Parece que você é novo por este pedaço. Se você quer se envolver, clique em algum destes botões!
A PORTA-BANDEIRA DILMA LEVA A NOCAUTE O PROTOCOLO E O IDEAL OLÍMPICO
CELSO ARNALDO ARAÚJO
A atual bandeira olímpica está no Brasil desde segunda-feira ─ e aqui ficará até o término das Olimpíadas do Rio. Não é uma bandeira qualquer. São 2,22 metros de largura por 1,54 de altura da mais pura seda oriental e foi confeccionada, pelos melhores artesãos coreanos, para as Olimpíadas de Seul, em 1988 ─ e desde então transferida, de quatro em quatro anos, para o país-sede dos jogos seguintes.
Não só por isso, mas por ser o ícone máximo dos Jogos desde 1914, quando foi desenhada em pessoa pelo próprio Barão Pierre de Coubertin, o pai das Olimpíadas da era moderna, o conjunto de regras para o manuseio da bandeira é mais extenso que o rol de mesuras que um plebeu deve seguir na presença da Rainha da Inglaterra.
Por onde quer que tenha passado para uma temporada de quatro anos a bandeira de Coubertin foi tratada com os mimos que o centenário protocolo olímpico estabelece. Isso até chegar ao Brasil. Aqui, apesar de detalhada orientação a seus guardiães, foi esculhambada pela própria presidente da República, em pleno Palácio.
A avacalhação começou no momento mesmo em que a bandeira olímpica passou para as mãos de brasileiros, ainda em Londres. Para recebê-la, o Comitê Organizador Rio 2016 assinou um compromisso que impõe, entre muitos itens, que ela não pode sair de sua caixa para passeios na rua nem ser desfraldada sem um cerimonial específico, com direito até a uma “Guarda de Honra da Bandeira Olímpica”. Mas já no embarque, em Londres, segunda-feira, a coisa desandou.
O boxeador e medalhista Esquiva Falcão foi fotografado segurando o nobre lábaro para um oba-oba com as mãos nuas ─ ele que, ironicamente, ganhou sua medalha de luvas. Mas foi em pleno Palácio do Planalto que o protocolo olímpico iria, de vez, pras cucuias gregas. O atentado oficial à bandeira foi filmado e disponibilizado no próprio Blog do Planalto, na ocasião em que Dilma recepcionou também os irmãos Esquiva, medalhistas do boxe em Londres.
Começa com as três maiores autoridades presentes ─ a própria Dilma, o prefeito Eduardo Paes e Carlos Arthur Nuzman, presidente do COB ─ fingindo para fotógrafos e cinegrafistas que estão interessados nos detalhes da caixa da porta-bandeira. Sem mais essa nem aquela, Paes abre a pequena arca e vai logo metendo a mão na bandeira, que estava posta em sossego, com todas as suas meigas dobraduras, à espera do toque gentil e formal. Em seguida, como quem vai estender a toalha na mesa para o café da manhã, a presidente ajuda Nuzman e Paes a desfraldar a seis mãos, lambuzadas de cumprimentos áulicos, o estandarte do barão de Coubertin ─ até ele roçar o chão.
Corta para o risonho trio de desfraldadores, Pezão ao fundo, exibindo a bandeira na mão grande ─ disfarçada com mal coreografadas pontas de dedos ─ num gesto caseiro de empáfia de troféu com um símbolo que é universal.
DISPUTA ESPORTIVA NÃO TEM SENTIDO
Dilma tem tanta noção da importância formal daquele pedaço de pano que, de cara, já errou o nome da coisa:
“O prefeito, que recebeu a medalha…a medalha, não, a, a, a bandeira…”, corrige, depois do sopro providencial de Eduardo Paes.
Vai começar um dos piores discursos da enorme dilmoteca armazenada neste espaço. Mas a presidente está tão compenetrada em sua falação olímpica que não nota a ponta de seu sapato impedindo o prefeito de erguer a bandeira do chão para devolvê-la, dobrada de qualquer jeito, àquela versão tupiniquim da caixa de Pandora ─ nome que Dilma poderia confundir com a da urna que guarda a bandeira dos Jogos Panamericanos.
