A Consciência humana perante o infinito é uma questão metafísica básica porque a consciência percebe que está contida na realidade tanto quanto percebe que a realidade está contida nela.
Toda percepção humana da realidade existe na consciência individual e apenas nela.
Assim, a consciência individual ou autoconsciência pode conhecer apenas a si própria como existência objetiva, como ser. Todos os demais seres são reconhecidos como tais pela consciência individual como extensão do conhecimento que a consciência tem de si própria.
Em outras palavras, a consciência individual admite que os demais seres existam de modo idêntico à existência que reconhece em si própria.
A alternativa a esta admissão é o Solipsismo, a tese de que em última instância a consciência individual é o único ser real, dado ser impossível ter certeza de que todos os demais seres não são produto da imaginação desta consciência.
Como a consciência individual só conhece objetivamente a própria existência, a hipótese Solipsista não pode ser provada falsa, mas a probabilidade de que seja verdadeira pode ser reduzida na proporção em que os estímulos externos que percebemos são significativos per si. Quando tropeçamos em uma pedra, constatamos que a realidade da dor dá testemunho de que a pedra é real ou consideramos que a dor e a pedra são criações da consciência, que se torna coadjuvante impotente em sua própria criação.
Se verdadeira a hipótese Solipsista, cada um pode se imaginar como o único ser real, um Deus esquizofrênico que é prisioneiro no mundo que criou.
Admitido que a consciência individual seja parte da realidade e não o todo, restam as hipóteses de o conjunto da realidade ser finito ou infinito.
Se finito, em tese existe a possibilidade de que o conjunto da realidade possa ser conhecido pela experiência acumulada e transmitida pelas gerações humanas, caso nossa determinação, tempo, recursos e métodos dedicados ao objetivo forem suficientes. Uma realidade finita é explicável pela Ciência.
Se o conjunto da realidade é infinito, pode existir ou não um nexo que permita identificar na fração finita propriedades que se mantém infinitamente, como nas abstrações matemáticas da geometria e dos conjuntos numéricos. Uma realidade infinita com tal nexo é objeto de estudo da Metafísica.
Se o conjunto da realidade é infinito e desconexo, então não é compreensível pela consciência individual. As interações com a realidade se restringiriam a uma fração insignificante do todo e as conclusões tiradas pela experiência teriam significado apenas utilitário. Nesta realidade não existiriam referenciais absolutos. Os únicos referenciais seriam aqueles escolhidos arbitrariamente. Este é o mundo do relativismo filosófico.
Metafisica enlouquece-me. Nela existe a apresentação de que a parte contém o Todo, nisto, tem quem procure experimentar a interligação das partes, estabelecidas pelo nosso intelecto e que nos impede de contemplar o Todo. Todavia, não faço ideia do que consista tal experiência pratica.
Tentarei reler o texto e, reler de novo, quem sabe se faça alguma luz.
Acauan disse: Se verdadeira a hipótese Solipsista, cada um pode se imaginar como o único ser real, um Deus esquizofrênico que é prisioneiro no mundo que criou.
Concordo com você razão pela qual nunca levei solipsismo a sério, mas não entendi a razão pela qual você considera o niilismo uma linha de pensamento que estaria no mesmo patamar, naquela oportunidade não quis estender o assunto para não fugir demais do tema do tópico, então pergunto agora, por quais razões você considera niilismo e solipsismo equivalentes?
Extremos - Numa direcção ou noutra - posições extremas, é isto.
Ambos se vêem como separados do mundo do qual são "extensão"
Cameron disse: por quais razões você considera niilismo e solipsismo equivalentes?
Tudo e o nada são uma e a mesma coisa.
O meio termo entre o solipsismo e o niihilismo é o intermédio que referi anteriormente - Ver a interligação entre todas as coisas (numa visão clara, inclusive, a continuidade ou eternidade).
Acauan disse: Todos os demais seres são reconhecidos como tais pela consciência individual como extensão do conhecimento que a consciência tem de si própria.
Assumimos, sem poder provar, que os outros indivíduos são tão conscientes quanto nós. Para inteligências artificiais, usa-se o Teste de Turing.
Acauan disse: Se o conjunto da realidade é infinito e desconexo, então não é compreensível pela consciência individual. As interações com a realidade se restringiriam a uma fração insignificante do todo e as conclusões tiradas pela experiência teriam significado apenas utilitário.
Cameron disse: Concordo com você razão pela qual nunca levei solipsismo a sério, mas não entendi a razão pela qual você considera o niilismo uma linha de pensamento que estaria no mesmo patamar, naquela oportunidade não quis estender o assunto para não fugir demais do tema do tópico, então pergunto agora, por quais razões você considera niilismo e solipsismo equivalentes?
Cameron,
Pelo que entendi, você é favorável a um nível de niilismo que se define por promover uma postura crítica, contestatória ou cética com relação aos valores estabelecidos e aceitos sem questionamento.
Até aí nada contra, mesmo porque se bem conduzido este processo pode levar ao entendimento dos mecanismos pelos quais estes valores são estabelecidos e realimentar a crítica em um nível mais aprofundado da questão.
O problema com o niilismo puro é que em última instância leva ao que o próprio nome traduz, a redução ao nada.
A filosofia de Nietzsche flerta com esta fonte, mas nem ele se arriscou a ultrapassar certos limites. Note que sua proposta no Zaratustra é a transmutação de TODOS os valores, mas não o abandono ou negação de todos os valores. No fim o próprio Nietzsche entende as armadilhas da negação e cria seu próprio modelo metafísico do Eterno Retorno, uma tentativa um tanto errática de metafísica niilista.
O ponto é que se tiramos da filosofia de Nietzsche suas últimas amarras metafísicas o que sobra é a ideologia da Vontade de Potência, cujo exemplo mais puro e efetivo é o Nazismo.
Qualquer conhecedor da biografia e obra de Nietzsche sabe que é um erro básico associar suas idéias ao nazismo. Mas o nazismo nada mais é que niilismo Nietzscheniano em estado puro.
O comunismo revolucionário bolchevique também bebe nesta fonte, embora faça disfarçadamente o que o nacional socialismo revolucionário fazia declaradamente.
Ou seja, o problema não é o niilismo em si. Mesmo o solipsismo pode levar a exercícios de pensamento interessantes, desde que o pensador cuide para manter uma âncora na realidade antes de se lançar no mar revolto que estes estados filosóficos podem produzir.
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Acauan dos Tupis
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Acauan, vou descrever como vejo essas linhas de pensamento.
Solipsismo é o conceito filosófico que defende o relativismo absoluto, não existe nada, nenhum dado ou evento objetivo, tudo é relativo e dependente de uma determinada perspectiva, você o descreveu bem, fosse verdade todos seríamos deuses esquisofrênicos presos dentro da ilusão por nós mesmos criada.
