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CLAUDIO - Recordações de um Brasil socialista

Recordações de um Brasil socialista

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Pouca gente sabe, ou se deu conta na época, mas o Brasil já viveu um regime socialista. E foi um sucesso... por pouco tempo.

Em 28 de fevereiro de 1986 o presidente Sarney, acossado pela hiperinflação que grassava no país e tendo a legitimidade de seu mandato questionada, decretou o congelamento geral de preços e salários. Em sessão solene transmitida pela TV, ele declarou guerra à inflação e convocou todo o povo para o bom combate, imputando aos especuladores e empresários gananciosos a carestia que castigava a nação. O presidente obteve aprovação quase unânime da população. Mais de 95% do povo apoiava o Plano Cruzado (essa a nova denominação da moeda nacional) sem reservas.

[A imagem está ruim, mas o vídeo abaixo vale muito a pena para relembrar a época em que a ignorância econômica nacional atingiu seu ápice]



De um dia para o outro, todas as transações privadas caíram sob estrito controle estatal. A propriedade privada e a liberdade econômica foram suprimidas de um só golpe, uma vez que o poder de disposição (vender, alugar etc.), sem o qual o direito de propriedade é privado de sua substância, foi abolido. Somente se podia celebrar contratos bilaterais onerosos pelo preço decretado e controlado pelo estado. Dito de outra forma, o Brasil aboliu a economia de mercado e adotou o socialismo.

A imprensa aderiu imediatamente fomentando um clima de histeria geral. A TV Globo criou uma vinheta sugestiva: "tem que dar certo". Tinha que dar certo à força, é claro.

Logo empresários e gerentes de loja eram presos e humilhados sob a acusação de aumentar preços ilegalmente. Estabelecimentos comerciais foram depredados por turbas enfurecidas. Todos os cidadãos foram informalmente nomeados "fiscais do Sarney" e nenhum comerciante se sentia seguro. Choviam delações anônimas, ao que se seguiam espalhafatosas razzias da SUNAB nas lojas, elevada à condição de KGB nacional.



A adesão da intelectualidade foi, naturalmente, total. Os mesmos que ainda ontem criticavam o uso do decreto-lei (antepassado das medidas provisórias) e as arbitrariedades dos militares agora as aprovavam efusivamente. O ministro da fazenda Dilson Funaro, que secretamente sofria de um câncer quase terminal, fez-se um verdadeiro messias do cruzado. Os economistas que perpetraram o plano, João Sayad, Luiz Gonzaga Belluzo, Persio Arida, Francisco Lopes e outros viraram celebridades instantâneas. A mentora de todos eles, a economista lusa Maria da Conceição Tavares, passou a ser considerada a sumidade suprema da ciência econômica, e a mídia a retratava como a "guerreira do cruzado". Os partidos políticos que recentemente atacavam Sarney aderiram em massa ao presidente. A esquerda, inclusive o nascente PT, perdeu o discurso e ficou na dela. Como pregar o socialismo se o próprio governo o adotara? Sarney e seu bigode eram adorados e adulados pelas massas, tal qual um Stalin tupiniquim.

Poucas vozes ousaram discordar. O sempre corajoso jurista Ives Gandra foi um dos poucos a proclamar para quem quisesse ouvir que o pacote era inconstitucional de cabo a rabo, e olha que a constituição vigente era aquela outorgada pelos militares em seu período mais duro. Mas ninguém queria ouvir, muito menos o Judiciário. A oposição mais cerrada, coerente e de primeira hora veio da revista semanal Visão, onde pontificava o editor Henry Maksoud. Inflação não é aumento geral de preços, escrevia ele. Essa é a consequência. A causa é a expansão desenfreada dos meios de pagamento pelo governo para financiar seus monumentais déficits. O único culpado pela inflação é o governo e só ele pode acabar com ela. Abolir o mecanismo de preços equivale a destruir a economia de mercado.

