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Nas últimas semanas, muitos só falavam do acidente de avião que o casal de apresentadores de televisão Luciano Huck e Angélica sofreram. No entanto, mais do que gerar preocupação em seus fãs, a fatalidade, que quase levou a dupla de coxinhas globais para o céu das celebridades, gerou muita polêmica.
Segundo a timeline do meu Twitter, Huck e Angélica ficaram em alguns leitos negados para pacientes do Sistema Único de Saúde, o famigerado SUS, que atende a saúde pública. Conforme fiquei sabendo por fontes confiáveis aqui do boteco perto de casa onde tomo café, o casal de malas foi atendido pelo SAMU, que os levou para a Santa Casa. A suspeita dos “parça” lá do botequim é que apesar de não ter infraestrutura para receber as pessoas no cotidiano, o hospital ficou com medo da má reputação que teria ao deixar aqueles famosos esperando atendimento. Afinal, os únicos que podem passar por isso são as pessoas comuns.
Em uma conversa exclusiva com a minha esposa, fiquei sabendo que se esta ala estivesse aberta aos pacientes do SUS, alguns deles teriam maior chance de sobreviver. Há pelo menos um caso de óbito pelo fechamento dessa área da Santa Casa. Fucei no Google e fiquei sabendo que o hospital preferiu fazer boca de siri ao invés de se colocar numa saia justa e ter que se justificar para aquelas pessoas comuns sempre mal atendidas. Nessa hora me lembrei do senhor gritando “quero café”, que é um dos vídeos mais engraçados da internet. Só não é engraçado quando você lembra que aquele senhor estava esperando para fazer um exame em jejum e não podia comer nada até ser atendido. Claro que ia demorar um século pra isso. De foder, né?
Não sei se você já leu um quadrinho (sim, mangás são quadrinhos e vice-versa) chamado Monster, de Naoki Urasawa, e que é lançado pela Panini Comics. A série mostra a história de um talentoso médico japonês chamado Dr. Kenzo Tenma, que estava construindo uma sólida carreira em um importante hospital alemão. Certa vez, ele é colocado em um dilema semelhante ao da Santa Casa: salvar a vida de um artista ou a de uma pessoa comum. Por conta da pressão da diretoria, ele que era o mais humano e talentoso médico, acaba tratando o famoso e deixando a outra pessoa morrer. Detalhe que o quadro do paciente famoso era “menos urgente” do que o do desconhecido que faleceu.
Logo depois desse evento, Tenma jura pra si mesmo que nunca mais aceitaria esse tipo de distinção entre pacientes e sempre tomaria a decisão que valorizasse vidas humanas. Novamente, o destino coloca em seu caminho esse grande dilema, mas agora a dúvida era em salvar a vida de um político importante ou de um garoto que levou um tiro na cabeça. Como um neurologista experiente, o médico japonês vai cuidar do caso do garoto, enquanto o segundo melhor médico do lugar cuidaria do político. Ambos sobrevivem, mas a chefia do hospital o repreende assim mesmo.
A série continua com o garotinho que foi salvo se revelando um genial assassino serial, que seria caçado pela consciência pesada de Tenma por uma cacetada de volumes. Mas isso não vem ao caso. O que queremos pensar é que até mesmo um personagem de história em quadrinhos é capaz de perceber o quanto a decisão é complexa. E ao mesmo tempo ela joga uma luz sobre um dos grandes dilemas do sistema público brasileiro: só é bem servido quem tem poder.
Segundo meu DataChute, todos os dias centenas de brasileiros tem atendimento médico negado por uma série de fatores, como corrupção, má administração e calhordice da mais suja. A responsabilidade não é dos funcionários daquele hospital, mas de toda uma rede de tecnocratas que sugam o sangue da população através de obras superfaturadas, desvios de verba, joguetes políticos e outros estratagemas multipartidários (não existe outro lado pra defender que não o das pessoas comuns).
Precisamos começar a usar a ficção para questionar a realidade, mas também devemos parar de agir como se todos esses atos cruéis de injustiça social fossem de mentirinha. Precisamos de uma reforma urgente na nossa forma de oferecer serviços públicos.
http://contraversao.com/dr-tenma-nao-teria-atendido-luciano-huck-e-angelica/
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