Niilismo seria a antítese e única opção racional ao antropocentrismo, como o Cabeção disse em outro tópico, diante de duas possibilidades, ou o ser humano e suas abstrações são relevantes para a realidade ou não, ou estamos em uma realidade antropocêntrica (os valores humanos são objetivos) ou niilista (os valores humanos são subjetivos).
Acho que a confusão deve ser em relação a ausência de valores niilista comparada com a afirmação de que tudo é ilusório por parte do solipsismo, o niilismo não nega a existência de dados objetivos e sim que abstrações humanas como ideais de moral e justiça fariam parte dessa categoria.
Por exemplo, na sua analogia com a pedra, o niilismo não nega que a dor seja um mecanismo objetivo dentro de nossa estrutura biológica mas nega a objetividade de quem afirma que a dor seja um caminho para a purificação espiritual ou abstrações dessa natureza.
O ponto é que a realidade, ao menos como eu a vejo, não tem nada de antropocêntrica, não parece que, ao contrário do que muitos gostariam de acreditar, sejamos a cereja do bolo, o supra-sumo da criação ou o ápice da existência, tudo indica que somos apenas mais uma dentre bilhões de espécies que habitaram esse planeta fadados ao mesmo destino, a realidade parece negar todas as nossas abstrações e ilusões acerca de nós mesmos, nesse ponto, niilismo se assemelha muito com a descrença em vida após a morte, muitas pessoas não conseguem suportar a ideia de sua própria mortalidade e tentam acreditar por mais carente de qualquer objetividade que esteja que exista um algo a mais, um propósito maior que no entanto todas as evidências apontam em direção contrária, de forma similar, as pessoas não conseguem aceitar que os elementos que mais valorizam sejam apenas arbitrariedades do ser humano em sua vã tentativa de moldar a realidade aos caprichos de seus egos.
Dito isso, talvez alguém ache que sou imoral, que na ausência de valores objetivos de moral e justiça nada impede que uma pessoa se torne uma psicopata, ledo engano, basta apenas não confundir subjetivo com inútil, talvez conceitos como moral e justiça não sejam objetivos, talvez não passem de mera arbitrariedade e teimosia de nossa parte mas nem por isso deixam de ser os responsáveis pelos maiores feitos da sociedade humana, sem nossas abstrações, sem nossas subjetividades ainda estaríamos no meio da selva disputando comida a dentadas.
Isso para mim é motivo mais do que suficiente para defender esses valores com unhas e dentes, não existe a menor necessidade de endossarmos ilusões de grandeza e megalomanias antropocêntricas para tal, são grandiosos como são, do mesmo modo como a vida não precisa ser eterna para que seja preciosa.
Cameron disse: o niilismo não nega a existência de dados objetivos e sim que abstrações humanas como ideais de moral e justiça fariam parte dessa categoria.
A metafísica ocidental na sua encarnação contemporânea também faz essa asserção:
"Dados um mundo real, uma linguagem pública para falar acerca dele e as concepções de verdade, conhecimento, racionalidade etc. implícitas na metafísica ocidental, haverá um conjunto complexo, mas não arbitrário, de critérios para ajuizar os méritos relativos de afirmações, teorias, explicações, interpretações e outros tipos de considerações. Alguns destes critérios são 'objetivos' no sentido em que são independentes das sensibilidades das pessoas que aplicam os critérios; outros são 'intersubjetivos' no sentido em que apelam a características amplamente partilhadas da sensibilidade humana. Um exemplo de objetividade neste sentido são os critérios para avaliar a validade no cálculo proposicional; um exemplo de intersubjetividade são os tipos de critérios a que se apela ao discutir interpretações históricas rivais da guerra civil americana. Não há uma linha divisória precisa entre as duas; e nas disciplinas em que a interpretação é crucial, como a história ou a crítica literária, a intersubjetividade é, de harmonia com isso, central à atividade intelectual."
Racionalidade e realismo: o que está em jogo? de John R. Searle
Acauan disse: Se finito, em tese existe a possibilidade de que o conjunto da realidade possa ser conhecido pela experiência acumulada e transmitida pelas gerações humanas, caso nossa determinação, tempo, recursos e métodos dedicados ao objetivo forem suficientes. Uma realidade finita é explicável pela Ciência.
Um gráfico interessante sobre a questão:
Se o conjunto da realidade é infinito, pode existir ou não um nexo que permita identificar na fração finita propriedades que se mantém infinitamente, como nas abstrações matemáticas da geometria e dos conjuntos numéricos. Uma realidade infinita com tal nexo é objeto de estudo da Metafísica.
Esse é um dos problemas que eu tenho com a metafísica em relação ao estudo feito dentro da física, como estudar algo que não está acessível? O primeiro passo para uma base sólida de conhecimento é ter um objeto de estudo claro, quando se torna divagações a partir de divagações a partir de divagações a linha que separa o real do imaginário se apaga.
Cameron disse: Esse é um dos problemas que eu tenho com a metafísica em relação ao estudo feito dentro da física, como estudar algo que não está acessível?
Não se estuda, especula-se apenas, por gosto, curiosidade ou diversão. Havendo, é claro, a possibilidade de que tais especulações um dia levem a algo ou sejam confirmadas.
Cameron disse: Dito isso, talvez alguém ache que sou imoral, que na ausência de valores objetivos de moral e justiça nada impede que uma pessoa se torne uma psicopata, ledo engano, basta apenas não confundir subjetivo com inútil, talvez conceitos como moral e justiça não sejam objetivos, talvez não passem de mera arbitrariedade e teimosia de nossa parte mas nem por isso deixam de ser os responsáveis pelos maiores feitos da sociedade humana, sem nossas abstrações, sem nossas subjetividades ainda estaríamos no meio da selva disputando comida a dentadas.
Voltamos ao ponto de que a única objetividade autoevidente é a autoconsciência. Tudo mais é potencialmente subjetivo e todas as outras objetividades são atribuídas, conforme algum critério.
A Metafísica não é um dogmatismo, logo a subjetividade dos valores é uma tese a priori tão válida quanto qualquer outra. Já o Nihilismo é uma cosmovisão na qual a negação dos absolutos é um axioma e é aí onde mora o perigo.
Acauan dos Tupis
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Cameron: Cameron disse: Esse é um dos problemas que eu tenho com a metafísica em relação ao estudo feito dentro da física, como estudar algo que não está acessível?
Não se estuda, especula-se apenas, por gosto, curiosidade ou diversão. Havendo, é claro, a possibilidade de que tais especulações um dia levem a algo ou sejam confirmadas.
Se há possibilidade que levem a algo ou sejam confirmadas, então são mais que gosto, curiosidade e diversão, mesmo porque Ciência experimental também formula teses que não pode confirmar, apenas estabelece o grau de correspondência entre experimento e teoria, cujas conclusões se alteram conforme um e outro progridem.
