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Comentários
A Inquisição romana existiu oficialmente até 1870, quando Garibaldi e outros nacionalistas tomaram as terras da Igreja e a limitaram ao Vaticano. É bem possível que muitos dos bispos que votaram a favor da doutrina da infalibilidade papal tenham sido influenciados pelas forcas na frente das igrejas. Por outro lado, considerando a quantidade de bispos que abandonaram o concílio, indignados com as atitudes do papa, é provável que a Inquisição já não assustasse tanto.
Já li sobre isso. Eu espero, sinceramente, que seja verdade, Acauan. Fico um pouco (ou muito) aliviado em pensar que grande parte dessas atrocidades não aconteceram. Todo esse horror é passado e não pode ser mudado, mas é bom saber que, talvez, não tenha sido tão monstruoso assim.
Se o Datena tivesse dito o mesmo que disse a respeito das pessoas atéias sobre os negros ou sobre as mulheres será que vocês estariam sendo tão coniventes assim?
A lei que permite liberdade de expressão faz parte da mesma legislação que impede a discriminação sobre as pessoas em relação a sua filosofia, crença religiosa, opção sexual ou raça.
Se o Datena tivesse feito uma crítica ao ateísmo tudo bem, tudo pode ser criticado e o ateísmo não é nenhuma exceção, no entanto, ele fez uma clara criminalização dos ateus, uma associação direta e reinterada de que os ateus seriam responsaveis pelos altos índices de criminalidade do país, que ateus seriam criminosos.
Se o mesmo, no mesmo tom, tivesse sido dito a respeito dos católicos ou protestantes eu duvido que ele não teria sido retirado do ar, por iniciativa da própria emissora.
Portanto, não é privilégio que as pessoas atéias advogam no caso, apenas igualdade, só isso.
Muito do que se considerava fato sobre a Inquisição Espanhola, a mais brutal das inquisições, tinha por fonte relatos ingleses ou alemães, à época inimigos políticos e religiosos da Espanha. Hoje os historiadores entendem que boa parte daquelas narrativas carregavam no terror para servir como instrumento de propaganda.
Independente da questão dos documentos, acessível a quem pesquisar a atualidade da discussão, uma questão interessante é perguntar por que gastar tanto tempo e dinheiro em instrumentos de tortura tão sofisticados e exóticos se provocar dor insuportável em um ser humano é a coisa mais fácil e barata do mundo? (Um vilão de filme do James Bond comentou isto).
Pegue o exemplo de uma das mais notórias peças do arsenal de torturas, a Iron Maiden (dama de ferro), aquele sarcófogo forrado internamente por aguilhões pontiagudos.
Basta notar o fino acabamento e a riqueza de detalhes daquilo para perceber que jamais poderia ser um instrumento fabricado em massa, considerando os parcos recursos da época. Os poucos exemplares remanescentes hoje indicam que se é que foram usados de fato algum dia, certamente visavam às taras de algum potentado sádico e não a qualquer ação oficial seja de que instituição fosse e isto é óbvio por questões econômicas, mais do que morais.
Basta comparar o que seriam os métodos de tortura da Inquisição com os da Gestapo, que mesmo contando com uma disponibilidade de recursos econômicos e técnicos muito maiores que os disponíveis naqueles pobres e atrasados tempos da Inquisição, fazia seu serviço basicamente usando barras de ferro, cacetetes, maçaricos, abridores de latas, baldes com água e outros utensílios simples, com os resultados que se sabe. Ou então basta lembrar do que as forças de repressão do regime militar brasileiro conseguiam com um pau-de-arara e uma maquininha de telefone.
Ou seja, as masmorras da Inquisição que se vê em filmes, cheias de aparelhos caros, sofisticados, finamente acabados e sinistramente exóticos são extremamente improváveis, não apenas porque as documentações históricas não confirmam a sua utilização generalizada, mas principalmente porque é muito mais fácil, rápido, barato e eficiente encher o coitado do preso de porradas com as ferramentas simples à mão.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Você tem razão. Em princípio processos podem ser abertos sempre que há algum tipo de litígio. O que eu quis dizer é que o mero conteúdo verbal de opiniões, não materializando-se em ações objetivas contra a parte, não pode servir como base exclusiva para o deferimento de um processo que tenha sido aberto por ela, e que esse tipo de mau uso do poder judiciário deve ser condenado.
