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Entrevista com Gustavo Ioschpe sobre a educação na China




VEJA: Bom dia a todos! Vamos iniciar agora a conversa com o economista Gustavo Ioschpe sobre a reportagem de capa de VEJA desta semana sobre o sistema de ensino da China.


VEJA: Bom dia, Gustavo!

Comentário de Diego Moita
Bom dia Gustavo.

Comentário de Hélio Colaço - Canadá
Bom dia, GUstavo


Gustavo Ioschpe: Bom dia a todos e obrigado pela presença

Comentário de Leandro
Bom dia

Comentário de carlos
bom dia


VEJA: Gustavo, para começar: você poderia nos contar um pouco dos bastidores desta reportagem sobre o sistema de ensino chinês.

Comentário de Luiza Silva
Bom dia

Comentário de Hellene
Bom dia!


Gustavo Ioschpe: A reportagem levou quase um ano, do início ao fim. Foram oito meses apenas pra conseguir passar pelo processo de obter um visto.


Gustavo Ioschpe: Depois veio a viagem, em que fiquei dez dias entre Pequim, Xangai e Shenzhen, com o grosso do tempo em Xangai, que era o alvo principal da matéria.


Gustavo Ioschpe: Fui acompanhado de um fotógrafo inglês e uma tradutora chinesa, que morria de vergonha cada vez que eu perguntava aos alunos sobre se já tinham namorado, bebido ou ido à balada.

Comentário de Fabiana Faria
Fabiana Faria - pedagoga com especialização no Japão Bom dia Gustavo . A sua reportagem sobre a educação chinesa é bastante rica e interessante .

Gustavo Ioschpe: O ritmo foi bastante intenso, trabalhando durante todo o dia visitando escolas e universidades e falando com autoridades públicas, e às vezes à noite tendo jantares com entrevistas também. Mas acho que foi bastante produtiva, e deu pra ter uma boa ideia do que fez Xangai chegar ao número 1 do PISA.

Comentário de Fabiana Faria
No seu ponto de vista quais os aspectos da educação chinesa pode ser adaptado para o Brasil , sendo dois países com uma cultura completamente diferente ?


Gustavo Ioschpe: Obrigado, Fabiana. Foi muito interessante pra mim fazê-la também.


Gustavo Ioschpe: Fabiana, acho que há uma série de coisas que podemos tentar copiar, desde as mais simples - como mudarmos o horário das aulas pra que tenhamos 40 minutos de aula e 10 minutos de intervalo, pra que sempre comece no horário, ao invés dos nossos 50 minutos corridos, em que sempre há atrasos - até algumas mais complexas. A mais importante, porém, me parece ser a prática dos grupos de estudo de professores, que compartilha as melhores práticas da rede, acompanha e monitora o trabalho de todos toda a semana, fazendo com que o nível de qualidade suba.


Gustavo Ioschpe: Importante notar que, antes de copiar o que quer que seja em escala nacional, precisamos testar a política em algumas regiões e comprovar empiricamente se há aumento de qualidade do ensino ministrado. Não dá pra ser no achismo.

Comentário de Vieira
Gustavo, acho a questão mais complexa do que simplesmente o ambiente escolar. No Brasil, os pais não educam, não comparecem às reuniões, não cobram tarefa feita, deixando tudo para os professores. Pior que isso, não ensinam nada sobre cidadania. E sobre isso, na China, o que você viu?


Gustavo Ioschpe: Na China há uma cultura bastante diferente, de valorização do estudo, que vem desde a época da instituição dos exames imperiais, no século sétimo. Não vamos conseguir mudar essa cultura no curto prazo, então é especialmente importante que, nesse cenário de baixa demanda social, a escola seja excepcional. Precisamos de grandes professores, diretores e gestores pra iniciar a reviravolta educacional de que precisamos. Enquanto o sistema educacional transferir a responsabilidade pros pais de alunos, ficaremos empacados.


Gustavo Ioschpe: Temos mais perguntas?