Acauan dos Tupis
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Cameron: Esse é um dos problemas que eu tenho com a metafísica em relação ao estudo feito dentro da física, como estudar algo que não está acessível? O primeiro passo para uma base sólida de conhecimento é ter um objeto de estudo claro, quando se torna divagações a partir de divagações a partir de divagações a linha que separa o real do imaginário se apaga.
Correto. Em última instância a Metafísica é um exercício de imaginação, mas todo processo criativo também o é, incluída toda teorização científica.
Se as críticas à falta de sustentação empírica da Metafísica são corretas no que se refere às especulações além da experimentação, cabe lembrar que é incorreta a idéia de que tais especulações sejam o único objeto de estudo da Metafísica.
A Metafísica não se ocupa do que está além do conhecimento empírico, mas parte deste conhecimento para projetar o que possivelmente está além. Ou seja, a Física está contida na Metafísica e uma não concorre com a outra.
A base de sustentação empírica da Metafísica é que a observação evidencia que existem Leis Naturais, que se mostram válidas para todos os fenômenos que observamos e continuam válidas conforme aumentamos a abrangência e profundidade das observações pelo conhecimento acumulado e desenvolvimento da técnica.
As Ciências Naturais experimentais operam dentro do axioma da validade universal das leis naturais - o que é tão incerto quanto qualquer pressuposição Metafísica.
Mas mesmo que considerada verdadeira a validade universal das Leis Naturais, a Ciência Natural estuda como estas Leis se manifestam. mas não podem explicar porque estas leis existem.
As Leis Naturais são parte integrante do conjunto da Realidade, mas não seu todo, não podem explicar a si próprias, o que leva os pensadores do tema a buscar um modelo que inclua e explique as Leis Naturais e além disto seja autoexplicativo.
Este modelo é necessariamente Metafísico e suas especulações se baseiam na hipótese de que existam Leis da Realidade, mais abrangentes que as Leis Naturais e por conta disto capazes de explicar a si próprias.
Se hoje não podemos conceber métodos de validação destas teses, há a possibilidade, como cogitou o Fernando, que a solucão esteja contida nas próprias, o que seria compatível com sua natureza pressuposta.
Além do que, houve tempo que testar fenômenos como a eletricidade era impossível aos recursos de conhecimento disponíveis. Foi o uso combinado da observação e imaginação criativa que produziu estes meios.
O desafio Metafísico é obviamente maior, mas é próprio do Espírito Humano se motivar com os grandes desafios.
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Acauan dos Tupis
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Não confundir o instrumento utilizado para conhecer o objecto com o próprio. No meu entender, isto é o que torna a metafisica difícil de ser apreendida.
Torna-se muito difícil à maioria das pessoas, reflectir no abstracto, num campo de total imaginação para encontrar razões a respeito de dados que inicialmente até são empíricos. Estes dados iniciais sem o "algo mais", nem seriam compreendidos, catalogados e organizados. Seriamos como os demais animais, também eles recebedores de dados semelhantes.
Acauan disse: A Metafísica não se ocupa do que está além do conhecimento empírico, mas parte deste conhecimento para projetar o que possivelmente está além. Ou seja, a Física está contida na Metafísica e uma não concorre com a outra.
Não me entenda mal, não tenho nada contra a imaginação ou hipóteses, sem isso não se faz ciência, mas tem quem abuse do termo metafísica para colocar em pé de igualdade suas crenças com fatos comprovados dizendo que pela metafísica a determinada "verdade" não precisa de comprovação.
Cameron disse: Não me entenda mal, não tenho nada contra a imaginação ou hipóteses, sem isso não se faz ciência, mas tem quem abuse do termo metafísica para colocar em pé de igualdade suas crenças com fatos comprovados dizendo que pela metafísica a determinada "verdade" não precisa de comprovação.
Tudo bem que você prefira as teorias científicas às teorias metafísicas. Mas a aceitação da "autoridade realística" da Ciência precisa se fundamentar na validade do Realismo Externo, que é um paradigma da Metafísica. Como você pode reivindicar que um postulado metafísico precisa de "comprovação"? Até onde sei, nem argumentos lógicos e nem testes empíricos podem corroborar a Metafísica da Ciência ou qualquer enunciado metafísico. Algumas citações interessantes sobre isso:
"[...] Karl Popper argued that metaphysical statements are not meaningless statements, but rather not fallible, testable or provable statements[20] i.e. neither empirical observations nor logical arguments could falsify metaphysical statements to show them to be true or false. Hence, a metaphysical statement usually implies an idea about the world or about the universe, which may be reasonable but is ultimately not empirically testable."
"A lógica não nos diz, por si mesma, aquilo em que acreditar. Só nos diz o que tem de ser o caso, dada a verdade dos nossos pressupostos e portanto o que estamos comprometidos a acreditar dado que acreditamos nesses pressupostos. A lógica e a racionalidade fornecem padrões de demonstração, validade e razoabilidade; mas os padrões só operam sobre um conjunto previamente dado de axiomas, pressupostos, fins e objetivos. A racionalidade, enquanto tal, não faz afirmações substantivas."
Racionalidade e realismo: o que está em jogo? de John R. Searle
O mau uso de um instrumento não devia influir na percepção de um peregrino da verdade. Deste modo nasce o sectarismo e os dogmas restritos e fechados, a rejeição e aversão sem razão.
Acauan disse: A Metafísica não se ocupa do que está além do conhecimento empírico, mas parte deste conhecimento para projetar o que possivelmente está além. Ou seja, a Física está contida na Metafísica e uma não concorre com a outra.
Não me entenda mal, não tenho nada contra a imaginação ou hipóteses, sem isso não se faz ciência, mas tem quem abuse do termo metafísica para colocar em pé de igualdade suas crenças com fatos comprovados dizendo que pela metafísica a determinada "verdade" não precisa de comprovação.
Isto parece refletir uma interpretação moderna e comum de que o conhecimento atual é o ápice de uma evolução histórica que se inicia nas interpretações mitológicas tribais, passa pela ritualização religiosa dos mitos, chega à formalização filosófica metafísica e encontra sua plenitude na ciência naturalista experimental.
Isto é absolutamente incorreto e nada no Método Científico - ou em nenhum dos Métodos Científicos - abaliza esta visão.
Os conteúdos mitológicos, metafísicos e científicos coexistem no processo de formação do conhecimento, sendo as fronteiras entre eles uma determinação arbitrária de quem faz a classificação.
Um exemplo claro é que toda formulação de hipóteses científicas parte de um mito conhecido e reinterpreta este mito de um ponto de vista naturalista. Todas as hipóteses científicas sobre a origem do Universo podem ser resumidas em duas - criação ex-nihilo e universo eterno, variações dos mitos da criação divina e do mitos panteístas primitivos. Desdobradas as hipóteses, a evolução do Universo é explicada por duas vertentes - o acaso criativo (formalizado no materialismo de Epicuro) e a evolução conduzida (seja pela seleção natural ou por Deus). Novamente, duas vertentes de mito adaptadas para explicar cientificamente as origens.