Controle de preços nunca resolveu o problema, e a sucessão de fracassos nesse campo foi enumerada começando por um famoso e malogrado decreto do imperador romano Diocleciano, em 301 DC, que parecia uma "tabela da Sunab". Não demorou para que o filho de Maksoud fosse preso e ele próprio recebesse ameaçadoras "visitas" da Sunab. Maksoud foi "banido" dos programas de TV que discutiam o plano. Jornais recusavam-se a reproduzir seus artigos. A revista Visão recebia uma enxurrada de cartas de leitores furiosos, contendo os piores insultos. Maksoud as publicava e replicava pacientemente. O governo garantia que o déficit e a emissão de moeda estavam "sob controle total". Como?, retrucava a Visão, se nenhum funcionário público foi demitido (ao contrário, a época era de contratações e "trens da alegria" a rodo), nenhuma estatal foi privatizada, nenhum gasto foi suprimido, os vastos subsídios não foram cortados e a carga tributária não foi aumentada? Os números das contas públicas sumiram, deixaram de ser publicados, coisa que nem os militares fizeram.

Aos poucos, contudo, a euforia foi passando e os efeitos previstos por Maksoud começaram a se fazer sentir. As mercadorias principiaram a escassear e a sumir. Mercados paralelos floresceram e só pagando "ágio" era possível comprar as coisas. O Brasil foi tomando a feição bem conhecida nos países comunistas. Filas nas lojas e nada para comprar, salvo no mercado negro. O ministro Funaro expôs-se ao ridículo de mandar a Polícia Federal caçar bois nos pastos, já que a carne desaparecera do mercado.

Ficou evidente que o déficit público e a expansão monetária não haviam sido controlados coisa nenhuma. Nada mudara. A economia entrou em colapso, mas o "plano" foi mantido até as eleições, por exigência do PMDB, o "partido do cruzado". Logo depois das eleições, que resultou em esmagadora vitória do PMDB, o governo traiu os que tolamente acreditaram que o cruzado era sério. Os preços foram descongelados e a inflação reprimida os chutou para o alto. Haveria novos "planos" e novos congelamentos, inclusive o mais violento dos "choques heterodoxos" que foi o Plano Collor I. Mas o encanto se esgotara. Ninguém mais levava a sério o socialismo.

É claro que Sarney, o clássico "coroné" patrimonialista nordestino, não era um socialista marxista. Ele apenas utilizou o truque do congelamento para se tornar popular e se manter no "pudê". Quando o "plano" fracassou, Sarney não deu o passo seguinte na direção do socialismo totalitário, que teria sido a estatização de todos os meios de produção (inclusive a força de trabalho de cada um). Voltamos, pois, à velha e péssima "economia mista" de praxe. Um governo Lula ou assemelhado, porém, teria seguido adiante, e pior, contaria com amplo e majoritário apoio popular!

É uma pena que o povo brasileiro não tenha consciência de que aquilo é o verdadeiro socialismo, daí para pior. Logro, arbítrio, violência, escassez, caos, manipulação. Pois ao que parece a história vai se repetir, pois os "economistas" do PT são os mesmos do cruzado. Como é que pode esses caras ainda terem influência no país? Por muito, muito, menos médicos e engenheiros perdem a licença profissional. Mas essas figuras macabras continuam dando as cartas nos meios acadêmicos e políticos. É nisso que dá deixar a ciência econômica aos cuidados dos seguidores de Marx e Keynes. Toda a sociedade paga a conta.
O ENCOSTO
Onde houver fé, levarei a dúvida!

Comentários

  • 16 Comentários sorted by Votes Date Added
  • Quando eu tinha uns 9 anos, lembro que uma vez por mes chegava no meu bairro um caminhão baú da CONAB, com produtos mais baratos (papel higienico) e que eram vendidos de maneira controlada.

    Uma fila enorme era formada 2 ou 3 horas antes da chegada dele.



    O ENCOSTO
    Onde houver fé, levarei a dúvida!
  • O preço do leite foi tabelado. Com isso, o produto sumiu. Cada 1 poderia comprar 2 litros apenas, quando o encontrava em algum mercadinho.
    O ENCOSTO
    Onde houver fé, levarei a dúvida!
  • ClaudioClaudio Administrador, Moderador

    Encosto,

    O que é que as burradas do governo Sarney tem a ver com socialismo?

    Sarney é um coronel do antigo PFL (Partido da Frente Liberal) que sucedeu a antiga ARENA, partido da ditadura militar brasileira.