Comentário de Elaine Bueno
Xangai não é um país, mas uma província que nem de longe pode ser comparada à China como um todo. Como é possível extrapolar uma experiência tão específica e falar como algo a ser copiado?


Gustavo Ioschpe: Xangai é uma província de quase 20 milhões de habitantes, maior do que a maioria dos países que participam do PISA. Como eu escrevo no artigo que está publicado online, creio que há muitas ideias boas que podem ser copiadas, desde que - e isso é importante - sejam testadas em pequena escala e empiricamente comprovadas. A gente precisa parar de achar desculpas pra não olhar o que está dando certo em outros lugares. Precisamos aprender com os erros e acertos de outros países e parar de olhar apenas pra nossa história.


VEJA: Na reportagem, você mostra que o governo chinês incentiva pesquisadores a buscar financiamento junto a empresas estrangeiras – caso de Wei Du, que faz pesquisas com biodiesel. Aqui, a situação, em geral, é diferente: há grande resistência a essas parcerias. Por que isso ocorre?


Gustavo Ioschpe: Creio que por conta de uma visão ideológica, que sugere que a academia não deva se "render" ao mundo produtivo. Parece-me uma visão atrasada. O setor produtivo é o que gera o crescimento do país. Deve ser um aliado, não um inimigo. Especialmente se a verba da pesquisa é pública, a aplicabilidade dos seus resultados é importante.
09:30

VEJA: Na China, como mostra a reportagem, professores não ganham especialmente bem. Como explicar a dedicação deles ao ensino?


Gustavo Ioschpe: Pessoalmente, acredito que a dedicação profissional é condição sine qua non de todo e qualquer profissional. Uma pessoa que não está motivada para trabalhar em uma carreira deveria procurar outro emprego. Essa dedicação chinesa não carece, portanto, de explicações. O que é inexplicável é que, no Brasil, haja tantos profissionais no sistema escolar que não estão nem aí para os seus alunos e seu aprendizado.

Comentário de Vieira
Gustavo, fale sobre o Enem de lá? É um exame nacional? Como ele é aplicado? E sobre distorções no exame, você identificou algo?


Gustavo Ioschpe: Vieira, lá há dois exames nacionais. Um é o jun kao, aplicado ao fim do ensino fundamental, que decide qual escola de ensino médio o aluno poderá frequentar. Quanto melhor a nota, mais próximo da sua primeira opção de escola o aluno ficará. Se a nota for muito baixa, ele só poderá cursar escola técnica.
O segundo é o gao kao, exame que é feito para entrada na universidade. A lógica é a mesma do jun kao: quanto melhor o escore, melhor a universidade que o aluno conseguirá entrar. Todo o país faz o exame ao mesmo tempo, mas cada província (estado) desenvolve o seu. Não ouvi nenhum relato de problemas de aplicação, pelo contrário: no dia do gao kao, o governo manda suspender obras e desviar rotas de aviões para que o barulho não atrapalhe os alunos.

Comentário de Felipe Mourão
Em quanto tempo você acredita que seria possível implementar um modelo mais produtivo na educação brasileira?


Gustavo Ioschpe: Felipe, acho que podem haver mudanças imediatas. Há uma literatura extensa sobre, por exemplo, quais práticas de sala de aula geram mais aprendizado, destacando-se dentre elas o uso constante de dever de casa, avaliação, uso eficaz do tempo de sala de aula e outros. Já escrevi artigo sobre isso pra Veja, chamado "Como melhorar a educação brasileira".
Pra mudarmos o sistema como um todo e ter algo mais parecido com os sistemas educacionais dos países top, no ritmo atual, levaria séculos. Mas precisamos gerar pressão pra acelerar esse processo. As crianças não podem esperar.

Comentário de Sidnei Moraes
Bom dia, Gustavo. Na China existe um sistema de avaliação dos professores? Como funciona?


Gustavo Ioschpe: Sim, todo professor é enquadrado em três ou quatro categorias, dependendo da província, que vai do "insuficiente" ao "ótimo". Ele é baseado, normalmente, na junção de alguns fatores: prática de sala de aula (observada pelo diretor da escola e outros professores), resultados dos alunos em provas, prêmios que o professor tenha recebido e pesquisa que tenha publicado.


