Resposta a Olavo de Carvalho – É preciso aprender a ser mestre
Olavo de Carvalho enviou o seguinte comentário:
Dividir a direita em “democratas” e “golpistas” é um simplismo indigno da sua inteligência, caro Reinaldo. Ademais, é um princípio elementar de ciência política não julgar movimentos políticos somente pelos “valores” que eles dizem representar, – isto é, pela imagem que buscam ostentar –, mas pela substância das suas ações e pela qualidade da sua estratégia. Escreverei algo mais detalhado sobre isso, e espero que possamos trocar umas ideias a respeito.
Comento
A área de busca do meu blog é bastante eficiente. Coloquem lá o nome “Olavo de Carvalho”, sem aspas, e vocês verão o que vem. Mesmo divergindo, sempre expressei meu reconhecimento a seus dotes intelectuais. E o defendi, sim, de ataques que considerei injustos. Olavo pode passar a dizer o que quiser a meu respeito. Mas nunca terá uma vírgula a opor à minha fraterna lealdade. Nem ele nem ninguém. Nem os que me amam nem os que me odeiam, ainda que por pragmatismo. Que empreste agora o peso do seu nome para correntes que buscam me desqualificar dá testemunho do que ele decidiu fazer dessa lealdade. Isso é com ele. Constato um fato.
Mas não se espere uma guerra. Não vou cair nessa. Tenho mais o que fazer. E Olavo também. Seus ataques a lideranças de grupos pró-impeachment já haviam chegado a mim. Ignorei o assunto porque as pessoas a que ele se refere dispõem dos próprios meios e de competência para responder — se julgassem conveniente. Rompi o silêncio quando vi meu nome tragado pela baixaria dos acólitos.
Escreve Olavo: “É um princípio elementar da ciência política…”. Bem, Olavo, tal assertiva não é igualmente digna da sua inteligência. É uma tática elementar da tentativa de desqualificação do outro transformar uma opinião ou uma platitude num “princípio elementar”, como se o oponente já estivesse vencido no debate antes mesmo de começar. Afinal, se o sujeito ignora que dois mais dois são quatro, as suas considerações sobre aritmética já estão prejudicadas. Sugiro que você releia “Como Vencer um Debate Sem Ter Razão”, de Schopenhauer. Há uma edição excelente, com comentários muito lúcidos de um certo… Olavo de Carvalho.
Olavo sabe muito bem que isso não é “princípio elementar” de coisa nenhuma. Ele apenas procurou me atribuir o que não escrevi. Não julguei nem julgo o MBL e o Vem Pra Rua apenas a partir do juízo que fazem de si mesmos. Ao contrário: já demonstrei apreço pela substância, sim, de suas ações. E por sua estratégia. E, nesse particular, eu e Olavo divergimos radicalmente.
Mas não é só divergência. Lamento profundamente os termos a que ele tem apelado para se referir aos rapazes e moças do movimento. Seus livros evidenciam que ele é capaz de muito mais. Não serei eu a propor a Olavo, aos 68 anos, que cuide da sua “De Senectude”, como, aos 54, já cuido da minha. Ah, Olavo! Você se fez professor de filosofia. Chegou a hora de aprender a ser mestre. E o bom mestre não é feito pelos discípulos. Os bons discípulos é que são feitos pelos mestres. Eu poderia chamar isso de um “princípio elementar da convivência civilizada”. Mas é só uma opinião.
Há modos de discordar das pessoas. Pode-se ser muito duro qualificando o debate e o interlocutor. Mas, para tanto, é preciso que a nossa atenção esteja voltada para o objeto em análise e, no caso de um mestre, para os que podem aprender com a experiência. Desde quando, Olavo, a vaidade do pregador conduziu a um bom lugar? Eu poderia classificar essa pergunta de um “princípio elementar das ideias bem-sucedidas”. Mas, de novo, é só uma opinião.
Sempre preferi que Olavo estivesse participando do debate público, não o contrário. Na medida das minhas possibilidades, sempre procurei dar visibilidade às vezes em que contribuiu para elucidar conceitos, posições, contraposições. Mas, a partir de certo ponto, ele perdeu a mão. E resolveu emprestar seu nome a depredadores do debate civilizado.
Pretendo esgotar aqui essa questão. Olavo não é notícia. Eu não sou notícia. O MBL, o Vem Pra Rua e outros movimentos é que estão por aí, afrontando as dificuldades para fazer valer alguns princípios civilizatórios. Já concordei com eles. Já discordei deles. Mas faço uma coisa e outra qualificando-os como interlocutores, não o contrário. E os defendi, sim, da baixaria, como já fiz antes quando o próprio Olavo de Carvalho era o alvo. Ou não fiz, Olavo?
E, por óbvio, Olavo não me deve nada por isso. A não ser o respeito devido a pessoas das quais discordamos, quando reconhecemos que estão na luta das ideias de boa-fé.
