilidade foi aqui desconsiderada, por implicar em longo e mais subjetivo desenvolvimento, muito acima das possibilidades deste breve estudo. Permanecem os itens 1 & 2, que significam que um determinado escritor não é o autor, ou seja, que a idéia imbricada na narrativa de uma história pertence a outro alguém, o verdadeiro autor, intencional e dolosamente oculto.
NOTÍCIAS HISTÓRICAS
O reverendo Owen nasceu em 1869, em Birmingham, na Inglaterra, e desencarnou em 09/03/1931. Inicialmente, foi um religioso protestante e, em seguida, um médium espiritualista[4]. Owen ordenou-se sacerdote anglicano em Liverpool, aos vinte e quatro anos, passando a trabalhar como religioso profissional; em 1909, após o desencarne de sua mãe, suas alegadas capacidades mediúnicas despertaram, começando a receber supostas comunicações de sua genitora falecida em 1913; destacou-se como médium na Inglaterra até os primeiros anos da década de 20.
Algumas das mensagens que Owen recebeu constituíram quatro livros, reunidos sob o título de A vida além do véu. No início, recebia mensagens de sua mãe que, como novata no além, descrevia-o ao seu filho; em seguida, começou a receber mensagens mais filosóficas, de um espírito ou anjo que se identificava como Astriel, reunidas no livro Os baixos campos do céu, ao qual seguiu-se o livro Os altos campos do céu. Na sequência, veio à luz o livro Os mistérios do céu, inspirado por um espírito ou anjo que se identificava como Leader, que assumiu o monopólio de suas comunicações posteriores (mudando de nome para Ariel). Essas mensagens formaram o quarto e último livro, Os batalhões do céu. O volume resultante foi prefaciado por Arthur Conan Doyle, famoso espiritualista inglês, célebre pela autoria da série Sherlock Holmes.
Possivelmente, a opção do Ministro Owen pela condição de médium tenha resultado na perda de sua paróquia anglicana e, por conseguinte, de sua fonte de recursos primeira; aos cinqüenta e três anos de idade, iniciou a tarefa de divulgar o espiritualismo nos EUA, onde fez palestras e, regressando posteriormente à Inglaterra, proferiu mais de cento e cinqüenta conferências[5].
Xavier nasceu em Pedro Leopoldo/MG, em 02/04/1910, e desencarnou em Uberaba, em 30/06/2002. Foi o “médium” espírita mais conhecido e influente do Brasil; nasceu numa família humilde e, segundo biógrafos, sua alegada mediunidade teria se manifestado pela primeira vez aos quatro anos de idade, quando respondeu ao pai sobre ciências durante conversa com uma senhora. Dizia ver, ouvir e conversar com espíritos. Afirmou ter psicografado mais de quatrocentos livros – nunca admitiu ser o autor de nenhuma dessas obras, dizendo reproduzir apenas o que espíritos lhe ditavam. Assim, diz-se, não aceitava o dinheiro arrecadado com a venda de seus livros, mais de cinqüenta milhões de exemplares em português, com traduções em inglês, espanhol, japonês, esperanto, italiano, russo, romeno etc. Afirmava ter psicografado as cerca de dez mil cartas que produziu, nas quais pessoas mortas davam notícia às famílias. Desde o primeiro livro, diz-se, cedeu os direitos autorais para organizações espíritas e instituições de caridade; uma de suas obras mais reconhecidas é Libertação, publicada inicialmente em 1949[6].
Uma das críticas que recebi ao postar artigos no blog de Visoni, sobre as relações entre A vida além do véu e livros psicografados por Xavier, envolve a questão de quando o livro de Owen teria sido traduzido pela primeira vez para o português. Após muito pesquisar, consegui encontrar a resposta: por volta de 1920, Owen já havia concluído sua obra e, no Brasil, Carlos Imbassahy (1883-1969, advogado, jornalista e escritor espírita) foi quem primeiramente verteu o livro do reverendo inglês para o português, publicando sua tradução em 1921, segundo assentamentos da Federação Espírita Brasileira[7].
EVIDÊNCIAS DE SIMILARIDADES
1ª) Em 2010, as semelhanças existentes entre passagens da Introdução (atribuída a Emmanuel, o suposto espírito-guia de Xavier) ao livro Libertação, de Xavier, e passagens de um conto “psicografado” pela “médium” inglesa Joan Grant, e publicado também em 1942, foram percebidas no exterior por Guy Lyon Playfair:
“Esta história aparece no livro de Joan Grant, The scarlet fish & other stories, publicado em 1942 e, até onde fui capaz de descobrir, nunca havia sido traduzida para o português. A versão de Chico consta na Introdução (por Emmanuel, seu guia principal) do livro Libertação, publicado em 1949” (negritos meus) [8].