    Na época, havia uma inflação gigantesca no Brasil. Sarney quis atacar este problema, de qualquer jeito, e ao mesmo tempo se tornar um presidente popular. Pois lembrando, houve uma aliança entre o PMDB e o PFL, onde o último indicou o vice. Com a morte de Tancredo, assumiu um vice-presidente nada popular. Sarney quis, acima de tudo, aumentar sua popularidade.
  • Fernando_SilvaFernando_Silva Administrador, Moderador
    edited agosto 2015 Vote Up0Vote Down
    Em 28 de fevereiro de 1986 o presidente Sarney, acossado pela hiperinflação que grassava no país e tendo a legitimidade de seu mandato questionada, decretou o congelamento geral de preços e salários. Em sessão solene transmitida pela TV, ele declarou guerra à inflação e convocou todo o povo para o bom combate, imputando aos especuladores e empresários gananciosos a carestia que castigava a nação.
    O congelamento de preços foi uma idiotice demagógica que fracassou aqui, na Argentina e agora na Venezuela.
    Equivale a anestesiar o paciente, mas não operar o tumor, que continua crescendo.
    Post edited by Fernando_Silva on
  • ClaudioClaudio Administrador, Moderador
    Simplesmente este é mais um destes textos malucos onde procura-se misturar um monte de fatos desconexos para atacar o socialismo e enaltecer o neoliberalismo. Socialismo nada mais é do que um governo voltado para atender demandas sociais. Tais como educação, saúde, segurança etc. O capitalismo não sobrevive sem o atendimento a estas demandas. Por mais que o Estado seja ineficiente, ele pode executar ações sem o objetivo do lucro, que é o objetivo das empresas privadas. Empresas privadas não podem executar estas ações se o destinatário delas não possuir dinheiro suficiente.

    Então alguns neoliberais fazem ligações loucas para justificar um capitalismo sem freios. São teorias da conspiração que só servem para disseminar o ódio e o medo entre as pessoas.
  • Claudio disse: Encosto,

    O que é que as burradas do governo Sarney tem a ver com socialismo?

    Sarney é um coronel do antigo PFL (Partido da Frente Liberal) que sucedeu a antiga ARENA, partido da ditadura militar brasileira.

    Na época, havia uma inflação gigantesca no Brasil. Sarney quis atacar este problema, de qualquer jeito, e ao mesmo tempo se tornar um presidente popular. Pois lembrando, houve uma aliança entre o PMDB e o PFL, onde o último indicou o vice. Com a morte de Tancredo, assumiu um vice-presidente nada popular. Sarney quis, acima de tudo, aumentar sua popularidade.

    Você defende um "socialismo de livre mercado"?
    O ENCOSTO
    Onde houver fé, levarei a dúvida!
  • ClaudioClaudio Administrador, Moderador
    edited agosto 2015 Vote Up0Vote Down
    ENCOSTO disse: Você defende um "socialismo de livre mercado"?

    Não. Não defendo o socialismo de livre mercado. O que eu defendo é o comunismo. Entretanto, se dentro do capitalismo, medidas sociais puderem ser adotadas, eu acho bom. Entre um capitalismo neoliberal e um capitalismo Keynesiano, eu prefiro o keynesianismo. Entretanto, um socialismo de livre mercado estará sujeito a diversos males, tais como a corrupção, a politicagem e a burocracia.


    Post edited by Claudio on
  • Claudio disse: Entre um capitalismo neoliberal e um capitalismo Keynesiano, eu prefiro o keynesianismo. Entretanto, um socialismo de livre mercado estará sujeito a diversos males, tais como a corrupção, a politicagem e a burocracia.

    Não está trocando as bolas? Chegou a ver as ultimas noticias sobre a PTbras????? Ela é controlada pelo Estado.
    O ENCOSTO
    Onde houver fé, levarei a dúvida!
  • O ministro Funaro expôs-se ao ridículo de mandar a Polícia Federal caçar bois nos pastos, já que a carne desaparecera do mercado.

    Eu lembro, quando era criança, que a falta de carne era tão grande na minha cidade, que é uma cidade grande, que vários açougues fecharam, não tinha nem racionamento.
  • Claudio disse: Entre um capitalismo neoliberal e um capitalismo Keynesiano, eu prefiro o keynesianismo

    Em debates é o que muitos socialistas estão fazendo só não sabem e chamam de socialismo .

    A nossa realidade é moldada pelo que acreditamos ou preferimos não acreditar.
    Eu quero a Verdade .
    A realidade é um conjunto de possibilidades que se concretizou dentro de um universo infinito de possibilidades.
    Pqp ! Eu já fui de esquerda !
    Click aqui :
    http://31.media.tumblr.com/tumblr_m4pmpbh3H11qlvp0oo1_250.gif
  • CameronCameron Membro
    edited agosto 2015 Vote Up0Vote Down
    Claudio disse: Entretanto, um socialismo de livre mercado estará sujeito a diversos males, tais como a corrupção, a politicagem e a burocracia.
    Você fala como se no socialismo centralizado e com a intervenção máxima do estado isso não ocorresse.