Pois é. Mesmo que muito raramente alguém seja efetivamente condenado por opiniões veiculadas na mídia, o fato de na prática os desincentivos para a abertura de improcedentes serem pequenos face aos custos impostos sobre os processados concede uma sanção estatal de facto ao policiamento ideológico, ainda que de jure ela não exista.
A questão me parece um pouco mais complicada que isso.
Sobre a noção de que existam juízos morais absolutos, isso não quer necessariamente dizer que a Igreja os conheça ou compreenda completamente nas instâncias práticas onde ela precisaria empregá-los.
Eu acredito que a valores morais universais emergem com o tempo em sociedades, de uma melhor compreensão dos assuntos humanos, e que certos valores são absolutamente superiores a outros, o que não quer dizer que eu considere a minha compreensão atual de valores morais como perfeita.
Acho que a Igreja opera segundo uma concepção similar, mesmo que não explicite essa doutrina claramente. A Igreja edificou-se a si própria e ao ocidente no plano moral, e a sucessão de editos, bulas, e concílios é uma mostra de que a Igreja não procura esconder o fato de que ela é uma entidade em transformação.
Isso não contradiz a sacralidade do texto bíblico ou qualquer doutrina do gênero. O texto pode ser escrito por Deus, mas a compreensão obtida dele é humana e sujeita a falhas, afinal somos criaturas pecadoras e imperfeitas.
Quanto a imoralidade da aplicação de tortura em interrogatórios e julgamentos, tampouco me parece algo completamente óbvio em qualquer circunstância. O que nós temos hoje é uma situação onde, dentro de um sistema democrático de justiça, existe a percepção de que a proteção de certos direitos individuais é mais importante do que as potenciais vantagens táticas que o emprego da tortura poderia conferir as autoridades.
Isso porque percebeu-se que o poder de tortura frequentemente se transforma num instrumento de terror que as autoridades empregam para aumentar o seu próprio poder.
Mas mesmo essa percepção é nuanceada. Por exemplo, acredito poucos de nós considerem as operações do BOpE como imorais, ainda que tecnicamente elas empreguem a tortura de suspeitos. Face as alternativas práticas existentes, sufocar aviões e vapores com sacos plásticos para descobrir o paradeiro dos traficantes parece uma solução adequada.
Em sociedades mais avançadas no futuro, onde o problema em questão não seja tão urgente, o moralismo retrospectivo então vigente talvez condene as ações dos integrantes do BOpE, o que hoje nós sabemos ser improcedente.
Essa ressalva serve apenas para colocar uma perspectiva nessas análises que procuram julgar a igreja no presente pelos seus atos passados com base nas suas concepções atuais. Esse anacronismo é especialmente inconseqüente quando se percebe que a própria Igreja foi instrumental para a aquisição e fixação do conhecimento moral que agora procura-se usar para recriminá-la.
O que se pode dizer de objetivo é que a Igreja foi de maneira consistente através da história uma instituição muito menos corrupta e mais preocupada com o respeito a dignidade dos seres humanos do que praticamente qualquer outra organização contemporânea a ela, sejam elas sobreviventes ou já extintas, e isso mesmo quando empregamos os critérios modernos que eram desconhecidos na época. Apenas quando procuramos julgar a Igreja segundo o critério completamente despropositado de ausência completa e total de máculas é que podemos substanciar a alegação de que ela é uma instituição moralmente viciosa, mas esse critério absurdo tornaria qualquer instituição secular igualmente ruim ou pior.
Esses são pontos interessantes, e aqui eu preciso reconhecer a minha condição de palpiteiro não-escolástico antes de fazer qualquer comentário que possa ser tomado como absurdo face a doutrina católica tradicional.
Eu acredito que o conceito de infalibilidade doutrinária é muito mais um dispositivo de estabelecimento de uma ordem hierárquica rígida dentro da instituição, de maneira a impedir que sacerdotes locais comecem a questionar ou interpretar a doutrina de maneira excessivamente independente.
Mas na prática Igreja acomoda uma variedade bem grande de ordens e correntes doutrinárias distintas, indo dos Jesuítas até a Teologia da Libertação, passando por coisas como a Opus Dei. E diversos concílios ecumênicos foram reunidos para reformar certos aspectos da doutrina global, o que mostra que essa questão de ser infalível é relativizada pela própria Igreja.