O caso veio à tona por ocasião da publicação do livro Deus conosco, em 2007, por Wanda Joviano, filha de ex-patrão de Xavier[9]; nessa obra, ela reuniu diversas mensagens inéditas do “médium” mineiro. Candidamente, a própria organizadora da compilação informa ter traduzido a história do Peixinho vermelho do livro de Grant e apresentado seu trabalho a Xavier:
“Nota da organizadora: a antiga lenda do Peixinho vermelho consta de um dos livros da médium inglesa Joan Grant, sobre o Egito antigo. Eu a tinha lido em inglês, e contei ao Chico. Muito sensibilizada fiquei quando soube que Emmanuel a incluíra no prefácio do livro Libertação, de André Luiz, revelando que estivera presente à nossa conversa” (negritos meus)[10].
Em 2007, através do livro de Joviano, tornou-se público que, privadamente, em mensagem datada de 26/01/1949, o próprio Xavier admitiu ter utilizado uma tradução, feita pela “irmã Wanda”, para escrever sua versão da lenda do peixinho vermelho. Segundo Xavier, em mensagem assinada por seu suposto espírito-guia, Emmanuel, no capítulo intitulado Os dons de servir:
“Agradecemos a cooperação com que nos auxiliastes na projeção do novo trabalho de André Luiz, registrando, igualmente, nosso reconhecimento pela história do Peixinho vermelho, que tão bem se ajustou aos nossos propósitos de apresentação. (nota 1: Gratos à nossa irmã Wanda pela tradução oportuna e fiel” (negrito meu)[11].
Assim, desde 1949 até 2007, por ocasião da publicação de Libertação até a publicação do livro de Joviano, Deus conosco, a origem do texto “psicografado” por Xavier & Emmanuel permaneceu oculta; o máximo que Xavier disse foi o seguinte:
“Ante as portas livres de acesso ao trabalho cristão e ao conhecimento salutar que André Luiz vai desvelando, recordamos prazerosamente a antiga lenda egípcia do peixinho vermelho” (negrito meu)[12].
Ou seja, embora Xavier afirme tratar-se de uma lenda, retirada supostamente de tradição egípcia antiga, não informa que a história foi extraída de um texto moderno de Grant, anterior ao seu, em livros publicados em 1937 & 1942[13], nem que soube dessa história graças à tradução de Joviano a partir do idioma inglês. O processo “psicográfico” de Xavier nada teve de “espiritual”, e a ausência de citação caracteriza plágio, até porque trata-se de uma longa e estrita tradução, com uso praticamente literal de um extenso texto alheio. Ademais, resta provado que Xavier tinha quem lhe auxiliasse na obtenção e tradução de textos em idioma estrangeiro. Por fim, vale lembrar que o enredo seja do conto Scarlet fish de Grant ou do Peixinho vermelho de Xavier não tem origem conhecida no Egito antigo, e sim no livro 7 de a República de Platão, o famoso mito da caverna, fonte real e muito bem conhecida de tal tema. Seguem os textos de Grant e Xavier:

“In the middle of a garden there was a very large and beautiful pool. It was tiled in turquoise colour, and fresh water always ran into it through a little stone channel and out again through a grid at the other end. In it there lived a lot of very, very fat contented fishes, and one little scarlet fish”.
“No centro de formoso jardim, havia grande lago, adornado de ladrilhos azul-turquesa. Alimentado por diminuto canal de pedra, escoava suas águas, do outro lado, através de grade muito estreita. Nesse reduto acolhedor, vivia toda uma comunidade de peixes, a se refestelarem, nédios e satisfeitos (…). Junto deles, porém, havia um peixinho vermelho”.
“The big fat fish ate up all the flies and all the worms, and they took for themselves all the nicest shadow caves, which the lotus leaves made. But the poor little scarlet fish had very little to eat and no private place where he could sleep out of the hot sunshine”.
“Menosprezado de todos[, ... n]ão conseguia pescar a mais leve larva, nem refugiar-se nos nichos barrentos. Os outros, vorazes e gordalhudos, arrebatavam para si todas as formas larvárias e ocupavam, displicentes, todos os lugares consagrados ao descanso”.
“He couldn’t spend his time eating or being lazy in the shade, so he had to do a lot of thinking to keep himself from going sad. And he explored every bit of the pool, until he knew just how many tiles were on the walls, and which lotus bud was going to open next”.
“O peixinho vermelho (…), em correria constante, perseguido pela canícula ou atormentado de fome (…), não dispunha de tempo para muito lazer e começou a estudar com bastante interesse. Fez o inventário de todos os ladrilhos que enfeitavam as bordas do poço, arrolou todos os buracos nele existentes”.
“The little scarlet fish got thinner and thinner, until one day, when he was swimming past the grating, he knew that he was thin enough to swim right through it. It was rather a struggle getting through, and he lost quite a lot of his scales doing it, but at last he was free. He swam down the water-channels until he got to the great river; and he swam on and on down the great river until he came to the sea”.