É evidente nossa dificuldade em formular hipóteses que fujam aos mitos conhecidos, por isto após toda uma aparente sofisticação do pensamento científico continuamos presos às hipóteses da criação ou do acaso, sem conseguir imaginar uma terceira hipótese.
O método científico está impregnado de Metafísica, a partir do momento que assume sem qualquer prova empírica que existe uma realidade além da autoconsciência e que a percepção desta autoconsciência é real, uma vez que mesmo a autoconsciência só pode comprovar sua própria existência no instante imediato. É impossível provar empiricamente que todas as nossas memórias não foram criadas um segundo atrás.
Assim, a Metafísica não é um substituto para os métodos experimentais, mas um complemento deles ou a ciência experimental, a Metafísica e a mitologia são componentes do sistema de conhecimento humano, que também inclui experiências intuitivas e atávicas não racionalizáveis.
Somos vítimas de um certo deslumbramento de que os avanços tecnológicos atestam a superioridade do Método Científico, mas isto só ocorre no campo da aplicação prática, na interface ciência - engenharia. Quando passamos para o universo do conhecimento humano - que inclui a própria identidade individual - a coisa se torna muito mais complexa.
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Acauan dos Tupis
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Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Acauan disse: Somos vítimas de um certo deslumbramento de que os avanços tecnológicos atestam a superioridade do Método Científico, mas isto só ocorre no campo da aplicação prática, na interface ciência - engenharia. Quando passamos para o universo do conhecimento humano - que inclui a própria identidade individual - a coisa se torna muito mais complexa.
Acho que isso resume bem a questão toda, a ciência moderna nos "mimou", ficamos acostumados a ter respostas sobre determinados eventos que podemos tirar provas e que não dependam de nossa credulidade para funcionar, quando saímos disso para a pantanosa metafísica a desconfiança é inevitável.
Cameron disse: Acho que isso resume bem a questão toda, a ciência moderna nos "mimou", ficamos acostumados a ter respostas sobre determinados eventos que podemos tirar provas e que não dependam de nossa credulidade para funcionar, quando saímos disso para a pantanosa metafísica a desconfiança é inevitável.
Cameron,
Não existe esta coisa de "ciência é conhecimento provado" ou "ciência é derivada de observação imparcial e livre de credulidades".
Se o Realismo Externo fosse algo científico, como você parece acreditar, então não teríamos observado as várias revoluções científicas que já aconteceu na Física, na Química, etc. Ou se poderia dizer que o Realismo teria sido refutado na primeira vez em que o "conhecimento provado" se mostrou falso.
A questão é que as proposições de observação são dependentes das teorias, e essas últimas são falíveis. Se os cientistas não tivessem a CRENÇA de que as proposições de observação são falíveis (e, consequentemente, podem ser refutadas por desenvolvimentos teóricos posteriores), então a aceitação unânime do Geocentrismo teria durado muito mais tempo:
"Quando foi pela primeira vez proposta, os críticos apontavam duas observações que pareciam falsificar a teoria de Copérnico. Primeiro, se a Terra se move, um objecto que cai de uma torre alta devia cair fazendo um ângulo e não a direito, pois se a Terra se move durante o período da queda, o objecto devia cair a uma distância equivalente relativamente ao ponto exactamente abaixo de foi largado. Porém, é claro que os objectos caídos de torres caem sempre na vertical. Esta observação parece imediatamente falsificar a teoria copernicana.
Segundo, se a Terra anda em volta do Sol, as estrelas fixas deviam ter um movimento aparente para trás e para diante ao longo do nosso campo de visão durante o período de um ano (do mesmo modo que se olhássemos directamente para norte andando à volta de um poste de iluminação, as casas ao longo da rua se moveriam para trás e para diante ao longo do nosso campo de visão)."
Chega a ser irônico que o filósofo da ciência mais influente do século XX tenha usado a mesma analogia que você utilizou para descrever a Metafísica ao se referir a base empírica da ciência:
"A base empírica de uma ciência objetiva não tem assim nada de 'absoluto'. A ciência não repousa sobre um sólido leito pedregoso. A audaciosa estrutura de suas teorias ergue-se como se estivesse sobre um pântano. Ela é como um prédio construído sobre estacas. Estas são impulsionadas para baixo no pântano, mas não para alguma base natural ou 'dada'; e se paramos impulsionar as estacas mais para o fundo não é porque alcançamos solo firme. Nós simplesmente paramos quando ficamos satisfeitos pelas estacas estarem suficientemente firmes para agüentar a estrutura, ao menos por um tempo."
K. R Popper, The Logic of Scientiftc Discovery. (Londres: Hutchinson, 1968)
Não existe esta coisa de "ciência é conhecimento provado" ou "ciência é derivada de observação imparcial e livre de credulidades".
Em alguns casos é sim, eu não preciso acreditar que as vacinas que tomei me imunizaram contra doenças para elas serem efetivas, vários outros exemplos nesse sentido podem ser dados sobre a funcionalidade e comprovação de eventos e fenômenos que independem da credulidade ou não da pessoa.
Acauan disse: dado ser impossível ter certeza de que todos os demais seres não são produto da imaginação desta consciência.
a vontade alheia prova outra personalidade.
Alem do mais porque minha consciência criaria para os outros uma vida que seria mais desejável para mim?
ou ao contrario criaria para os outros uma realidade naõ desejada por mim? Tipo sendo crente porque desejaria que os outros fossem ateus, Isto sim seria algumas criações esquizofrênicas.
Acauan disse: Quando tropeçamos em uma pedra, constatamos que a realidade da dor dá testemunho de que a pedra é real ou consideramos que a dor e a pedra são criações da consciência, que se torna coadjuvante impotente em sua própria criação.
o autor do filme matrix exemplificou que toda a realidade vivenciada pelos humanos escravizados pelas maquinas não passava de impulsos eletricos programados.
De fato a dor são impulsos eletroquímicos entregues ao cérebro, mas que podem ser ignorados pela consciência através dos anestésicos .
Acauan disse: Admitido que a consciência individual seja parte da realidade e não o todo, restam as hipóteses de o conjunto da realidade ser finito ou infinito.
Acredito que a consciência individual seja apenas parte do todo (Deus) "1"
Acauan disse: Se finito, em tese existe a possibilidade de que o conjunto da realidade possa ser conhecido pela experiência acumulada e transmitida pelas gerações humanas, caso nossa determinação, tempo, recursos e métodos dedicados ao objetivo forem suficientes. Uma realidade finita é explicável pela Ciência.
Deus é a consciência e a realidade total limitada, portanto finita.
pois se pudesse ultrapassar seus limites , não seria o todo pois ainda haveria um espaço alem dele.
Mas sendo representado pela unidade "1" pode dividir-se infinitamente sem que a sua reintegração altere sua totalidade finita "1".