Ele puxa meio sem jeito o ícone sagrado uma, duas, três vezes ─ até que Dilma se toca e levanta o pezinho, sem interromper a catilinária de fazer corar o último colocado dos Jogos Abertos do Interior:
“Esses atletas aqui, que receberam a medalha aqui, e que honraram muito o Brasil e os brasileiros e as brasileiras”, enfatizando, para o mundo, o nome do povo que habita este país, em seus dois gêneros.
“Porque, para nós, a Olimpíada tem essa característica: é um momento em que todos nós deixamos de nos preocupar com os problemas que cada um enfrenta e assistimos uma das coisas muito importantes que o gênero humano inventou, que é a disputa esportiva. Aquela disputa que não tem sentido além de ser o próprio espetáculo”.
Sabemos agora, pela própria presidente, o que o pessoal do Planalto e da Esplanada andou fazendo nas duas últimas semanas ─ o que explica também o aumento da audiência da TV Record e a ausência de qualquer ação de governo nesse período. Mas ficou uma dúvida: se a disputa não tem sentido, o que estão fazendo aqueles boxeadores com suas medalhas ali?
Dilma não se esquiva da resposta:
“Por isso, neste momento, a gente tem de fazer uma reflexão sobre a importância dos atletas. Eu estou aqui com dois atletas: o Esquiva e o Yamaguchi, o Yamaguchi e o Esquiva”.
Espere: são dois ou quatro? Família campeã, essa. E surpreendente: ao contrário dos demais atletas que participaram dos Jogos, eles foram a Londres para disputar medalhas olímpicas, não o programa Quem fica de pé, do Datena:
“O objetivo deles era ser ganhadores de medalhas olímpicas, porque medalhas olímpicas são muito importantes. Eu estou falando medalhas olímpicas. Não estou falando só ouro, só prata, só bronze, porque a distinção é esta. A distinção é o país ser premiado pela sua capacidade, pela sua expertise, pela sua arte. Porque lutar boxe além de ser uma luta é uma arte”.
Sim: lutar boxe é uma luta, disse um dia, com arte, Dilma Rousseff ─ congregando o mundo, em dilmês de lona, em torno dos Jogos Olímpicos do Rio.
As Olimpíadas de Dilma podem vir a ser um tremendo fracasso ─ mas, se depender dela, certamente serão as mais divertidas desde o compenetrado Barão de Coubertin.
Um último toque para os ambientalistas: para o Brasil não ficar mal na fita, iniciem já a campanha “Salvem a bandeira olímpica”
Direitos reservados de acordo com cada publicação, 2001 ~ 2014, Fórum Religião é Veneno.
As opiniões expressas e o conteúdo publicado neste fórum por seus usuários são de responsabilidade exclusiva dos seus respectivos autores e não representam as opiniões dos administradores e moderadores do "Religião é Veneno".
Desenvolvido e mantido pela Administração e Moderação.
Comentários
E olha que sou eu que estranheis, sendo Monã minha testemunha que não morro de amores por esta turma que está no poder.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Mal a bandeira chegou aqui, começou a passar de mão em mão, em lugares públicos, sem nenhum cuidado.
Não sei se as recomendações são frescura ou se a ideia é preservar a bandeira, mas são importantes para eles, portanto é um desrespeito escancarado e transmite uma péssima imagem do país.
Como eu disse, foi uma gafe.
É que o título dá a entender coisa pior.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
"Toneladas de pó encontradas na entrada da favela."
Fato:
Caminhão de areia tomba na rodovia.
Concordo.
O que eu vejo de mais grave nesse episódio, além do fato de o Brasil – provavelmente – ter sido o único país a deixar de observar o protocolo, é que eles conheciam as regras; foram orientados, instruídos sobre como e quando agir, mas, como bons brasileiros e brasileiras que são, mandaram às favas o ritual, tão caro às demais nações, e deram o toque brasileiro, que jamais se confundirá com o toque de Midas. O nosso vira outra coisa.
Há quem aprove esses rituais e há, como não poderia deixar de ser, quem os ache uma babaquice. Não importa. Pode ser a maior babaquice do planeta. Importa apenas que o Brasil assumiu o compromisso de sediar a próxima edição dos Jogos Olímpicos e ser o guardião de seus ritos sagrados. Mais do que assumir um compromisso, o Brasil se candidatou, se ofereceu, chamou para si as responsabilidades inerentes ao evento, e não pode agora se furtar a seguir a cartilha, tal qual foi escrita.