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Universo desvendado
Físicos estão mais perto de descobrir o Bóson de Higgs, ou Partícula de Deus, e comprovar a teoria que explica da radioatividade à fonte de energia das estrelas, mas já buscam mistério maior: a Teoria de Tudo
O Grande Colisor de Hádrons (ou Large Hadron Collider, LHC na sigla em inglês)
Os rumores circularam por semanas: cientistas da Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN, na sigla em francês), construído em Genebra para a pesquisa de partículas, haviam finalmente identificado a partícula chamada Bóson de Higgs, a última peça do grande quebra-cabeça que explica a natureza do cosmos. Porém, a coletiva de imprensa realizada em dezembro do ano passado não atendeu às expectativas. Os cientistas não afirmaram se o Bóson de Higgs havia sido descoberto. Em vez disso, disseram que experimentos realizados no acelerador de partículas gigante do CERN, o Grande Colisor de Hádrons (ou Large Hadron Collider, LHC na sigla em inglês) haviam revelado a mais concreta evidência da existência da partícula até hoje. Mais dados seriam apresentados ao longo de 2012.
Para cientistas, porém, o anúncio foi altamente significativo, já que eles estariam a meses de ver completa uma de suas maiores criações, conhecida prosaicamente como o Modelo Padrão. Em construção há 50 anos, o Modelo Padrão é a mais bem sucedida teoria de partículas e forças já feita. Ele explica uma série de fenômenos – magnetismo, radioatividade e até a fonte de energia das estrelas – e deu origem a inúmeras surpresas, como a existência da antimatéria e a de partículas para sempre presas dentro de outras.
O Modelo Padrão é uma das joias da coroa científica. Próximo de estar completo, porém, falhas apareceram, apontando para uma teoria ainda mais abrangente, cujo poder só pode ser especulado. Assim como grande parte da física moderna, a origem do Modelo Padrão reside no trabalho de um ex-funcionário do Departamento de Patentes da Suíça, Albert Einstein. Em 1905, ele publicou uma série de papéis que derrubou ideias há muito estabelecidas a respeito da natureza do tempo, espaço e matéria. Sua teoria de relatividade em especial predizia que novos e estranhos fenômenos emergiriam em velocidades próximas às da luz. Einstein revelou evidências da existência de átomos e mostrou que a própria luz pode ser considerada uma série de conjuntos energéticos chamados quanta.
O japonês Yukawa sugeriu a partícula subatômica méson
Em busca da antimatéria
Estes conceitos revolucionários tiveram sérias implicações. Em 1928, um jovem e brilhante físico chamado Paul Dirac mostrou o resultado de integrar as leis de relatividade especial com a teoria quântica. Conhecida como Eletrodinâmica Quântica (EDQ), estas equações se revelaram uma mina de teorias. Uma nova visão de força eletromagnética emergiu, na qual os quanta de luz – fótons – piscavam entre partículas carregadas, transmitindo sua energia entre elas.
O mais impressionante é que a EDQ previu a existência da “antimatéria”, o exato oposto da matéria comum. A descoberta do pósitron em 1932 – o equivalente de antimatéria do elétron – confirmou o poder da EDQ, estimulando teóricos a levar as ideias adiante. Entre eles, estava o japonês Hideki Yukawa, que se perguntou que outras forças da natureza podiam ser explicadas em termos de trocas de “partículas”, como os fótons. Em 1935, ele sugeriu que a força nuclear – responsável por manter unidos os prótons e os nêutrons no núcleo – era transmitida por meio de uma partícula chamada méson. Yukawa previu qual seria a provável massa do méson e, em 1947, a partícula apareceu em estudos de raios cósmicos. A partícula de Yukawa conquistou espaço entre as outras partículas subatômicas de importância vital na natureza, junto com nomes familiares como elétron e próton.
Algo impressionante, porém, passou a ocorrer quando físicos construíram aceleradores de partículas mais poderosos e acharam ainda mais partículas “fundamentais.” Ao final dos anos 1950, existiam dúzias delas; hoje, o gigante LHC é capaz de revelar literalmente centenas. Enquanto experimentalistas ficaram fascinados com a diversidade de partículas reveladas, teóricos viram nisso um ataque à sua crença na particularidade essencial da natureza. A busca pela simplicidade escondida no caos deu origem a uma explosão sem precedentes de avanços teóricos cujas implicações continuam sendo a vanguarda da física.