Apesar de ser finito, por não esta sujeito ao tempo não pode ser conhecido estaticamente e integralmente pela ciência, pois sua divisibilidade é infinita e constante:( "pois o meu pai trabalha até agora e eu tambem").
sinto logo existo!
sem nenhuma consciência sem existências
Cameron disse: Em alguns casos é sim, eu não preciso acreditar que as vacinas que tomei me imunizaram contra doenças para elas serem efetivas,
Ao negar o que eu disse e colocar essa observação, você está criando, implicitamente, uma dicotomia entre objetivismo e “negação da ciência como 'conhecimento provado'” e entre objetivismo e “negação da existência de 'observação científica livre de parcialidades e credulidades'”. Acontece que não há essas dicotomias.
Não se deve confundir as teorias - que são produtos humanos sujeitos ao desenvolvimento e à mudança - com o modo de comportamento do mundo físico, que está pré-ordenado pela natureza do mundo antes que a ciência chegue mesmo a começar. Nossas teorias são um tipo de produto social, embora a extensão em que são capazes de lidar com o mundo físico, que não é um produto social, não seja determinada socialmente. Basicamente, é isso o que diz o Realismo Não-Representativo. Vou colocar duas citações do mesmo livro de um dos teóricos desse tipo de Realismo para que me entenda melhor:
“Podemos avaliar nossas teorias do ponto de vista da extensão em que lidam com sucesso com algum aspecto do mundo, mas não podemos ir mais além e avaliá-las do ponto de vista da extensão em que descrevem o mundo como ele realmente é, simplesmente porque não temos acesso ao mundo independentemente de nossas teorias, de maneira que nos capacite a avaliar a propriedade daquelas descrições.(...)”
“De acordo com o mais ingênuo dos indutivistas, a base do conhecimento científico é fornecida pelas observações feitas por um observador despreconceituoso e imparcial. Se for interpretada literalmente, esta posição é absurda e insustentável. Para ilustrar, imaginemos Heinrich Hertz, em 1888, realizando o experimento elétrico que lhe possibilitou produzir e detectar ondas de rádio pela primeira vez. Se ele deve estar totalmente livre de preconceitos ao fazer suas observações, então será obrigado a registrar não apenas as leituras nos vários medidores, a presença ou ausência de faíscas nos vários locais críticos nos circuitos elétricos, as dimensões do circuito etc., mas também a cor dos medidores, as dimensões do laboratório, a meteorologia, o tamanho de seus sapatos e todo um elenco de detalhes 'claramente irrelevantes', isto é, irrelevantes para o tipo de teoria na qual Hertz estava interessado e que estava testando. (Neste caso particular Hertz testava a teoria eletromagnética de Maxwell para ver se ele podia produzir as ondas de rádio previstas por aquela teoria). (...)
O experimento de Hertz acima mencionado fornece um bom exemplo. Um dos fatores que mencionei como 'claramente irrelevante' era na verdade muito relevante. Era uma conseqüência da teoria em teste que as ondas de rádio devessem ter uma velocidade igual à velocidade da luz. Quando Hertz mensurou a velocidade de suas ondas de rádio, descobriu repetidas vezes que suas velocidades eram significativamente diferentes da velocidade da luz. Ele nunca foi capaz de resolver o problema. Apenas depois de sua morte que a origem do problema foi realmente compreendida. As ondas de rádio emitidas por seu aparelho estavam sendo refletidas das paredes do laboratório de volta ao aparelho, interferindo em suas mensurações. As dimensões do laboratório revelaram-se muito relevantes. As teorias falíveis e incompletas que constituem o conhecimento científico podem, portanto, dar orientação falsa a um observador.”
CHALMERS, Alan F. O que é Ciência Afinal? São Paulo: Brasiliense, 1993.
Cameron disse: vários outros exemplos nesse sentido podem ser dados sobre a funcionalidade
O fato de uma crença ter se mostrado funcional até o presente momento não garante status de cientificidade a ela. Já ouviu falar da triste história do “peru indutivista” de Bertrand Russell? Dizer que o Realismo é uma hipótese científica só é concebível através do uso da indução. Todavia, uma ideia do tipo “A dependência que os feitos grandiosos da ciência teve da indução é um fundamento para supor que o raciocínio indutivo é um método fidedigno para alcançarmos crenças verdadeiras” é um argumento circular. Esse raciocínio usa a indução para justificar a indução, mas não mostra qualquer motivo para confiarmos na validade do princípio indutivo. Esse detalhe foi observado por David Hume já no século 18.
Cameron disse: e comprovação de eventos e fenômenos que independem da credulidade ou não da pessoa.
O que você entende por “comprovação”? "Prova" é algo que existe na lógica e na matemática, mas não na ciência, uma vez que nenhum enunciado científico pode ser inquestionável. Uma maçã “caindo para cima” não atenta contra a lógica. Isso APARENTA atentar contra a lógica porque tendemos a levar em conta a fé metafísica na existência de regularidades no mundo. Não tenho nada contra essa última, já que é uma crença sem a qual não se poderia conceber qualquer ação prática. Mas daí dizer que essa não é uma crença metafísica já é outra história. Portanto, o Realismo Externo é um termo da Metafísica da Ciência.
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Comentários
Tentarei reler o texto e, reler de novo, quem sabe se faça alguma luz.
Ambos se vêem como separados do mundo do qual são "extensão"
Tudo e o nada são uma e a mesma coisa.
O meio termo entre o solipsismo e o niihilismo é o intermédio que referi anteriormente - Ver a interligação entre todas as coisas (numa visão clara, inclusive, a continuidade ou eternidade).
Assumimos, sem poder provar, que os outros indivíduos são tão conscientes quanto nós. Para inteligências artificiais, usa-se o Teste de Turing.
"O Tao que podemos debater não é o Tao".
Cameron,
Pelo que entendi, você é favorável a um nível de niilismo que se define por promover uma postura crítica, contestatória ou cética com relação aos valores estabelecidos e aceitos sem questionamento.
Até aí nada contra, mesmo porque se bem conduzido este processo pode levar ao entendimento dos mecanismos pelos quais estes valores são estabelecidos e realimentar a crítica em um nível mais aprofundado da questão.
O problema com o niilismo puro é que em última instância leva ao que o próprio nome traduz, a redução ao nada.
A filosofia de Nietzsche flerta com esta fonte, mas nem ele se arriscou a ultrapassar certos limites. Note que sua proposta no Zaratustra é a transmutação de TODOS os valores, mas não o abandono ou negação de todos os valores. No fim o próprio Nietzsche entende as armadilhas da negação e cria seu próprio modelo metafísico do Eterno Retorno, uma tentativa um tanto errática de metafísica niilista.
O ponto é que se tiramos da filosofia de Nietzsche suas últimas amarras metafísicas o que sobra é a ideologia da Vontade de Potência, cujo exemplo mais puro e efetivo é o Nazismo.