Gustavo Ioschpe: A avaliação é tornada público dentro de cada escola, para os outros professores (não para os alunos).


VEJA: Professor Hélio Colaço - No mínimo um quarto dos meus alunos são chineses récem-chegados. Eles tem um jeito diferente de levantar a mão como vc disse, e alguns até arrastam os pés qdo andam. São como robôs – seguem as instruções para ter “A+”. Normalmente conseguem. Muito disciplinados. É fácil dar aula prá eles. Mas na hora q criatividade é necessária – “F” prá eles. Não consigo ver um chinês comediante – como o Jô, por exemplo. Como balancear isso?


Gustavo Ioschpe: Esse é o desafio da China pras próximas décadas, e todos estão conscientes de que precisam melhorar no quesito criatividade, flexibilidade etc. Mas a China fez uma opção pragmática: primeiro se asseguram de que todos os alunos tenham as competências acadêmicas básicas - ler e escrever, dominar a Matemática etc. - e só quando isso foi alcançado é que eles agora se voltam para essas áreas mais exigentes. Sinceramente, acho uma lição para o Brasil. Aqui acabamos usando a criatividade ou alegria dos alunos pra justificar que sejam analfabetos ou ignorantes. A grande maioria das pessoas não têm o talento de um Jô Soares, e precisa ter uma sólida base acadêmica para ter boas perspectivas de vida.

Comentário de Allan
Gustavo, na reportagem você fala da rotina de estudos que um aluno leva até realizar o Gao Kao, onde geralmente um ano antes do teste os adolescentes estudam todos so dias com uma carga-horario pesada de estudos. Como você avalia essa cobrança e essa rotina de estudos, onde o adolescente (pelo visto) não possui tempo para descanço e nem lazer. Você acha isso prejudicial?


Gustavo Ioschpe: Allan, realmente fiquei surpreso com a carga de estudos e como eles abdicam de muitas coisas que pra nós são naturais e indispensáveis, como os namoros, a vida noturna etc. Curiosamente, não notei sinais de tristeza ou desajuste por conta desse sistema. Ao voltar, pesquisei sobre dados objetivos de desajuste social - como depressão, suicídio juvenil e alcoolismo - e em todas as dimensões a China está melhor do que os países desenvolvidos e em algumas delas também melhor do que o Brasil. Não me parecem infelizes com esse sistema, portanto. Primeiro, porque sabem que precisam estudar assim - a competição é enorme por vagas na universidade, o país tem 1,3 bilhões de habitantes, eles sabem que não tem lugar pra todo mundo.
E, segundo, porque a rede familiar e social é muito forte na China. As famílias são coesas, e a política do filho único significa que esse jovem vai ter toda a atenção de seus pais.


Gustavo Ioschpe: Escrevi sobre isso no artigo "Mas eles são felizes?", que tá disponível em Veja.com

Comentário de Maria Monteiro
O facto de tantos alunos recorrerem a aulas de reforço não será um indicador de falhas no método de ensino chinês?


Gustavo Ioschpe: Maria, não, é um indicador da paixão que eles têm pelo estudo e o fato de que percebem ser necessário esse reforço para ir bem nos exames como jun kao e gao kao. As aulas de reforço são de quatro a oito horas por semana, e os alunos passam umas 35 a 40 horas por semana na escola. O grosso do aprendizado, portanto, vem da escola, e como esse sistema aparece em primeiro lugar no PISA é difícil imaginar que o sistema seja deficiente.

Comentário de Alexandre Cabreira
Você não acha excessivo o número de disciplinas ensinadas no ensino fundamental (básico) em Pindorama? Criança, na minha opinião, deveria aprender (bem) matemática, português e ciências. Trabalho numa Câmara de Vereadores e o que tem de projeto aumentando o número de matérias...