Acho que a melhor interpretação deve ser a de que as conclusões doutrinárias consensuais estabelecidas pelo corpo eclesiástico e sancionadas pela autoridade papal tendem a ser mais acertadas do que as ilações de sacerdotes e cristãos mundanos individuais e portanto devem ser tomadas como se fossem infalíveis.
É claro que dentro da semiótica católica isso é explicado com alusões a iluminação e ao Espírito Santo guiando decisões, mas removidas as alegorias e firulas necessáirias, seria esse o funcionamento prático no meu entender.
É preciso dar às coisas as proporções que têm.
Datena disse: "pessoas que cometem crimes não tem Deus no coração".
Isto é muito diferente de dizer "ateus são criminosos".
Como disse antes, quem se sentiu ofendido com a frase tem o direito de acionar judicialmente o ofensor e a obrigação de provar sua acusação.
A expressão popular "ter Deus no coração" é vaga e banal demais para decidir esta questão. Em última instância pode-se argumentar que muitos religiosos "não tem Deus no coração" e que muitos ateus tenham por conta de seus princípios morais.
E só prá constar, alguém ficou sabendo de algum ateu onde quer que seja que sofreu algum tipo de prejuízo por conta da fala do Datena?
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Por outro lado, admitir que a ICAR errou no passado implica em admitir que ela é falível, e isto permite que qualquer coisa que ela diga seja questionada. Implica em admitir que o que hoje é considerado aceitável, amanhã pode ser tão intolerável quando a Inquisição hoje.
A questão é que a nossa reputação não é um item de nossa propriedade, mas é o apanhado de opiniões que outras pessoas formam sobre nós.
Essas pessoas tem em princípio o direito de fazer o que quiser com essas opiniões. É claro que se elas empregarem má fé perceptível nas declarações que fazem sobre os outros, elas acabarão por prejudicar suas próprias reputações.
Trata-se de um sistema que regula a si próprio. Ainda que não seja perfeito, e que eventualmente algumas pessoas se vejam arruinadas por conta de calúnias lançadas contra elas, usar a justiça contra um caluniador é iniciar um ato de violência, já que, conforme observou um notório democida, o poder político emana do cano de uma arma.
Ou seja, relativismo moral.
Nestes termos pode-se livrar moralmente a barra de qualquer aberração, escravidão e nazismo inclusos.
Qualquer um que defenda o axioma da moral absoluta, e eu defendo, deve ter a humildade de reconhecer que tal reconhecimento o coloca em uma sinuca de bico, pois é óbvio que será impossível conciliar este princípio com sua realidade prática.
Entretanto, a moral absoluta é autoevidente.
BEM é BEM e mal é mal, qualquer coisa fora disto atende às nossas conveniências ou sucumbe em nossa ignorância.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Segundo a doutrina católica são infalíveis o Papa e o Magistério quando se pronunciam ex-cathedra em questões de Fé e moral.
Um dos objetivos práticos é uma defesa à posteriori contra a sola scriptura protestante.
Não basta a Bíblia ser inspirada por Deus, é preciso que suas interpretações também sejam, logo é preciso definir quem e quando faz interpretações inspiradas e assim infalíveis.
Do ponto de vista teórico, faz sentido.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Sim, contradiz. Não só por aquela célebre doutrina da interpretação através do espírito santo, mas por que os textos que compõem o atual cânon católico foram vítimas dessa transformação através de inserções, exclusões e adulterações.
Relativismo moral pior só quando stalinistas resolvem defender os massacres étnicos e os expurgos através de argumentos semelhantes. E o Olavo vai mais longe:
"A condenação só vinha quando o próprio acusado se obstinava até o fim em manter suas opiniões, a despeito de todas as tentativas de persuadi-lo do seu erro."
Ele é claro não entra em detalhes nessas tentativas e nas punições de quem renunciava e se alinhava com a igreja.
O pobre Menocchio foi torturado, preso, humilhado publicamente, teve a família destruída, a vida arruinada e por fim foi assassinado por exercitar seu senso crítico. E há quem diga que tenho que agradecer a igreja por essas e outras mortes.
Nossos ancestrais praticavam atos homicidas e genocidas com freqüência muito mais alta no passado.