Eu não perdi a esperança, Olavo, de aprender um pouco mais. Faça o mesmo. É uma sugestão sincera. E não escrevo isso porque quero parecer bonzinho. Eu também sei ser mauzinho. Mas já estou naquela altura da vida em que acho o exemplo tão importante quanto as palavras.
É um princípio elementar da sabedoria.
Olhe pela janela, Olavo… Os adversários reais ainda estão entre os girassóis. Depois se volte para os lírios, que não fiam nem tecem. São citações, como você sabe. Não servem para excitar a fúria circense dos Bolsonaros da vida.
Você pode muito mais.
http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/reposta-a-olavo-de-carvalho-e-preciso-aprender-a-ser-mestre/
Comentários
Olavo de Carvalho e o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) enviaram comentários ao texto que publiquei sobre a patrulha que o Movimento Brasil Livre e o Vem Pra Rua estão sofrendo. A cada um deles darei uma resposta segundo a capacidade que cada um deles tem de entender o que escrevo: a de Olavo é plena; a de Bolsonaro, idiopática. Não os puliquei na área destinada a tal fim justamente porque os queria aqui, com mais visibilidade.
Quem está esperando uma série ou algo assim, bem…, pode tirar o cavalo da chuva. Não vai ter. E espero que os motivos se esclareçam. Começo por Bolsonaro. Ele reclama do fato de eu ainda não ter publicado o comentário de Olavo nestes termos:
“Procurei o comentário de Olavo de Carvalho e não encontrei. Fiquei sabendo que princípios elementares de Ciência Política foram ignorados nestes posts, muito bom conversar com o mestre. Olavo tem razão.”
Comento
Quem se atém apenas à retórica e ao desempenho circenses do deputado Bolsonaro fica com a falsa impressão de que ele participou de alguma guerra — ou mesmo que combateu o terrorismo de esquerda. Não! Ele nunca deve ter matado uma galinha. Ou venceu, no máximo, uma galinha.
Em matéria de combate à ação revolucionária, não caçou nem frango. Lançou-se na vida pública com uma retórica meramente sindicaleira e foi descobrindo depois o nicho da suposta “direita”.
A cada eleição, foi extremando sua retórica brucutu e obscurantista, transformando o conservadorismo numa caricatura. Outro dia alguém me perguntou se ele poderia ser o nosso Donald Trump. Bem, eu diria que nem na capacidade de produzir asneiras… Em certo sentido, no entanto, talvez o despropósito da comparação adquira alguma verossimilhança: assim como o bilionário ridículo pode ajudar a eleger Hillary Clinton, Bolsonaro é um dos cabos eleitorais que a esquerda tem no Brasil. Adiante.
Noto, e não é sem certa melancolia que o faço, que Bolsonaro e Olavo andaram conversando a respeito. Acho que o segundo se interessa pelo primeiro porque entende o alcance de suas postulações; acho que o primeiro se interessa pelo segundo porque não entende. Mas eu não patrulho relações alheias. As pessoas escolhem seu caminho.
Nunca achei graça nos dotes histriônicos de Bolsonaro. A quantidade de asneiras que diz é tal que meu humor não alcança. Mas, desta feita, ri um pouco. Este senhor já andou defendendo a tortura e torturadores aqui e ali — nota à margem: eu fui contra a revisão da Lei da Anistia, o que é coisa muito distinta.
Numa luta suja, como a gente vê, Bolsonaro nem precisaria ser torturado. Ele sai entregando os seus interlocutores. O que a dor revelava, no caso dos seviciados, Bolsonaro entrega por burrice.
Dizem que as hostes esquerdistas estão em festa. Elas são craques em gozar com os instrumentos alheios. Não é de hoje! “Ah, olhem a direita se dividindo…”
Em primeiro lugar, não reconheço a Bolsonaro o estatuto de “direitista”. Mas isso é lá com ele e com os que o seguem. Em segundo lugar, não pode se dividir o que junto nunca esteve. O arquivo do meu blog está aí e diz há muito tempo o que penso sobre este senhor — já defendi, inclusive, o direito que ele tem de dizer besteiras. E ele o exerce com uma dedicação encantadora.
Finalmente, observo: os fanáticos do bolsonarismo estão prometendo nunca mais visitar o meu blog. Ah, espero que o façam!!! É um favor! Se houvesse um jeito de instalar um mata-burro tão logo a minha página fosse acessada, eu o faria. Infelizmente, não há.
A Internet é ampla. Que o bolsonarismo procure os blogs que atendam às suas expectativas e continuem na sua luta meritória para fazer de Jean Wyllys um intelectual de esquerda… Eles todos se merecem.
Santo Deus!
http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/resposta-a-bolsonaro-deputado-nem-precisa-ser-torturado-para-contar-tudo/
Onde houver fé, levarei a dúvida!
Onde houver fé, levarei a dúvida!