“Apesar de macérrimo pela abstenção completa de qualquer conforto, perdeu várias escamas, com grande sofrimento, a fim de atravessar a passagem estreitíssima. Pronunciando votos renovadores, avançou, otimista, pelo rego d’água, encantado com as novas paisagens, ricas de flores e sol que o defrontavam, e seguiu, embriagado de esperança… Em breve, alcançou grande rio (…). Conseguiu, desse modo, atingir o oceano”.
“Once, he saw a fish so big that he could have drunk the whole of his home pool for breakfast and still have been thirsty. The great fish was swimming along with his mouth open, collecting his breakfast, just like a fisherman drawing in his net, and the poor little scarlet fish went down his throat into the awful churning darkness of the great fish’s belly. Then the little scarlet fish prayed very hard to the god of fishes, and the god heard him in spite of his being in such a dark place. And the god made the big fish have hiccoughs, and he hiccoughed the little scarlet fish back into the sea again”.
“Fascinado pela paixão de observar, aproximou-se de uma baleia para quem toda a água do lago em que vivera não seria mais que diminuta ração; impressionado com o espetáculo, abeirou-se dela mais que devia e foi tragado com os elementos que lhe constituíam a primeira refeição diária. Em apuros, o peixinho aflito orou ao Deus dos Peixes, rogando proteção no bojo do monstro e, não obstante as trevas em que pedia salvamento, sua prece foi ouvida, porque o valente cetáceo começou a soluçar e vomitou, restituindo-o às correntes marinhas”.
“Then the little scarlet fish found a beautiful palace of coral in the clear, green depths of the sea; and beautiful little fishes with blue and gold spots brought him the most lovely fat worms on mother of pearl plates. He enjoyed it so much that he might have stayed there the rest of his life; but he wanted to go back to his own home pool”.
“O pequeno viajante, agradecido e feliz, procurou companhias simpáticas (…), descobriu a existência de muitos peixinhos, estudiosos e delgados tanto quanto ele, junto dos quais se sentia maravilhosamente feliz. Vivia, agora, sorridente e calmo, no Palácio de Coral (…). O peixinho pensou, pensou… (…) deliberou (…) [e] empreendeu comprida viagem de volta”.
“So he left the sea and swam back up the river. And on the way he had many more adventures, and some were nearly as dangerous as being swallowed by the great big fish. And he swam and he swam up the long river, and up the water channels, until he came to his own grating, and now he was so thin from his adventures that he got through it quite easily. He thought everybody would be very surprised to see him again, but nobody had even noticed he had been away”.
“Tornou ao rio, do rio dirigiu-se aos regatos e dos regatos se encaminhou para os canaizinhos que o conduziram ao primitivo lar. Esbelto e satisfeito como sempre, pela vida de estudo e serviço a que se devotava, varou a grade e procurou, ansiosamente, os velhos companheiros. Estimulado pela proeza de amor que efetuava, supôs que o seu regresso causasse surpresa e entusiasmo gerais. Certo, a coletividade inteira lhe celebraria o feito, mas depressa verificou que ninguém se mexia”.
“He swam up to a big, very fat fish, who was the king fish of the pool, and he said, ‘Stop eating and blowing bubbles, and listen to me, you fat and foolish fish! I have come to tell you of all the wonderful things that happened to me on the other side of the grating; and I shall teach you to grow thin, so that you, too, may go upon the same journey and become as wise as I am.’ The fat fish swam towards the grating, and when he saw that the bars were so close together that not even one of his fins could go between them, he blew two bubbles, slowly and scornfully, and said, ‘Silly little scarlet fish! Do not disturb my meditations with your foolish chatter. I am much wiser than you are, for I am king of all the fish. How could you have got through the grating when even I cannot put a fin through it?’ And the big fat fish swam back to the shadows under the lotus leaves. The little scarlet fish was very sad that nobody would listen to him; so he slipped through the grating and swam back towards the sea” [14].


“Procurou, então, o rei de guelras enormes e comunicou-lhe a reveladora aventura. (…) Finalmente os informou de que semelhante felicidade, porém, tinha igualmente seu preço. Deveriam todos emagrecer (…). O soberano da comunidade, para melhor ironizar o peixinho, dirigiu-se em companhia dele até à grade de escoamento e, tentando, de longe, a travessia, exclamou, borbulhante: — “Não vês que não cabe aqui nem uma só de minhas barbatanas? Grande tolo! Vai-te daqui! não nos perturbes o bem-estar… Nosso lago é o centro do Universo… Ninguém possui vida igual à nossa! Expulso a golpes de sarcasmo, o peixinho realizou a viagem de retorno”[15].


Fonte: http://obraspsicografadas.org

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