Qualquer conhecedor da biografia e obra de Nietzsche sabe que é um erro básico associar suas idéias ao nazismo. Mas o nazismo nada mais é que niilismo Nietzscheniano em estado puro.
O comunismo revolucionário bolchevique também bebe nesta fonte, embora faça disfarçadamente o que o nacional socialismo revolucionário fazia declaradamente.
Ou seja, o problema não é o niilismo em si. Mesmo o solipsismo pode levar a exercícios de pensamento interessantes, desde que o pensador cuide para manter uma âncora na realidade antes de se lançar no mar revolto que estes estados filosóficos podem produzir.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Solipsismo é o conceito filosófico que defende o relativismo absoluto, não existe nada, nenhum dado ou evento objetivo, tudo é relativo e dependente de uma determinada perspectiva, você o descreveu bem, fosse verdade todos seríamos deuses esquisofrênicos presos dentro da ilusão por nós mesmos criada.
Niilismo seria a antítese e única opção racional ao antropocentrismo, como o Cabeção disse em outro tópico, diante de duas possibilidades, ou o ser humano e suas abstrações são relevantes para a realidade ou não, ou estamos em uma realidade antropocêntrica (os valores humanos são objetivos) ou niilista (os valores humanos são subjetivos).
Acho que a confusão deve ser em relação a ausência de valores niilista comparada com a afirmação de que tudo é ilusório por parte do solipsismo, o niilismo não nega a existência de dados objetivos e sim que abstrações humanas como ideais de moral e justiça fariam parte dessa categoria.
Por exemplo, na sua analogia com a pedra, o niilismo não nega que a dor seja um mecanismo objetivo dentro de nossa estrutura biológica mas nega a objetividade de quem afirma que a dor seja um caminho para a purificação espiritual ou abstrações dessa natureza.
O ponto é que a realidade, ao menos como eu a vejo, não tem nada de antropocêntrica, não parece que, ao contrário do que muitos gostariam de acreditar, sejamos a cereja do bolo, o supra-sumo da criação ou o ápice da existência, tudo indica que somos apenas mais uma dentre bilhões de espécies que habitaram esse planeta fadados ao mesmo destino, a realidade parece negar todas as nossas abstrações e ilusões acerca de nós mesmos, nesse ponto, niilismo se assemelha muito com a descrença em vida após a morte, muitas pessoas não conseguem suportar a ideia de sua própria mortalidade e tentam acreditar por mais carente de qualquer objetividade que esteja que exista um algo a mais, um propósito maior que no entanto todas as evidências apontam em direção contrária, de forma similar, as pessoas não conseguem aceitar que os elementos que mais valorizam sejam apenas arbitrariedades do ser humano em sua vã tentativa de moldar a realidade aos caprichos de seus egos.
Dito isso, talvez alguém ache que sou imoral, que na ausência de valores objetivos de moral e justiça nada impede que uma pessoa se torne uma psicopata, ledo engano, basta apenas não confundir subjetivo com inútil, talvez conceitos como moral e justiça não sejam objetivos, talvez não passem de mera arbitrariedade e teimosia de nossa parte mas nem por isso deixam de ser os responsáveis pelos maiores feitos da sociedade humana, sem nossas abstrações, sem nossas subjetividades ainda estaríamos no meio da selva disputando comida a dentadas.
Isso para mim é motivo mais do que suficiente para defender esses valores com unhas e dentes, não existe a menor necessidade de endossarmos ilusões de grandeza e megalomanias antropocêntricas para tal, são grandiosos como são, do mesmo modo como a vida não precisa ser eterna para que seja preciosa.
Ainda estamos.
A metafísica ocidental na sua encarnação contemporânea também faz essa asserção:
"Dados um mundo real, uma linguagem pública para falar acerca dele e as concepções de verdade, conhecimento, racionalidade etc. implícitas na metafísica ocidental, haverá um conjunto complexo, mas não arbitrário, de critérios para ajuizar os méritos relativos de afirmações, teorias, explicações, interpretações e outros tipos de considerações. Alguns destes critérios são 'objetivos' no sentido em que são independentes das sensibilidades das pessoas que aplicam os critérios; outros são 'intersubjetivos' no sentido em que apelam a características amplamente partilhadas da sensibilidade humana. Um exemplo de objetividade neste sentido são os critérios para avaliar a validade no cálculo proposicional; um exemplo de intersubjetividade são os tipos de critérios a que se apela ao discutir interpretações históricas rivais da guerra civil americana. Não há uma linha divisória precisa entre as duas; e nas disciplinas em que a interpretação é crucial, como a história ou a crítica literária, a intersubjetividade é, de harmonia com isso, central à atividade intelectual."
Racionalidade e realismo: o que está em jogo? de John R. Searle
http://ateus.net/artigos/filosofia/racionalidade-e-realismo-o-que-esta-em-jogo/
Esse é um dos problemas que eu tenho com a metafísica em relação ao estudo feito dentro da física, como estudar algo que não está acessível? O primeiro passo para uma base sólida de conhecimento é ter um objeto de estudo claro, quando se torna divagações a partir de divagações a partir de divagações a linha que separa o real do imaginário se apaga.
Não se estuda, especula-se apenas, por gosto, curiosidade ou diversão. Havendo, é claro, a possibilidade de que tais especulações um dia levem a algo ou sejam confirmadas.
Voltamos ao ponto de que a única objetividade autoevidente é a autoconsciência. Tudo mais é potencialmente subjetivo e todas as outras objetividades são atribuídas, conforme algum critério.
A Metafísica não é um dogmatismo, logo a subjetividade dos valores é uma tese a priori tão válida quanto qualquer outra. Já o Nihilismo é uma cosmovisão na qual a negação dos absolutos é um axioma e é aí onde mora o perigo.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Se há possibilidade que levem a algo ou sejam confirmadas, então são mais que gosto, curiosidade e diversão, mesmo porque Ciência experimental também formula teses que não pode confirmar, apenas estabelece o grau de correspondência entre experimento e teoria, cujas conclusões se alteram conforme um e outro progridem.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Correto. Em última instância a Metafísica é um exercício de imaginação, mas todo processo criativo também o é, incluída toda teorização científica.
Se as críticas à falta de sustentação empírica da Metafísica são corretas no que se refere às especulações além da experimentação, cabe lembrar que é incorreta a idéia de que tais especulações sejam o único objeto de estudo da Metafísica.
A Metafísica não se ocupa do que está além do conhecimento empírico, mas parte deste conhecimento para projetar o que possivelmente está além. Ou seja, a Física está contida na Metafísica e uma não concorre com a outra.
A base de sustentação empírica da Metafísica é que a observação evidencia que existem Leis Naturais, que se mostram válidas para todos os fenômenos que observamos e continuam válidas conforme aumentamos a abrangência e profundidade das observações pelo conhecimento acumulado e desenvolvimento da técnica.
As Ciências Naturais experimentais operam dentro do axioma da validade universal das leis naturais - o que é tão incerto quanto qualquer pressuposição Metafísica.