O caráter revoltante do nazismo é justamente o regresso assustador a um estado de barbárie dentro de uma sociedade fisolosófica e tecnologicamente sofisticada como era Alemanha do século XX.
Diversas figuras históricas comandaram o extermínio de populações e nem por isso eles inspiram o mesmo terror que Hitler e seus capangas, pois elas pertenciam a um contexto diferente.
Isso não é relativismo moral assim como não é relativismo moral quando julgamos certos atos de crianças de maneira mais condescendente do que adultos.
Isso é a percepção de que a moral é um conhecimento conquistado e não evidente a princípio.
Relativismo moral no meu entender é o posicionamento filosófico de que os estados do conhecimento e prática moral de pessoas ou sociedades são arbitrários e incomparáveis.
Eu acho que as pessoas podem perceber, diante de esclarecimentos, o valor íntrinseco de certos princípios morais, o que não quer dizer que eles sejam evidentes na ausência desses esclarecimentos.
Eu não acho que vivendo na mesma sociedade que Thomas Jefferson eu teria desenvolvido sentimentos abolicionistas fortes, como ele também não desenvolveu. E eu acho que um Thomas Jefferson vivendo hoje seria francamente oposto a escravidão de outros seres humanos, pois a percepção da virulência dessa prática já é bastante difundida.
Se a forma de "princípio de moral absoluta" que você defende não produzir um entendimento melhor do mundo na prática, como você mesmo diz, ela deve ser desconsiderada.
Um problema meio óbvio que eu percebo com a doutrina teológica da Sola Scriptura é que alguém precisa primeiro determinar quais são os textos canônicos e apócrifos, e isso obviamente não estará definido pelo próprio canon.
Equiparar moralmente o nazismo à barbárie primitiva não cabe pelo fato de que seus crimes só atingiram a dimensão monstruosa conhecida por conta do altíssimo grau de civilização que os concebeu, planejou e implementou.
Enquanto o bárbaro primitivo é um ser cujos impulsos violentos e destrutivos dominavam sua racionalidade, os nazistas constituíram uma associação de inteligências que usaram o melhor de sua racionalidade para criar destruição e violência.
É preciso distinguir entre a identificação da moralidade do ato em si e o julgamento do agente que comete o ato.
Podemos considerar um ato imoral sob quaisquer circunstâncias, como, por exemplo, abuso sexual de crianças e admitir que o julgamento dos agentes que praticam tal ato deva considerar as circunstâncias ambientais, sem desclassificar o ato como condenável em si mesmo.
Exato!
E para ser um conhecimento conquistado ela deve ser verdadeira, real.
Ou, em outras palavras, relativismo moral é a crença de que não existe BEM ou mal, certo ou errado, que estes julgamentos são apenas convenções humanas e se amanhã alguma sociedade convencionar que tortura é moralmente aceitável, então ninguém pode alegar que não é.
Foi justamente esta a base da defesa dos criminosos nazistas em Nuremberg.
Se nenhuma lei do Reich Alemão definia como crime o assassinato em massa de judeus e se não existe crime sem lei que o prescreva, então...
O absurdo do pensamento é óbvio, mas criou um problema gigantesco para o tribunal, orientado pelo Direito Positivo.
Hanna Arendt comenta esta dificuldade em "Eichmann em Jerusalém" e tenta explicar como carrascos nazistas poderiam ser executados dentro do direito.
O curioso é que mesmo Hanna Arendt parecia não atentar para a resposta autoevidente, "seus crimes foram provados, vocês mataram milhões de inocentes e serão condenados à forca por isto". Mais óbvio impossível, mas ela buscou uma solução teórica para o que salta aos olhos de qualquer um.
Gosto de comparar moral e geometria.
As proporções do triângulo-retângulo são autoevidentes, o que não quer dizer que todos os povos de todas as épocas dominem a trigonometria.
Assim como se Thomas Edison vivesse no tempo de Thomas Jefferson não teria inventado a lâmpada elétrica e nem por isto as leis da física seriam diferentes em uma época ou outra.
Cabeça, a verdade não existe para o nosso entendimento, a verdade simplesmente é.
