Alemanha de Hitler foi principal parceira do Brasil de Getúlio
Alemães e americanos disputaram primazia econômica e ideológica no Brasil dos anos 1930
Na esteira da crise de 1929, a Revolução de 1930 levou Getúlio Vargas ao poder no Brasil. Em meio à escassez de crédito e mercados no plano internacional, o governo de Getúlio teve como principais parceiros comerciais dois protagonistas da Segunda Guerra Mundial (1939-1945): a Alemanha nazista e os Estados Unidos.
Para alemães e americanos, o Brasil era um importante aliado por questões econômicas - fornecimento de matéria-prima - e por aspectos estratégicos. Os dois países “disputaram arduamente a primazia, não apenas econômica, mas também ideológica na agenda internacional do Brasil”, afirmou ao iG João Daniel Almeida, mestre em Relações Internacionais e professor de Política Externa Brasileira da pós-graduação da PUC-RJ, Cândido Mendes e FGV-RJ.
O governo brasileiro, dividido entre grupos pró-Alemanha e pró-EUA, tratou de aproveitar ao máximo a rivalidade entre os dois países em benefício próprio. “Os anos 1938-1940 são extremamente complicados para a diplomacia varguista, pois muitos achavam que o Estado Novo tinha de aderir ao modelo autoritário nazista e anticomunista em vez de ficar do lado das democracias decadentes”, disse Paulo Roberto Almeida, diplomata e doutor em Ciências Sociais. “O Brasil queria se equipar militarmente, e nenhuma potência ocidental prometia ajudá-lo, pois tinham suas próprias preocupações de segurança.”
Assim, no final dos anos 1930, a Alemanha de Adolf Hitler alcançou o posto de principal parceiro comercial do Brasil. O quadro se inverteu no início da década seguinte, e o governo Vargas se aproximou mais dos EUA. Osvaldo Aranha, ministro das Relações Exteriores de 1937 a 1944, foi decisivo na aliança com Washington. “Primeiro seguindo os EUA no neutralismo pró-democrático, entre 1939 e 1941, depois alinhando decisivamente o Brasil com os EUA após o ataque a Pearl Harbor”, diz Almeida, em referência ao bombardeio japonês à base americana de Pearl Harbor, no Oceano Pacífico, em 1941. O episódio, que matou mais de 2,4 mil militares americanos, marcou a entrada dos EUA na guerra dos aliados contra o Eixo (Alemanha, Japão e Itália).
No livro “O Tio Sam Vai ao Brasil”, o doutor em Política Externa brasileira Gerson Moura classifica esse período de barganhas entre EUA e Alemanha de "equidistância pragmática", pois, mesmo em situação de dependência, o Brasil alcança relativo grau de autonomia.
A crise dos anos 1930 também incentiva o governo a seguir uma política protecionista, estatizante, com um Estado forte e controlador e voltado para o desenvolvimento industrial interno. O "desenvolvimentismo” surge por causa de pressões internas e externas, de acordo com Amado Luiz Cervo, professor de História da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto Rio Branco e autor da “História da Política Exterior do Brasil”.
“As pressões externas advêm da crise do capitalismo e da conseqüente queda das exportações primárias brasileiras, especialmente de café, o que inviabiliza a manutenção do esquema tradicional de exportações primárias e importações de manufaturados”, afirma o professor. “As pressões internas vêm da urbanização e das necessidades de emprego, renda e bem-estar para as massas urbanas, da crítica de intelectuais brasileiros indignados com o atraso histórico do Brasil, da burguesia ávida por negócios e dos militares que desejam o provimento de meios de defesa.”
A industrialização aparece como resposta a pressões, problemas e desafios econômicos. De acordo com Cervo, esse é o momento em que o Estado e a política exterior brasileira passam a buscar o desenvolvimento interno, servindo, assim, aos interesses de todos os segmentos sociais, e não apenas da elite agroexportadora.
Para Carlos Vidigal, doutor em Relações Internacionais e professor de História da América na UnB, a industrialização era também a forma mais efetiva de proteger o País em um cenário internacional “marcado pelo protecionismo e pela corrida armamentista”.
Um exemplo que sintetiza a política interna e externa, assim como o grau de industrialização do Brasil na época, é a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) de Volta Redonda, a primeira siderúrgica do Brasil e a maior da América Latina.
Antes de o Brasil se aliar a Washington, em 1941, os EUA hesitavam em financiar e dar o know-how necessário para a construção da siderúrgica, o que, inicialmente, fez o Brasil recorrer à Alemanha. No entanto, sua construção pelo governo brasileiro só foi possível graças a um acordo com Washington que previa o financiamento da indústria em troca da criação de bases militares americanas no Rio Grande do Norte.
Oitenta anos depois, a diplomacia brasileira continua com o mesmo objetivo, segundo Cervo. “A promoção do desenvolvimento permaneceu o motor da ação externa.”
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