Mas mesmo que considerada verdadeira a validade universal das Leis Naturais, a Ciência Natural estuda como estas Leis se manifestam. mas não podem explicar porque estas leis existem.
As Leis Naturais são parte integrante do conjunto da Realidade, mas não seu todo, não podem explicar a si próprias, o que leva os pensadores do tema a buscar um modelo que inclua e explique as Leis Naturais e além disto seja autoexplicativo.
Este modelo é necessariamente Metafísico e suas especulações se baseiam na hipótese de que existam Leis da Realidade, mais abrangentes que as Leis Naturais e por conta disto capazes de explicar a si próprias.
Se hoje não podemos conceber métodos de validação destas teses, há a possibilidade, como cogitou o Fernando, que a solucão esteja contida nas próprias, o que seria compatível com sua natureza pressuposta.
Além do que, houve tempo que testar fenômenos como a eletricidade era impossível aos recursos de conhecimento disponíveis. Foi o uso combinado da observação e imaginação criativa que produziu estes meios.
O desafio Metafísico é obviamente maior, mas é próprio do Espírito Humano se motivar com os grandes desafios.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Torna-se muito difícil à maioria das pessoas, reflectir no abstracto, num campo de total imaginação para encontrar razões a respeito de dados que inicialmente até são empíricos. Estes dados iniciais sem o "algo mais", nem seriam compreendidos, catalogados e organizados. Seriamos como os demais animais, também eles recebedores de dados semelhantes.
Tudo bem que você prefira as teorias científicas às teorias metafísicas. Mas a aceitação da "autoridade realística" da Ciência precisa se fundamentar na validade do Realismo Externo, que é um paradigma da Metafísica. Como você pode reivindicar que um postulado metafísico precisa de "comprovação"? Até onde sei, nem argumentos lógicos e nem testes empíricos podem corroborar a Metafísica da Ciência ou qualquer enunciado metafísico. Algumas citações interessantes sobre isso:
"[...] Karl Popper argued that metaphysical statements are not meaningless statements, but rather not fallible, testable or provable statements[20] i.e. neither empirical observations nor logical arguments could falsify metaphysical statements to show them to be true or false. Hence, a metaphysical statement usually implies an idea about the world or about the universe, which may be reasonable but is ultimately not empirically testable."
http://en.wikipedia.org/wiki/Metaphysics
"A lógica não nos diz, por si mesma, aquilo em que acreditar. Só nos diz o que tem de ser o caso, dada a verdade dos nossos pressupostos e portanto o que estamos comprometidos a acreditar dado que acreditamos nesses pressupostos. A lógica e a racionalidade fornecem padrões de demonstração, validade e razoabilidade; mas os padrões só operam sobre um conjunto previamente dado de axiomas, pressupostos, fins e objetivos. A racionalidade, enquanto tal, não faz afirmações substantivas."
Racionalidade e realismo: o que está em jogo? de John R. Searle
http://ateus.net/artigos/filosofia/racionalidade-e-realismo-o-que-esta-em-jogo/
Isto parece refletir uma interpretação moderna e comum de que o conhecimento atual é o ápice de uma evolução histórica que se inicia nas interpretações mitológicas tribais, passa pela ritualização religiosa dos mitos, chega à formalização filosófica metafísica e encontra sua plenitude na ciência naturalista experimental.
Isto é absolutamente incorreto e nada no Método Científico - ou em nenhum dos Métodos Científicos - abaliza esta visão.
Os conteúdos mitológicos, metafísicos e científicos coexistem no processo de formação do conhecimento, sendo as fronteiras entre eles uma determinação arbitrária de quem faz a classificação.
Um exemplo claro é que toda formulação de hipóteses científicas parte de um mito conhecido e reinterpreta este mito de um ponto de vista naturalista. Todas as hipóteses científicas sobre a origem do Universo podem ser resumidas em duas - criação ex-nihilo e universo eterno, variações dos mitos da criação divina e do mitos panteístas primitivos. Desdobradas as hipóteses, a evolução do Universo é explicada por duas vertentes - o acaso criativo (formalizado no materialismo de Epicuro) e a evolução conduzida (seja pela seleção natural ou por Deus). Novamente, duas vertentes de mito adaptadas para explicar cientificamente as origens.
É evidente nossa dificuldade em formular hipóteses que fujam aos mitos conhecidos, por isto após toda uma aparente sofisticação do pensamento científico continuamos presos às hipóteses da criação ou do acaso, sem conseguir imaginar uma terceira hipótese.
O método científico está impregnado de Metafísica, a partir do momento que assume sem qualquer prova empírica que existe uma realidade além da autoconsciência e que a percepção desta autoconsciência é real, uma vez que mesmo a autoconsciência só pode comprovar sua própria existência no instante imediato. É impossível provar empiricamente que todas as nossas memórias não foram criadas um segundo atrás.
Assim, a Metafísica não é um substituto para os métodos experimentais, mas um complemento deles ou a ciência experimental, a Metafísica e a mitologia são componentes do sistema de conhecimento humano, que também inclui experiências intuitivas e atávicas não racionalizáveis.
Somos vítimas de um certo deslumbramento de que os avanços tecnológicos atestam a superioridade do Método Científico, mas isto só ocorre no campo da aplicação prática, na interface ciência - engenharia. Quando passamos para o universo do conhecimento humano - que inclui a própria identidade individual - a coisa se torna muito mais complexa.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Cameron,
Não existe esta coisa de "ciência é conhecimento provado" ou "ciência é derivada de observação imparcial e livre de credulidades".
Se o Realismo Externo fosse algo científico, como você parece acreditar, então não teríamos observado as várias revoluções científicas que já aconteceu na Física, na Química, etc. Ou se poderia dizer que o Realismo teria sido refutado na primeira vez em que o "conhecimento provado" se mostrou falso.
A questão é que as proposições de observação são dependentes das teorias, e essas últimas são falíveis. Se os cientistas não tivessem a CRENÇA de que as proposições de observação são falíveis (e, consequentemente, podem ser refutadas por desenvolvimentos teóricos posteriores), então a aceitação unânime do Geocentrismo teria durado muito mais tempo:
"Quando foi pela primeira vez proposta, os críticos apontavam duas observações que pareciam falsificar a teoria de Copérnico. Primeiro, se a Terra se move, um objecto que cai de uma torre alta devia cair fazendo um ângulo e não a direito, pois se a Terra se move durante o período da queda, o objecto devia cair a uma distância equivalente relativamente ao ponto exactamente abaixo de foi largado. Porém, é claro que os objectos caídos de torres caem sempre na vertical. Esta observação parece imediatamente falsificar a teoria copernicana.
Segundo, se a Terra anda em volta do Sol, as estrelas fixas deviam ter um movimento aparente para trás e para diante ao longo do nosso campo de visão durante o período de um ano (do mesmo modo que se olhássemos directamente para norte andando à volta de um poste de iluminação, as casas ao longo da rua se moveriam para trás e para diante ao longo do nosso campo de visão)."