Não podemos desconsiderar uma verdade apenas porque não produz um entendimento melhor do mundo na prática. Isto vale para qualquer verdade e também para as verdades morais.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Exato, para que a sola scriptura fosse coerente, a Bíblia precisaria conter um índice dos livros inspirados por Deus.
Os protestantes não tem como responder à questão de como livros infalíveis divinamente inspirados podem ser identificados sem chance de erro por métodos humanos falíveis.
De novo os católicos romanos resolvem o problema alegando que o Magistério também é divinamente inspirado quando selecionou o cânone, o que o protestantismo não aceita, mas não apresenta outra solução além da metodológica.
Além disto, se a regra é sola scriputra, ou seja, só a Bíblia dita as regras do cristianismo, então a regra da sola scriptura deveria constar da Bíblia e não consta.
Protestantes em geral costumam se justificar com versículos que recomendam as escrituras, mas além das escrituras citadas não serem definidas especificamente tem-se que recomendação é muito diferente de decretação como regra única.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Só prá completar, sobre sola scriptura tem uma passagem na Bíblia da qual protestantes sempre fogem pela tangente:
Prá mim parece uma recomendação óbvia do próprio Paulo de que seus livros não eram prá ser interpretados por qualquer palpiteiro.
Nós, Indios.
Lutar com Bravura, morrer com Honra!
Grande Índio, a discussão entre você e o Cabeção está muito interessante e eu não quero distraí-lo com bobagens. Portanto, não dê muita atenção a este pequeno aparte.
Embora eu não consiga lembrar com exatidão de todas as palavras do Datena à época, tenho certeza que a coisa foi um pouco mais feia do que isso. A palavra "ateus" foi repetida diversas vezes no bojo dos comentários e críticas que ele fazia. Lembro-me de uma frase: "ateus são pessoas sem limites". Ele disse também, ao ver que os números da enquete que ele mesmo propôs estava significativo para o lado ateísta, que "essas pessoas devem estar ligando de dentro dos presídios, só pode!". Outras referências a ateus e ateísmo seguiram-se a essas e, neste contexto, falar que pessoas que não tem Deus no coração são criminosas, já não pode passar por um crivo seletivo do telespectador que, muito provavelmente, nem conseguiu identificar o mesmo que você ou o Cabeção identificaram. Tudo se tornou uma e a mesma coisa.
Pois é. Foi o que eu disse, há uma diferença moral na medida que o bárbaro primitivo ainda não descobriu a civilidade racional, enquanto que o bárbaro moderno se revoltou contra ela.
A violência ancestral é o resultado em parte da ignorância, já a violência socialista é um produto do engenho humano e faz parte de um ideal revolucionário, um ideal que consiste em destruir a ordem civilizacional estabelecida.
Por essa razão é um tanto inconseqüente comparar eventos distantes como a Inquisição e o Holocausto, uma vez que muito foi descoberto em termos de conhecimento moral e jurídico no interlúdio de vários séculos que os separa.
De certo existem críticas coerentes a serem admitidas com respeito a radicalização do Tribunal do Santo Ofício no período, mas elas devem ser inseridas dentro do contexto do conhecimento moral e jurídico que existia na época, e não julgada por valores que só puderam ser descobertos e observados por sociedades mais modernas.
Então nós diferimos muito pouco com respeito a essa questão.
Eu até acho que a sociabilidade e moralidade humana tenham uma componente instintiva básica, mas a maior parte daquilo que compõe o edifício moral da humanidade se produziu através de distinções feitas por meio de tentativa e erro.
Alguns princípios de convivência permitiam a certas sociedades de perseverar e prosperar. Esses princípios começam bem gerais e rudimentares, mas com a sofisticação dos indivíduos novas distinções são introduzidas, e a verdade moral vai se revelando parcialmente.
O que eu chamo de verdade moral é simplesmente a não-arbitrariedade do conhecimento adquirido dessa maneira. Regras de comportamento podem conter suas idiossincrasias em cada grupo humano isolado, mas existem fortes analogias reveladas independentemente, e a verdade moral é justamente o aspecto inerente aos assuntos humanos que produz essas semelhanças.
A questão aqui me parece menos óbvia.
É evidente que os ideólogos e militantes nazistas perpetraram crimes hediondos na sua busca pelo poder absoluto.