    O socialismo serve apenas para maximizar os efeitos e os danos do que você acabou de listar somado com a completa degeneração moral e econômica.

    Post edited by Cameron on
    Come with me if you wanna live.
  • ClaudioClaudio Administrador, Moderador
    ENCOSTO disse: Não está trocando as bolas? Chegou a ver as ultimas noticias sobre a PTbras????? Ela é controlada pelo Estado.
    Sim. Ví. É assim que funciona: onde há dinheiro, há corrupção. Seja no setor público ou no privado.

  • ENCOSTOENCOSTO Membro
    edited agosto 2015 Vote Up0Vote Down
    Onde há corrupção no setor publico, toda sociedade paga a roubalheira com o dinheiro dos impostos. Onde há corrupção em empresa privada, a empresa e seus acionistas se ferram e só.
    Post edited by ENCOSTO on
    O ENCOSTO
    Onde houver fé, levarei a dúvida!
  • ClaudioClaudio Administrador, Moderador
    edited agosto 2015 Vote Up0Vote Down
    ENCOSTO disse: Onde há corrupção no setor publico, toda sociedade paga a roubalheira com o dinheiro dos impostos. Onde há corrupção em empresa privada, a empresa e seus acionistas se ferram e só.
    Para diminuir a corrupção no setor público é necessário transparência total exigida em lei. Com os recursos tecnológico, isto é possível.

    Muitas vezes é necessário que o Estado execute funções da iniciativa privada. Isto acontece, por exemplo, quando um país precisa desenvolver tecnologia própria e explorar seus próprios recursos. Uma economia feita localmente é mais eficiente do que uma que precisa de longos deslocamentos. Dai a necessidade do domínio tecnológico local. Enquanto menos concentração econômica houver num só centro, melhor.


    Post edited by Claudio on
  • ClaudioClaudio Administrador, Moderador
    edited agosto 2015 Vote Up0Vote Down
    Cameron disse: O socialismo serve apenas para maximizar os efeitos e os danos do que você acabou de listar somado com a completa degeneração moral e econômica.
    Esta moral que você atribui ao capitalismo já não existe mais. Ela foi sustentada pela reforma protestante conforme explicado no livro “A ética protestante e o espírito do capitalismo ” de Max Weber. Durou enquanto duraram as igrejas protestantes tradicionais. Só que o protestantismo tradicional que pregava a abnegação está acabando. Muitos não tem religião e os que tem seguem seitas que não passam nenhum valor moral aos fieis. Tais como as seitas pentecostais e neopentecostais. Hoje, raríssimas pessoas seguem o protestantismo. Tanto aqui no Brasil como na Europa e EUA.

    O capitalismo não possui mais um suporte moral para o sustentar. A moral é essencial para o sustento de qualquer modo de produção. Só que ela já não existe mais neste sistema. Vale tudo para obter lucro. Vale dedo no olho, puxar o cabelo, xingar a mãe etc. Como o ser humano é um ser moral, ele irá buscar alternativas que garantam a ética. Pois sem ela, a vida não vale a pena ser vivida.

    Então, um novo modo de produção é necessário para substituir o atual que já não garante mais a coesão social, obtida através de práticas morais. Existe uma moral do nosso tempo, o problema é que ela já não é mais compatível com o capitalismo. Por isto, novas práticas econômicas tem surgido como alternativas para uma vida mais ética para cada indivíduo.

    Post edited by Claudio on
  • Claudio disse: Para diminuir a corrupção no setor público é necessário transparência total exigida em lei. Com os recursos tecnológico, isto é possível.

    E isso não existe nem nos países mais sérios. Logo, é melhor acabar com o máximo possível da participação do estado.
    Muitas vezes é necessário que o Estado execute funções da iniciativa privada. Isto acontece, por exemplo, quando um país precisa desenvolver tecnologia própria e explorar seus próprios recursos. Uma economia feita localmente é mais eficiente do que uma que precisa de longos deslocamentos. Dai a necessidade do domínio tecnológico local. Enquanto menos concentração econômica houver num só centro, melhor.

    Não existe tal necessidade.
    O ENCOSTO
    Onde houver fé, levarei a dúvida!
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