Gráficos das subatômicas sugeriram que elas conteriam partículas menores: os quarks
A descoberta dos Quarks
A revolução culminou na criação do Modelo Padrão em 1960, quando os teóricos fizeram uma descoberta bizarra. Ao traçar em um gráfico as propriedades aparentemente díspares das partículas encontradas nos aceleradores, emergiram padrões hexagonais e triangulares. Mais intrigante ainda, foram identificados espaços vazios, sugerindo a existência de partículas ainda a serem descobertas. Nos anos seguintes, as partículas ocultas foram encontradas, com as mesmas propriedades previstas pelos padrões geométricos
Por que os padrões existem? Em 1964, o teórico americano Murray Gell-Mann apresentou uma corajosa ideia: presas dentro de muitas das partículas estariam as entidades verdadeiramente fundamentais, nomeadas por ele como quarks. As diferentes propriedades das partículas refletiam as combinações de dois ou três quarks dentro delas, aflrmou Gell-Mann. Foi uma declaração surpreendente, que exigia que os quarks tivessem propriedades nunca encontradas em partículas reais. Em 1968, físicos procuraram por quarks lançando partículas através de prótons e nêutrons e examinando seus interiores. Os resultados revelaram a presença de objetos dentro das partículas com as mesmas propriedades previstas para os quarks.
A descoberta dos quarks ressuscitou as esperanças por uma teoria uniflcada para as partículas subatômicas. A ideia foi encorajada, mais ou menos na mesma época, pela teoria uniflcada das forças fundamentais. Já em 1938, Yukawa encontrou pistas de que duas destas forças – eletromagnetismo e a chamada força fraca – eram na verdade facetas de uma mesma: a força eletrofraca. Ainda assim, tentativas de provar esta conexão esbarraram em um grande problema: o curto alcance da força obrigava as partículas envolvidas a serem pesadas, mas as teorias só produziam partículas sem massa, como fótons.
O físico Peter Higgs, que dá nome à partícula de Deus, em visita ao CERN em 2008
Surge a partícula de Deus
No início dos anos 1960, vários teóricos chegaram a uma solução centrada na ideia de que uma determinada partícula seria responsável por criar um campo onipresente capaz de incutir massa aos quarks e elétrons – propriedade que lhe valeu o apelido de Partícula de Deus. Teóricos abraçaram o conceito do que é agora conhecido como o Bóson de Higgs (nomeada em homenagem ao físico inglês Peter Higgs, um de seus coinventores). Em 1968, Steven Weinberg, de Harvard, e Abdus Salam, da Imperial College, criaram de forma independente uma teoria uniflcada de força eletrofraca, em que eram feitas grandes trocas de partículas batizadas de W e Z.
A teoria estava correta? A conflança dos cientistas deslanchou quando, em 1971, cálculos mostraram que a teoria estava livre de problemas matemáticos ocorridos em tentativas anteriores. A prova real só veio em 1983, quando cientistas do CERN flnalmente descobriram as partículas W e Z, utilizando o Super Próton Synchotron, um precursor do LHC. Já naquela época, teóricos tentavam ir além da uniflcação da eletromagnética com a eletrofraca, incluindo ainda a força forte. O resultado, a Grande Teoria Uniflcada, forjou uma ligação entre várias forças e partículas formadas por quarks, que experimentos revelaram estarem presos dentro das partículas pelos chamados glúons – que carregam a força forte.
Começou a emergir do caos a tão buscada simplicidade. Teóricos aflrmaram ser capazes de explicar todas as propriedades da matéria com impressionante precisão, utilizando como base apenas os 12 blocos de construção formados por quarks e partículas, conhecidos como léptons. Havia peças faltando neste impressionante quebra-cabeça, e os experimentalistas correram para preencher os buracos. Em 1995, uma equipe que trabalhava no acelerador nacional de Fermi (Fermilab), nos Estados Unidos, descobriu o quark top, completando a família de seis quarks prevista pelos teóricos.