Indução e filosofia da ciência, Stephen Law.
http://criticanarede.com/fildaciencia.html
Chega a ser irônico que o filósofo da ciência mais influente do século XX tenha usado a mesma analogia que você utilizou para descrever a Metafísica ao se referir a base empírica da ciência:
"A base empírica de uma ciência objetiva não tem assim nada de 'absoluto'. A ciência não repousa sobre um sólido leito pedregoso. A audaciosa estrutura de suas teorias ergue-se como se estivesse sobre um pântano. Ela é como um prédio construído sobre estacas. Estas são impulsionadas para baixo no pântano, mas não para alguma base natural ou 'dada'; e se paramos impulsionar as estacas mais para o fundo não é porque alcançamos solo firme. Nós simplesmente paramos quando ficamos satisfeitos pelas estacas estarem suficientemente firmes para agüentar a estrutura, ao menos por um tempo."
K. R Popper, The Logic of Scientiftc Discovery. (Londres: Hutchinson, 1968)
a vontade alheia prova outra personalidade.
Alem do mais porque minha consciência criaria para os outros uma vida que seria mais desejável para mim?
ou ao contrario criaria para os outros uma realidade naõ desejada por mim? Tipo sendo crente porque desejaria que os outros fossem ateus, Isto sim seria algumas criações esquizofrênicas.
o autor do filme matrix exemplificou que toda a realidade vivenciada pelos humanos escravizados pelas maquinas não passava de impulsos eletricos programados.
De fato a dor são impulsos eletroquímicos entregues ao cérebro, mas que podem ser ignorados pela consciência através dos anestésicos .
Acredito que a consciência individual seja apenas parte do todo (Deus) "1"
Deus é a consciência e a realidade total limitada, portanto finita.
pois se pudesse ultrapassar seus limites , não seria o todo pois ainda haveria um espaço alem dele.
Mas sendo representado pela unidade "1" pode dividir-se infinitamente sem que a sua reintegração altere sua totalidade finita "1".
Apesar de ser finito, por não esta sujeito ao tempo não pode ser conhecido estaticamente e integralmente pela ciência, pois sua divisibilidade é infinita e constante:( "pois o meu pai trabalha até agora e eu tambem").
sem nenhuma consciência sem existências
Ao negar o que eu disse e colocar essa observação, você está criando, implicitamente, uma dicotomia entre objetivismo e “negação da ciência como 'conhecimento provado'” e entre objetivismo e “negação da existência de 'observação científica livre de parcialidades e credulidades'”. Acontece que não há essas dicotomias.
Não se deve confundir as teorias - que são produtos humanos sujeitos ao desenvolvimento e à mudança - com o modo de comportamento do mundo físico, que está pré-ordenado pela natureza do mundo antes que a ciência chegue mesmo a começar. Nossas teorias são um tipo de produto social, embora a extensão em que são capazes de lidar com o mundo físico, que não é um produto social, não seja determinada socialmente. Basicamente, é isso o que diz o Realismo Não-Representativo. Vou colocar duas citações do mesmo livro de um dos teóricos desse tipo de Realismo para que me entenda melhor:
“Podemos avaliar nossas teorias do ponto de vista da extensão em que lidam com sucesso com algum aspecto do mundo, mas não podemos ir mais além e avaliá-las do ponto de vista da extensão em que descrevem o mundo como ele realmente é, simplesmente porque não temos acesso ao mundo independentemente de nossas teorias, de maneira que nos capacite a avaliar a propriedade daquelas descrições.(...)”
“De acordo com o mais ingênuo dos indutivistas, a base do conhecimento científico é fornecida pelas observações feitas por um observador despreconceituoso e imparcial. Se for interpretada literalmente, esta posição é absurda e insustentável. Para ilustrar, imaginemos Heinrich Hertz, em 1888, realizando o experimento elétrico que lhe possibilitou produzir e detectar ondas de rádio pela primeira vez. Se ele deve estar totalmente livre de preconceitos ao fazer suas observações, então será obrigado a registrar não apenas as leituras nos vários medidores, a presença ou ausência de faíscas nos vários locais críticos nos circuitos elétricos, as dimensões do circuito etc., mas também a cor dos medidores, as dimensões do laboratório, a meteorologia, o tamanho de seus sapatos e todo um elenco de detalhes 'claramente irrelevantes', isto é, irrelevantes para o tipo de teoria na qual Hertz estava interessado e que estava testando. (Neste caso particular Hertz testava a teoria eletromagnética de Maxwell para ver se ele podia produzir as ondas de rádio previstas por aquela teoria). (...)
O experimento de Hertz acima mencionado fornece um bom exemplo. Um dos fatores que mencionei como 'claramente irrelevante' era na verdade muito relevante. Era uma conseqüência da teoria em teste que as ondas de rádio devessem ter uma velocidade igual à velocidade da luz. Quando Hertz mensurou a velocidade de suas ondas de rádio, descobriu repetidas vezes que suas velocidades eram significativamente diferentes da velocidade da luz. Ele nunca foi capaz de resolver o problema. Apenas depois de sua morte que a origem do problema foi realmente compreendida. As ondas de rádio emitidas por seu aparelho estavam sendo refletidas das paredes do laboratório de volta ao aparelho, interferindo em suas mensurações. As dimensões do laboratório revelaram-se muito relevantes. As teorias falíveis e incompletas que constituem o conhecimento científico podem, portanto, dar orientação falsa a um observador.”
CHALMERS, Alan F. O que é Ciência Afinal? São Paulo: Brasiliense, 1993.
O fato de uma crença ter se mostrado funcional até o presente momento não garante status de cientificidade a ela. Já ouviu falar da triste história do “peru indutivista” de Bertrand Russell? Dizer que o Realismo é uma hipótese científica só é concebível através do uso da indução. Todavia, uma ideia do tipo “A dependência que os feitos grandiosos da ciência teve da indução é um fundamento para supor que o raciocínio indutivo é um método fidedigno para alcançarmos crenças verdadeiras” é um argumento circular. Esse raciocínio usa a indução para justificar a indução, mas não mostra qualquer motivo para confiarmos na validade do princípio indutivo. Esse detalhe foi observado por David Hume já no século 18.
O que você entende por “comprovação”? "Prova" é algo que existe na lógica e na matemática, mas não na ciência, uma vez que nenhum enunciado científico pode ser inquestionável. Uma maçã “caindo para cima” não atenta contra a lógica. Isso APARENTA atentar contra a lógica porque tendemos a levar em conta a fé metafísica na existência de regularidades no mundo. Não tenho nada contra essa última, já que é uma crença sem a qual não se poderia conceber qualquer ação prática. Mas daí dizer que essa não é uma crença metafísica já é outra história. Portanto, o Realismo Externo é um termo da Metafísica da Ciência.