Gustavo Ioschpe: Com certeza, Alexandre. No Brasil a gente ainda não entendeu que precisa fazer escolhas e que não dá pra fazer tudo bem, pra todo mundo, em todas as áreas do saber. Mas isso já começa a mudar. A Claudia Costin me contou que no Rio de Janeiro eles só ensinam Português e Matemática nas três primeiras séries do fundamental. Vamos ver como o Rio se sai no próximo IDEB, mas acho uma política corajosa e correta.


Gustavo Ioschpe: O papo está ótimo, mas infelizmente só tenho tempo pra mais uma pergunta


VEJA: Gustavo, em primeiro lugar, agradecemos, em nome de todos, sua presença e colaboração. A última pergunta...


VEJA: O que você aprendeu com a China?


Gustavo Ioschpe: Pô, essa pergunta é pra ficar aqui duas horas hehe. Muita coisa mesmo, e recomendo aos interessados que leiam a íntegra do texto, que não coube na revista e está disponível em Veja.com.
O mais importante é como um país pobre, em desenvolvimento, conseguiu criar um sistema educacional de altíssima qualidade, e não tem milagre: muito e muito trabalho, coragem pra tomar decisões duras, meritocracia, cuidado constante com professores e alunos e políticas públicas engenhosas para fazer com que o trabalho dos melhores seja compartilhado.
Obrigad a todos pelo interesse e ótimas festas e feliz 2012.


Gustavo Ioschpe: Quem quiser continuar a conversa, prometo tentar responder mais tarde no twitter @gioschpe.


VEJA: Agradecemos a todos pelo interesse e participação.

As perguntas que não puderam ser respondidas serão encaminhadas ao Ioschpe.

Obrigado!






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Comentários

  • 5 Comentários sorted by Votes Date Added
  • NeuromancerNeuromancer Membro
    edited maio 2013 Vote Up0Vote Down
    Kairós disse: Gustavo Ioschpe: Fabiana, acho que há uma série de coisas que podemos tentar copiar, desde as mais simples - como mudarmos o horário das aulas pra que tenhamos 40 minutos de aula e 10 minutos de intervalo, pra que sempre comece no horário, ao invés dos nossos 50 minutos corridos, em que sempre há atrasos - até algumas mais complexas. A mais importante, porém, me parece ser a prática dos grupos de estudo de professores, que compartilha as melhores práticas da rede, acompanha e monitora o trabalho de todos toda a semana, fazendo com que o nível de qualidade suba.

    Interessante. Sempre quando pergunto aos pedagogos o porquê de 50 minutos eles nunca me dão uma resposta satisfatória.
    Notei também que não foi falado nada sobre indisciplina, que é algo que está pegando no Brasil.
    De resto, nada de novo sob o sol.
    Post edited by Neuromancer on
  • NeuromancerNeuromancer Membro
    edited maio 2013 Vote Up0Vote Down
    Kairós disse: Allan, realmente fiquei surpreso com a carga de estudos e como eles abdicam de muitas coisas que pra nós são naturais e indispensáveis, como os namoros, a vida noturna etc. Curiosamente, não notei sinais de tristeza ou desajuste por conta desse sistema.

    Acredito que isso ocorra devido à referência que eles têm. Se os colegas e amigos não namoram e não têm relacionamentos então o sujeito acha normal que ele também não tenha.
    Post edited by Neuromancer on
  • Kairós disse: Gustavo Ioschpe: Allan, realmente fiquei surpreso com a carga de estudos e como eles abdicam de muitas coisas que pra nós são naturais e indispensáveis, como os namoros, a vida noturna etc. Curiosamente, não notei sinais de tristeza ou desajuste por conta desse sistema.
    Sinal de que não são tão naturais e indispensáveis assim.

  • NeuromancerNeuromancer Membro
    edited maio 2013 Vote Up0Vote Down
    Angra_Mayniu disse: Sinal de que não são tão naturais e indispensáveis assim.

    O sujeito acha indispensável quando todo mundo ao redor dele tem e ele não tem.
    Há décadas quando era perfeitamente comum casar-se virgem, ninguém ficava pirado por não ter tido uma noite de sexo aos 20 anos.
    Post edited by Neuromancer on
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