Menos evidente é a culpabilidade do cidadão alemão que, no seu parco entendimento filosófico do mundo, em parte se deixou levar pela comoção coletiva produzida pelos primeiros, e em parte concluiu que era melhor obedecer a lei sem questionar muito.
Acredito que o poder que o estado comanda esteja sempre sustentado em algum tipo de “sanção da vítima”.
Mas a punição aplicada pela justiça não é uma forma de eliminar “pessoas ruins”, mas sobretudo “idéias ruins”.
Embora seja sempre passível de discutir o quanto a irracionalidade coletiva de um regime político pode afetar o melhor julgamento de seus cidadãos, o ato de punir os carrascos responsáveis pelo morticínio de milhões manda uma mensagem bem clara para o futuro: a colaboração com regimes assassinos não será perdoada.
Eu acho que os paralelos entre moralidade e matemática são realmente relevantes.
Ambos são corpos abstratos de conhecimento baseados em regras convencionais, e embora teoricamente sistemas matemáticos e morais possam incorporar regras escolhidas arbitrariamente, incluindo as meta-regras de coerência interna, apenas alguns poucos se mostram prática ou esteticamente interessantes e ricos o bastante para serem estudados.
Existe a idéia da verdade enquanto correspondência entre idéia e realidade (entendimento) e existe a idéia da verdade enquanto coerência interna entre predicados simbólicos abstratos dentro de uma linguagem.
Me parece que a segunda concepção de verdade é subordinada a primeira, na medida em que criamos uma linguagem como instrumento para se produzir um entendimento do mundo. Depois de criada a linguagem se torna um elemento do mundo e a segunda noção de verdade passa a operar dentro dela.
A questão da existência de um processo de realidade acontecendo de maneira independente do entendimento me parece muda. Fatos inacessíveis são indistinguíveis de fato inexistentes. Assim você pode adotar o ponto de vista realista ou o ponto de vista idealista, não acho que isso crie maiores conseqüências filosóficas para o processo de entendimento, que é o que me parece realmente relevante.
Faz todo o sentido para nós, mas deveria levar um católico a admitir que sua preciosa crendice não é uma verdade pronta, acabada e definitiva que caiu do céu e sim uma coisa provisória que poderá ser constestada daqui a algum tempo. A virtude de hoje poderá ser o crime de amanhã.
O que resta mais óbvio, nesta questão, é que os religiosos do passado tinham plena fé e convicção nos ensinamentos e dogmas de sua Igreja, assim como hoje acontece. O tempo demonstrou que aqueles estavam errados, e isso poderia ter sido um ótimo farol para as gerações futuras. No entanto, os mecanismos da fé bloqueiam a capacidade de raciocínio e impedem qualquer questionamento por parte do religioso. Então... por mais vezes que se reformulem as 'verdades' reveladas elas sempre serão infalíveis na visão do fiel.
Essa discussão tinha sido inclusive levantada séculos antes, entre as correntes rabínicas e caraistas do judaísmo.
Me parece que num dado momento certas religiões sobreviventes adquirem uma massa crítica de seguidores e uma literatura sagrada complexo o bastante para que alguns deles tentem decretar o seu completo estabelecimento formal.
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Eu gostei de uma coisa: a parte que mostra o pastor ensinando seus comparsas a tomar o dinheiro dos tolos fiéis. Fica bem evidente, para quem ainda tem olhos, o quanto essa máfia asquerosa é bem organizada e eficiente na arte de convencer e enganar. O resto do vídeo, eu não gostei, não. Vou dizer porquê.
Acho uma tolice responder ao Datena igualando-se a ele. Mostrar religiosos que cometeram crimes significa o quê, exatamente? Que todos os religiosos são criminosos? Não foi isso que fez o sr. Datena e revoltou os ateus? Qual o objetivo de citar trechos bíblicos, ironizar o amigo imaginário, apontar erros na religião e religiosos? Se fosse num fórum como este, faria todo o sentido do mundo. Estamos aqui para isso, debater, desmontar os argumentos contrários, mostrar a coerência dos nossos. Em uma resposta a prováveis agressões morais, não cabe esse tipo de atitude. Ficou parecendo um ‘bate boca’, uma briguinha tacanha entre grupos antagônicas. Quem elaborou esses vídeos desperdiçou uma excelente oportunidade de mostrar onde a atitude e o pensamento ateus são, de fato, superiores.