O quebra-cabeça do Modelo Padrão estava agora completo, exceto por uma última peça: o bóson de Higgs, que dá aos quarks e aos elétrons a propriedade crucial, que é a massa. Na época, parecia que seria questão de meses até os físicos colocarem a última peça no lugar, quase 50 anos após sua existência ter sido notada pela primeira vez.
O Modelo Padrão leva pesquisadores a vislumbrar um mistério maior: a Teoria de Tudo
Um quebra-cabeça maior
Ironicamente, no entanto, muitos teóricos tinham suas reservas em relação ao triunfo. Para eles, estava claro que o Modelo Padrão é só uma parte de um quebra-cabeça ainda maior. Ele abrange todas as partículas da matéria, porém inclui apenas três das quatro forças que agem sobre si, e não diz nada a respeito da gravidade.
Existiam outras preocupações. A primeira evidência concreta das falhas do Modelo Padrão apareceu antes mesmo de todos os blocos terem sido colocados nos lugares. Em 1996, um grupo de japoneses e americanos trabalhando em parceria fez um experimento envolvendo um tanque – contendo 50 mil toneladas de água altamente puriflcada – construído milhares de metros abaixo do Monte Ikenoyama, no centro do Japão. Conhecido como SuperKamiokande, o experimento procurava por flashes de luz causados pela passagem de neutrinos – a única forma de bloco de construção sem massa previsto dentro do Modelo Padrão. Após dois anos, o time anunciou que os dados sugeriam que os neutrinos também tinham massa – uma contradição com o Modelo Padrão básico.
Mais evidências das limitações do sistema emergiram com tentativas de entender o mistério do excesso de massa sobre antimatéria no cosmos. De acordo com as teorias atuais de cosmologia, o Big Bang levou o Universo recém-criado a conter tanto matéria quanto antimatéria, que deveriam ter sido eliminadas, sobrando nada além de radiação. A nossa própria existência, porém, mostra que esta aniquilação foi unilateral, deixando o Universo composto quase só por matéria.
Teóricos acreditam que a causa está em um processo esotérico chamado de violação da Simetria CP. Ele é permitido pelo Modelo Padrão, mas não no nível necessário para explicar a preponderância observada de matéria sobre antimatéria. Ao longo dos anos, equipes de vários aceleradores de partículas tentaram explorar esta questão, e descobriram pistas de diferentes violação de CP, difíceis de explicar pelo Modelo Padrão. A evidência mais recente surgiu com os experimentos no LHC em novembro do ano passado. Mais dados são necessários para confirmar a existência da violação, mas pode se tratar de mais uma janela para o que está além do Modelo Padrão.
Matéria e energia escuras ficam de fora
A energia e a matéria escuras são ignoradas pelo Modelo Padrão
O mais embaraçoso de tudo é que o Modelo Padrão não tem nada a dizer a respeito dos dois mais importantes elementos na constituição do Universo: a matéria escura e a energia escura. A primeira é conhecida por preencher o Universo e ser muito mais pesada que a matéria comum. O que a constitui, porém, se encontra fora do bem arrumado esquema de 12 blocos criados pelo Modelo Padrão. Energia escura, por sua vez, é uma espécie de força antigravitacional responsável por impulsionar o Universo em sua trajetória de expansão cada vez mais acelerada. O modelo não explica este fenômeno.
Físicos esperam que experimentos no LHC ajudem a apontar onde poderiam estar as respostas. Teóricos estão esperançosos de que o acelerador encontrará evidências da chamada supersimetria, uma forma de classificar partículas que serve de ponte entre partículas que formam a matéria – como prótons e elétrons – ou partículas de troca – como fótons e glúons. A supersimetria traz uma série de partículas não previstas pelo Modelo Padrão, que podem compor a base da matéria escura.
Existem esperanças de que a descoberta da supersimetria ajudará a abrir caminho para uma descrição final de todas as partículas e forças presentes na natureza, conhecida como a Teoria de Tudo. Não importa o que o LHC revele: o Modelo Padrão ficará na história, como a Lei da Gravidade de Newton, como um conceito do Universo que, mesmo limitado, permanecerá para sempre como uma das grandes conquistas do intelecto humano
Comentários
Nelson Magrini disse:
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